O estudo da litigiosidade e o ensino do direito
Evolução do direito com avanços tecnológicos e novos direitos. Aumento da litigiosidade reflete demanda por serviços públicos eficientes.
domingo, 12 de maio de 2024
Atualizado em 10 de maio de 2024 11:58
O estudo do direito mudou nos últimos anos, especialmente pelo avanço da tecnologia e o surgimento de novos direitos, o que deu origem também a ramos do direito, a exemplo do direito digital.
Nesse contexto, aliado à revolução digital, nos últimos 30 anos, o estudo do direito passou também pela evolução do direito constitucional, de modo que foram incorporados novos direitos, hoje adjudicados pela população não apenas pelas vias administrativas, mas também pela via judicial.
Ainda nesse mesmo cenário a expansão dos serviços prestados à população expôs as deficiências dos serviços públicos prestados diretamente ou por meio de concessões de serviços público.
O cenário acima descrito demonstra, por um lado como o direito evoluiu e por outro, a consequência de sua evolução, o aumento da litigiosidade, isso porque a consolidação de ovos direitos, quer seja pela concretização de direitos constitucionais, quer seja pelo surgimento de novos direitos ou pela cobrança maior da sociedade pela prestação de serviços públicos eficientes.
Para Maria Cecília de Araújo Asperti1, a litigiosidade não se confunde com conflituosidade "pois nem todo conflito é reconhecido formalmente pelas partes ou as leva a invocar a intervenção de um terceiro em sua resolução, havendo, na realidade, uma série de outros fatores que influenciam o reconhecimento do conflito, sua evolução e a decisão dos envolvidos de ajuizar uma demanda (ou um litígio). Daí porque a litigiosidade dever ser entendida como a busca de uma prestação jurisdicional."
Pela leitura da afirmação acima é possível perceber que a litigiosidade não se resume a resolução judicial de conflitos, mas a todos a formas de utilizadas de modo a garantir uma prestação jurisdicional, não necessariamente por meio de um sentença judicial, abrangendo os meios alternativas de conflitos, as soluções apresentados por meio dos Centros de Inteligência da Justiça, as decisões concertadas (cooperação judicial), entre outras formas de garantir a prestação jurisdicional adequada.
Nesse sentido, dada a abrangência e a importância que a litigiosidade alcançou e as feições que tomou dentro do sistema de justiça, não é mais suficiente que seja estudada nas cadeiras da faculdade como um ponto específico no direito processual civil, mas requer autonomia dada sua magnitude e extensão.
Quando se fala em litigiosidade hoje não se está diante apenas de questões de ordem civil e administrativa, mas já alcança vários ramos do direito, a exemplo do direito penal e trabalhista, entre outros.
Desse modo, o estudo da litigiosidade requer uma atenção especial, quer seja porque perpassa diversos ramos do Direito, quer seja porque tomou uma dimensão autônoma, já que engloba diversos fenômenos, a exemplo das demandas repetitivas, frívolas, temerárias, fraudulentas, entre outras, que comprometem todo o sistema de justiça, além de estudar soluções individuais e coletivas para os conflitos que não passem, necessariamente, por uma solução adjudicatária.
Dessa forma, dada a dimensão que a litigiosidade tomou do direito brasileiro, seu estudo na academia, especialmente nas faculdades de direitos do país, deve ser aprofundado de modo a não compreender apenas um tópico dentro da vastidão do processo civil, mas sim como uma disciplina autônoma dedicada ao estudo dos diversos fenômenos ligados à litigiosidade e já mencionados acima, como forma de acompanhar a evolução do direito que não se contenta mais com soluções adjudicatórias individuais, mas reclama decisões que pensem e tragam soluções para o sistema de justiça e, por consequência, de toda a socidade.
1 ASPERTI, Maria Cecília de Araújo. A mediação e a conciliação das demandas repetitivas. 1ª ed. Belo Horizonte. Ed. Fórum. 2020. p. 23.
Acácia Regina Soares de Sá
Juíza de Direito Substituta do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Especialista em Função Social do Direito pela Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL. Mestre em Políticas Públicas e Direito pelo Centro Universitário de Brasília - UNICEUB. Coordenadora do Grupo Temático de Direito Público do Centro de Inteligência Artificial do TJDFT. Integrante do Grupo de Pesquisa de Hermenêutica Administrativa do Centro Universitário de Brasília - UNICEUB. Integrante do Grupo de Pesquisa Centros de Inteligência, Precedentes e Demandas Repetitivas da Escola Nacional da Magistratura - ENFAM.