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Impactos da aplicação da Selic para atualização de condenação civis: incentivo aos devedores

No RESP 1.795.982, STJ considerou Selic como índice adequado para corrigir dívidas civis, gerando impacto financeiro e incertezas jurídicas. Julgamento ainda indefinido.

segunda-feira, 15 de abril de 2024

Atualizado às 16:12

Em recente julgamento do REsp 1.795.982, a maioria dos ministros que participaram do julgamento entenderam que o índice adequado para corrigir as condenações por dívidas civis é a taxa Selic.

Tal entendimento decorreu da interpretação do art. 406 do Código Civil, que prevê que quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada ou provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.

O entendimento anterior do STJ era no sentido que a taxa a ser aplicada deveria ser de 1% ao mês, percentual que incide em créditos tributários não pagos no vencimento, conforme previsto no art. 161, parágrafo 1º do CTN - Código Tributário Nacional. Assim, em geral, as dívidas civis eram atualizadas com a utilização de juros de 1% ao mês, acrescido de correção monetária pelo índice específico do tribunal em questão.

No caso deste julgamento, os fundamentos dos ministros que votaram a favor da aplicação da taxa Selic foram: (i) o Código Civil não faz referência ao CTN para tratar de correção monetária ou juros de mora em âmbito de direito privado e não exige que sejam previstos em índices oficiais separados e distintos; e, (ii) o objetivo do legislador é que a atualização das dívidas acompanhe as escolhas de política econômica feita pelo Estado Brasileiro, de forma que deve ser aplicada a taxa básica de juros da economia, que no momento é a Selic.

Fato é que a consolidação deste entendimento causa um enorme impacto financeiro nas relações econômicas brasileiras e acaba por favorecer os devedores, que certamente utilizarão desta forma de atualização para protelar ainda mais o pagamento da dívida, já que a Selic corresponde a um percentual inferior quando comparado aos índices anteriormente usados.

Especialmente no Brasil em que os processos costumam durar longos anos, a perda para os credores tende a ser significativa.

Além disso, já é possível antever alguns problemas que certamente surgirão ao se adotar a Selic para correção das dívidas, pois ela incorpora os juros moratórios com correção monetária e, no direito privado, nem sempre estes encargos se iniciam na mesma data, como nos casos de indenização de danos morais por responsabilidade extracontratual, em que os juros contam do evento danoso (súmula 54 do STJ) e a correção monetária da data de prolação da decisão que fixou o seu valor (súmula 362).

A utilização da Selic como critério de atualização também pode afetar a segurança jurídica ao se considerar que justamente por sua natureza de política monetária, é sujeita a variações conforme decisões do Banco Central para controle da inflação, e, assim, impede uma previsibilidade da evolução das dívidas.

O julgamento ainda não foi finalizado, pois, além de ter sido suscitado a nulidade do julgamento pelo fato de que dois ministros não estavam presentes, foram suscitadas questões de ordem, já que não foi definida qual o tipo de Selic será usado para corrigir as dívidas civis (se a que utiliza o método dos juros compostos ou a da soma dos acumulados mensais) e, também, o que fazer em casos em que correção monetária e juros de mora não possuem o mesmo marco temporal.

Portanto, ainda há chances - ainda que baixas - de que o entendimento do STJ seja alterado e não prevaleça a utilização da taxa Selic, sendo preciso aguardar a finalização do julgamento e o trânsito em julgado da decisão.

Todavia, fica desde já o alerta acerca dos impactos da utilização da Selic para corrigir as dívidas civis, e, caso este entendimento de fato prevaleça, será o momento de repensar o destino das ações judiciais existentes e criar soluções para minimizar as consequências, como políticas de acordo para se evitar um longo processo judicial e que o valor em discussão não seja adequadamente corrigido.

Laura de Almeida Machado

Laura de Almeida Machado

Advogada da área de Contencioso Cível e Empresarial do escritório Chenut Oliveira Santiago Advogados.

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