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O respeito ao tempo na antecipação do depoimento especial previsto na lei 13.431/17

O depoimento especial, para proteger crianças em casos de violência, pode ser adiado, prejudicando sua credibilidade, apesar da lei buscar a antecipação para preservar a memória fresca da vítima.

quarta-feira, 10 de abril de 2024

Atualizado às 13:38

O depoimento especial é uma das formas de oitiva de criança e adolescente em situação de violência, com vistas à redução de danos e não revitimização, previsto na lei 13.431/17 (art. §1º, art. 4º).1

No entanto, pode ocorrer - e ocorre - de ser requerido por uma das partes ou determinado de ofício pelo juiz, mas se realizar após largo espaço de tempo, a prejudicar a credibilidade de tão sensíveis declarações.

O art. 11 diz que o depoimento especial será tomado, sempre que possível, na forma de produção antecipada de prova2, exatamente para poder colher a memória recente da suposta vítima.3

Confrontando esta possibilidade com o que prescreve a lei, possível que advenha desencontros e incongruências de algumas informações relevantes.

A regra, portanto, é que o depoimento especial seja tomado de forma antecipada, exatamente para evitar que seja colhido após a demora comum dos processos judiciais, tudo isso com a finalidade de preservar o relato mais fiel da suposta vítima.

A exceção, que é a tomada do depoimento do menor na audiência de instrução judicial, deve ocorrer somente se houver, comprovada nos autos, alguma impossibilidade. Ausente a justificação, pode até ser que o ato se realize, mas não há como concluir que os fins perseguidos pelo depoimento especial serão de todo atingidos.

É que o transcurso do tempo, sobretudo em se tratando de crianças, é parte fundante do esquecimento e da posterior modificação da lembrança, como explica di Gesu:

"o transcurso do tempo é fundamental para o esquecimento, pois além de os detalhes dos acontecimentos desvanecerem-se no tempo, a forma de retenção da memória e bastante complexa, não permitindo que se busque em uma gaveta do cérebro a recordação tal e qual ela foi apreendida. E, a cada evocação da lembrança, esta acaba sendo modificada" 4. (grifou-se)

A realização de audiência, opportuno tempore, de depoimento especial antecipado, impede que se interfira na memória das supostas vítimas, evitando assim, a ocorrência de falsas memórias, bem como a perda de memória relativa a fato efetivamente ocorrido.

Em atenção ao dever do órgão ministerial, a narrativa disforme, em geral, incide negativamente sobre importantes elementos da denúncia (CPP, art. 41) como data, o local e dinâmica da ação supostamente delitiva, a qual será inepta se não preenchido este mínimo informativo para imputação.

Portanto, a relação conflituosa entre tempo, memória, esquecimento e possível modificação é melhorada quando a coleta da prova pretendida se dá em prazo razoável.

Verdade é que se dê maior valor à palavra da vítima em processos que tratam de crimes sexuais contra menores. Mas esse peso não pode ser sem critério, como um andarilho cego, a tatear muros procurando o fim do labirinto.

Um destes critérios é a observância do in dubio pro reo deverá, ao final, para resistir à pretensão que não ultrapassa a dúvida razoável, pois não se colhendo da prova produzida a certeza necessária quanto à materialidade e autoria do fato narrado na denúncia, mais ainda quando a palavra da vítima for coletada em depoimento especial após alongado espaço de tempo, contrariando a regra geral da lei e sem justificativa, deve ser o réu absolvido, corando-se a justiça.

 
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1 Pascolati Junior, Ulisses Augusto. Condução Coercitiva da vítima: um vetusto instrumento de poder que deve ser revisitado in Cidadania e Ciência Penal: Livro em homenagem ao Prof. Adalberto José Queiroz Telles de Camargo Aranha. Tirant Brasil, 2023, p. 435. Disponível em: https://biblioteca.tirant.com/cloudLibrary/ebook/info/9786559086252

2 A produção antecipada de prova no processo penal é medida conhecida, já que prevista no art. 366 do CPP, quando o réu é citado por edital. Neste caso da vítima menor, porém, a previsão é mais específica, pois diz respeito apenas à oitiva desta, enquanto a medida prevista no CPP é mais abrangente e genérica, abarcando outros casos, nos quais há risco de perecimento da prova e/ou imprevisibilidade do momento de retomada do curso normal do processo.

3 Art. 11. O depoimento especial reger-se-á por protocolos e, sempre que possível, será realizado uma única vez, em sede de produção antecipada de prova judicial, garantida a ampla defesa do investigado

4 Di Gesu, 2022, p. 169.

Jimmy Deyglisson

Jimmy Deyglisson

Especialista em ciências penais, presidente da ABRACRIM-MA, membro associado do IBDPE (Instituto Brasileiro de Direito Penal Econômico) e L.L.M em direito penal econômico pelo IDP.

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