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Justiça anula multa de mais de R$ 114 mil aplicada pela Sefaz Bahia a um posto de combustível

O caso do posto de combustível na Bahia é um exemplo notável de como defesa jurídica bem fundamentada do contribuinte diante de autuações é imprescindível na busca da concretização da justiça fiscal.

sexta-feira, 22 de março de 2024

Atualizado em 26 de março de 2024 14:38

Frequentemente, os contribuintes baianos se deparam com desafios impostos pela legislação fiscal estadual. Numa dessas situações, um posto de combustíveis localizado no interior da Bahia sofreu a lavratura de um auto de infração que lhe aplicou uma multa de mais de R$ 228 mil reais em razão do descumprimento de obrigações fiscais acessórias, especificamente, a falta de registro na escrita fiscal de mercadorias não sujeitas à tributação. A multa aplicada equivaleu a 1% do valor total das mercadorias não registradas nos arquivos eletrônicos da contribuinte.

Inconformada com a cobrança, a empresa por meio de escritório de advocacia apresentou impugnação administrativa. Entre seus argumentos estava a questão de que a falta de registro não implicou na falta de recolhimento do imposto e que a legislação utilizada como fundamento da penalidade foi revogada logo após a lavratura do auto de infração, sendo certo que a Sefaz Bahia não poderia aplicar multa com base na lei revogada. 

O julgamento na esfera administrativa, apesar disto, considerou o auto de infração parcialmente procedente, reduzindo-se a multa pela metade. Ainda assim a cobrança não era justa.  

A empresa então ajuizou ação requerendo na justiça a anulação do débito fiscal com a aplicação da retroatividade benigna prevista no inciso II do art. 106 do CTN, segundo o qual uma lei posterior mais benigna se aplica a atos ou fatos pretéritos. 

Já depois de distribuída a ação, a certidão fiscal estadual da empresa venceu, e com isto a ela ficou impedida de receber pagamentos de ente público, sendo obrigada a parcelar o débito, pois o pedido liminar ainda não tinha sido apreciado. O Estado, ao contestar a ação, requereu a extinção do processo em razão da suposta confissão do débito, entretanto, submetida a questão à apreciação do poder Judiciário, a preliminar foi rejeitada sob o seguinte fundamento:

"... no presente caso, a suposta "confissão" não surte qualquer efeito no que tange à possibilidade de discussão judicial da obrigação tributária, uma vez que a administração não tem poder para decidir sobre a legalidade ou constitucionalidade do débito, a celebração do Termo de acordo de parcelamento não exclui a apreciação, pelo poder Judiciário, da controvérsia travada na demanda judicial, consoante preconiza o art. 5º, XXXV, da Constituição."

"A "confissão" exigida como condição à adesão ao parcelamento não tem o condão de fazer surgir uma obrigação tributária, cuja fonte é a lei por excelência."

"Não se pode olvidar que o reconhecimento do débito não tem o efeito de tornar legal ou constitucional exigência em descompasso com o ordenamento jurídico. E ainda que se pudesse aventar, hipoteticamente de uma renúncia implícita, o que não se coaduna com o regime jurídico do instituto da renúncia, não há nos autos qualquer indicativo de que o autor tenha "renunciado" ao seu direito de discutir na esfera judiciária o débito referente ao auto de infração."

No mérito, a sentença também foi favorável ao contribuinte; o magistrado entendeu que na situação dos autos deveria ser aplicada a retroatividade benigna, como defendido pela autora. Como a lei que penalizava a falta de registro das entradas das mercadorias não sujeitas à tributação foi revogada, não poderia o Estado continuar exigindo a multa: 

"No que diz respeito ao caso sub examine o auto de infração foi lavrado em 26/9/17. Posteriormente entrou em vigor a lei 13.816, de 21/12/17, que revogou expressamente o inciso XI, do art. 42, da lei 7.014/96, dispositivo que serviu de base à autuação da autora. Assim, deixando de existir a infração, deve ser aplicado o art. 106, II, do CTN."

"Por conseguinte, sobrevindo lei nova que beneficie o contribuinte pela caracterização de qualquer hipótese prevista em uma das alíneas do inciso II, do citado artigo, o interessado, em qualquer grau de jurisdição, enquanto não extinto o crédito, poderá apresentar petição demonstrando os fatos, cuja matéria há de se sobrepor à análise do mérito do crédito (em caso de anteceder o julgamento - sentença ou acórdão - em sede de embargos ou ação ordinária) ou, no caso da apreciação se implementar em executivo fiscal, ser a manifestação conhecida como exceção de pré-executividade e anulado o débito fiscal excutido, já que há muito sepultado o posicionamento de inadmitir tal defesa em sede de execução fiscal. Afinal, mesmo líquido e certo, o título tornou-se inexigível (art. 618, I, CPC) por apresentar-se indevido em decorrência de expressa previsão legal que determina a retroatividade benigna. E mais: Sempre que a lei nova não ressalve os efeitos da lei anterior, verificado uma das hipóteses do art. 106, o juiz, de ofício, pode anular o débito fiscal (alínea a e b, do inciso II) ou reduzir a penalidade (alínea c, do inciso II), sem impingir máculas aos princípios gerais do direito tributário."

Assim, com base na retroatividade benigna, o juízo reconheceu a ausência da infração após a revogação do dispositivo legal utilizado como fundamento da penalidade pela Sefaz Bahia. 

Essa decisão além de representar uma vitória significativa para o contribuinte baiano, estabeleceu um precedente importante quanto à interpretação e aplicação da lei tributária fiscal estadual. O caso do posto de combustível na Bahia é um exemplo notável de como defesa jurídica bem fundamentada do contribuinte diante de autuações é imprescindível na busca da concretização da justiça fiscal. 

Igualmente, a decisão proferida pelo poder Judiciário abre caminho para uma abordagem mais razoável e justa nas questões tributárias submetidas à sua apreciação, reforçando, assim, a confiança do contribuinte na justiça e na previsibilidade do direito tributário brasileiro.

Jaciane Mascarenhas

VIP Jaciane Mascarenhas

Advogada Especialista em Direito Tributário, atua no contencioso e consultivo fiscal há 15 anos, possui expertise em tributos diretos e indiretos, governança tributária e compliance.

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