A governança contratual como elemento de segurança jurídica e estratégia de mitigação de riscos
A governança contratual, por sua vez, pode ser definida como uma série de procedimentos formalmente estipulados que orientam não só a elaboração do documento, mas também o desenvolvimento da relação contratual ao longo do cumprimento do contrato.
quinta-feira, 21 de março de 2024
Atualizado às 07:54
Após muito debate sobre o conceito de governança, especialmente a corporativa, chegou-se ao consenso de que se trata de um sistema formado por princípios, regras, estruturas e processos pelo qual as organizações são dirigidas e monitoradas, com vistas à geração de valor sustentável para a organização, para seus sócios e para a sociedade em geral. Esse sistema baliza a atuação dos agentes de governança e demais indivíduos de uma organização, na busca pelo equilíbrio entre os interesses de todas as partes, contribuindo positivamente para sociedade e para o meio ambiente.
Em linhas gerais, a governança corporativa pressupõe: (i) garantia de transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa; (ii) compromisso com a agenda ESG; (iii) diálogo permanente com stakeholders. (iv) conformidade legal, sistema interno de controles, práticas e procedimentos para decisões eficazes e ainda (v) movimento contínuo rumo à sustentabilidade do negócio.
A governança contratual, por sua vez, pode ser definida como uma série de procedimentos formalmente estipulados que orientam não só a elaboração do documento, mas também o desenvolvimento da relação contratual ao longo do cumprimento do contrato.
Nesse sentido, a governança contratual propõe extrapolar as fronteiras de atuação dos responsáveis pela elaboração de contratos, fazendo com que cada pessoa envolvida se torne um agente responsável pelo contrato, e ainda um identificador de riscos do processo como um todo, compreendendo que a governança contratual é um processo aberto, que pode ser adaptado, seguindo-se as políticas e normas de cada companhia, mas que não pode ser limitado a conceitos de prateleira, aplicáveis a todas as empresas.
A governança contratual pode ter início com a gestão de determinadas cláusulas contratuais, avaliadas com base no histórico da empresa, evoluindo para novos mecanismos de controle de contratos, contendo alternativas que permitam acompanhar a solicitação, aprovações, desenvolvimento da negociação até a assinatura e gestão da execução, isso porque, toda a organização precisa entender a importância de um contrato e como ele pode impactar a organização, especialmente se alguma clausula for descumprida ou alguma obrigação inadimplida.
Cada contrato tem seu ciclo próprio, mas que deve obedecer às seguintes fases: (i) concepção da ideia, do desejo de contratar, que compreende a estratégia corporativa, a estratégia comercial, a identificação de necessidades, a alocação de orçamento, a estratégia contratual, identificação de potenciais prestadores e fornecedores no mercado; (ii) negociação e assinatura, que é composta pela troca e análises das minutas, reuniões, compreensão de assunção de riscos, baseada no apetite de risco de cada companhia, cópias para os stakeholders, arquivo em sistema e delegação de competência pela gestão; (iii) monitoramento (gestão ou execução), que trata de mobilização de pessoal, plano de gerenciamento, monitoramento de pagamentos e cumprimento de obrigações e obediência às disposições contratuais, realização de reuniões de progresso, registro de evolução; e (iv) encerramento (pós-execução): entregas, pagamentos finais, liberação ou execução de garantias, arquivos, retenção de documentos.
Para a gestão eficaz de contratos, a fim de que o documento seja um instrumento condutor de segurança jurídica e comercial para as companhias, aconselha-se que essas promovam a padronização de processos e sistemas de avaliação e métricas de parceiros comerciais, desenvolvam metodologias e programas voltados à inovação e sustentabilidade, utilizando-se de sistemas, softwares de controle e gerenciamento de contratos, mantenham formulários de gerenciamento do fluxo de negociação e obediência à alçadas de aprovações, avaliem sua condição atual, auferindo volumes, valores envolvidos no geral e por área, principais stakeholders, pontos de divergência comuns, existência de planejamento estratégico).
Se a companhia busca se adequar às novas práticas de mercado, é fundamental que a estrutura contratual também seja revista, de modo a identificar os riscos e os impactos e, se for o caso, readequar cada minuta firmada. Nesse ponto, temos espaço para tratar do que podemos chamar de compliance contratual, que nada mais é do que um programa de conformidade envolvendo boas práticas desde a negociação, passando pela elaboração, assinatura, armazenamento e gestão das obrigações e que visa ainda, a garantia de que os fornecedores e subcontratados estejam em compliance com as leis (background check), a adoção de medidas que foquem na agenda ESG, a garantia de que os dados e informações sensíveis dos envolvidos sejam preservados e a garantia do cumprimento de normas anticorrupção, códigos de conduta e políticas da empresa.
Por fim, pode-se afirmar que a governança contratual bem implementada e que traz os benefícios pretendidos para a companhia, alcançando segurança jurídica adequada e mitigando os riscos que podem decorrer do inadimplemento contratual, é aquela em que seus agentes de implantação adotaram como compromissos, medidas e boas práticas: compreender os riscos e oportunidades para o negócio, compreender e avaliar como estes riscos e oportunidades impactam a estratégia da instituição, integração das atividades de gerenciamento de risco corporativo, controles internos e compliance, acompanhamento dos programas de compliance e indicadores de riscos e resultados, monitoramento, treinamento, transparência e responsabilidade.
Renata Assalim
Advogada há 21 anos, atuando na área empresarial. Head das áreas de Contratos e de Compliance do Escritório De Vivo, Castro, Cunha e Whitaker Advogados. Graduada em Direito pela Faculdade Padre Anchieta de Jundiaí, Pós-Graduada em Direito Civil pela FMU, Certified Expert in Compliance pelo Instituto ARC, MBA em Tecnologias Digitais e Inovação Sustentável pela Poli/USP, Certificação em Liderança ESG pela LEC, Membro da Comissão Especial de Compliance da OAB/SP.