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O que é o ProPEN? Governo quer estimular o uso do processo administrativo eletrônico por órgãos estaduais e municipais

O processo administrativo eletrônico - PEN vem sendo adotado por órgãos da administração pública federal por meio do uso de soluções como o SEI e GOV.BR. O decreto 11.946 instituiu um programa de incentivo à adoção do PEN por Estados, Distrito Federal e municípios.

sexta-feira, 15 de março de 2024

Atualizado em 19 de março de 2024 10:31

1. O processo administrativo eletrônico

A digitalização tem sido um vetor importante para a modernização da Administração Pública, visando a eficiência, a economicidade e a transparência. O uso da tecnologia da informação e da comunicação não está restrito ao armazenamento e publicação de documentos, mas à realização integral de processos administrativos por meio eletrônico.

O decreto 8.539/15 dispôs sobre a realização do processo administrativo eletrônico pela Administração Pública Federal. A lei 14.133/21 estabeleceu que os processos administrativos licitatórios devem ser realizados preferencialmente sob a forma eletrônica (art. 17, §3º). 

Agora, o governo dá um novo passo, com a criação de um programa que visa a incentivar a adoção do processo administrativo eletrônico pelos demais entes federativos e padronizar uma solução nacional.

2. Instituição do ProPEN

O Programa Nacional de Processo Eletrônico - ProPEN foi instituído pelo decreto 11.946, de 12/3/24. A iniciativa busca integrar o uso de tecnologias digitais nos processos administrativos em todo o território brasileiro, e não apenas nos órgãos federais.

O ProPEN consiste em um programa de incentivo do uso do processo administrativo eletrônico por Estados, Distrito Federal e municípios. Esse programa de fomento facilita a implementação das soluções já testadas e estabelecidas no âmbito da Administração Pública Federal, de modo a se ter uma infraestrutura de processo administrativo eletrônico única em todo o país.

Ele reflete as orientações do governo destinadas a alavancar a transformação digital e tendências globais de "e-government" ou "digital government". O decreto 11.946 se apoia em normas anteriores, como a lei 14.063/20 (assinaturas eletrônicas em interações com e atos de entes públicos) e a lei 14.129/21 (lei do governo digital), que consubstanciam a disciplina legal para uma ampla adoção dos meios eletrônicos pelos órgãos públicos.

A lei do governo digital estabeleceu em seu art. 5º que "A administração pública utilizará soluções digitais para a gestão de suas políticas finalísticas e administrativas e para o trâmite de processos administrativos eletrônicos". O decreto 11.946 cumpre essa diretriz, por meio da criação de uma solução para a ampla adoção dos sistemas de processos administrativos eletrônicos. 

3. Objetivos e diretrizes

O ProPEN estabelece diretrizes para assegurar que a transição para o modelo eletrônico contribua para a transparência, a sustentabilidade e a eficiência da Administração Pública, considerando as circunstâncias e realidades de cada ente federativo. Entre os objetivos, destacam-se a simplificação das rotinas administrativas e a melhoria dos serviços prestados aos cidadãos.

4. Como aderir?

A participação dos entes federativos no ProPEN será feita por meio de adesão. O compartilhamento de soluções informatizadas do PEN é gratuito. Segundo o art. 3º do decreto 11.946, caberá aos Governadores dos Estados e do Distrito Federal firmar acordo de adesão com o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos para participar do ProPEN. O §2º estabelece que caberá aos Estados a distribuição das soluções informatizadas do ProPEN aos Municípios de sua área territorial. Excepcionalmente, e desde que detenham capacidade de atendimento, alguns municípios e Consórcios Públicos Intermunicipais poderão aderir diretamente ao ProPEN (art. 4º).

Após a celebração do acordo de adesão, o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos disponibilizará os recursos eletrônicos e soluções informatizadas a Estados, Distrito Federal e municípios (art. 3º, §2º do decreto 11.946).1 Caberá ainda ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, por intermédio da Secretaria de Gestão e Inovação orientar os entes acerca dos procedimentos para adesão (art. 5º, inc. II), firmar os acordos de adesão (art. 5º, inc. I), disponibilizar, atualizar e manter a compatibilidade das soluções informatizadas do ProPEN (art. 5º, inc. III e VIII).

A União detém competência para editar normas gerais, cabendo aos demais entes federativos a suplementação e a complementação, devendo respeitar a legislação federal.  A adesão de outros entes federativos a norma instituída pela União não é inédita. A jurisprudência consagrou inclusive a aplicação subsidiária da lei de processo administrativo federal por Estados e municípios (súmula 633 do STJ).2

5. As atribuições de Estados, Distrito Federal e municípios

Caberá aos Estados, Distrito Federal, municípios e Consórcios Intermunicipais partícipes do ProPEN elaborar um plano de implantação no seu âmbito de atuação (art. 7º, inc. I do decreto 11.946), promover ações de treinamento e capacitação dos agentes públicos (art. 7º, inc. V), prover a conectividade para sustentação do processo eletrônico (art. 7 º, inc. VII) e prestar suporte e assistência técnica aos usuários (art. 7º, inc. VIII).

6. Como implementar o PEN?

A autoridade máxima de cada ente será responsável por firmar o acordo de adesão. Em termos práticos, a implementação do PEN começa com um levantamento das soluções disponíveis nos entes aderentes e das necessidades existentes para a adoção das ferramentas do PEN.

A Secretaria de Gestão e Inovação do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos elaborou um programa de dez etapas para orientar a criação dos sistemas de processo administrativo eletrônico. Esse programa, denominado de Jornada de Implantação, consiste em dez etapas, que incluem a constituição de uma estrutura organizacional, a disponibilização de recursos de TI e elaborar normativos internos disciplinando o uso do PEN.

7. As soluções disponíveis do PEN

O processo eletrônico nacional é uma infraestrutura pública formada por diversas ferramentas destinadas a atender as necessidades da Administração Pública para a gestão de documentos. 

As principais soluções disponíveis no âmbito do PEN, e que agora poderão ser adotadas por órgãos públicos de todo país, são: SEI (sistema eletrônico de informações, para registro e gestão de documentos avulsos e processos administrativos eletrônicos); Tramita GOV.BR (plataforma digital de comunicação de sistemas de processo administrativo eletrônico); o NUP (número único de protocolo, para atribuir numeração a documentos avulsos); o Protocolo GOV.BR (para envio de documentos e requerimentos destinados a órgãos públicos); Protocolo Integrado (sistema unificado que fornece um canal de consultas e serviços ao cidadão).

8. O Sistema Eletrônico de Informações - SEI

O SEI é um dos recursos mais relevantes do PEN. Trata-se de um recurso criado pelo TRF-4, adotado pelo governo federal como solução de processo administrativo eletrônico. Com a criação do ProPEN, a tendência é que o SEI se torne a solução padronizada para todos os órgãos da Administração Pública em todas as esferas federativas. Assim, o SEI será adotado para a realização de processos administrativos sancionatórios, de controle e de outras espécies.

Existe experiência consolidada na adoção de meios eletrônicos para a tramitação de processos judiciais. A lei 11.419/06 estabelece que cada órgão do Poder Judiciário poderá instituir sistema eletrônico próprio, usando preferencialmente programas com código aberto. Hoje coexistem diversos sistemas, como EPROC, Projudi, PJe, ESaj, JPe-Themis e os sistemas próprios de STF e STJ. A lei 11.419/06 disciplina os procedimentos e requisitos do processo eletrônico, com garantias às partes.

9. Quem já aderiu ao PEN

Segundo dados do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, mais de 150 órgãos já adotam o Tramita GOV.BR, mais de 120 adotam o SEI, mais de 60 já adotam o Protocolo GOV.BR e cerca de 70 contam com o Protocolo Integrado.3 O primeiro município do país a aderir ao PEN foi Angra dos Reis, em um projeto piloto que antecedeu ao ProPEN. O município instituiu o SEI, seguindo os modelos disponibilizados pelo Governo Federal e o Estado do Rio de Janeiro.4 O Estado do RS também já celebrou acordo de adesão para uso do PEN.5

10. Resultados previstos

A implementação do ProPEN pode produzir benefícios significativos tanto para a Administração Pública quanto para as partes envolvidas em processos administrativos. Haverá a redução do uso de toneladas de papel, gerando impactos ambientais positivos e reduzindo os custos.

A tramitação de processos administrativos será mais eficiente e célere. Com o uso de meios eletrônicos, não haverá necessidade de carga e transporte dos autos para setores ou agentes públicos. Essa movimentação será realizada em segundos, por meio de um clique.

A maior transparência nos procedimentos administrativos eletrônicos tende a facilitar a atuação das partes e a fortalecer a confiança na Administração Pública, melhorando significativamente a qualidade dos serviços prestados.

Outro resultado esperado do ProPEN é de que exista uma padronização das soluções adotadas no território nacional. Isso facilitará o uso pelos cidadãos e propiciará ganhos pelo compartilhamento da experiência entre os diversos órgãos.

11. Desafios e perspectivas

Apesar das muitas vantagens, a implementação do ProPEN enfrenta desafios, especialmente no que diz respeito à adesão dos Estados e a distribuição aos municípios. Como caberá aos Estados firmar os acordos de adesão com o MGI, é possível esperar uma grande variedade de adoção, de acordo com as prioridades e capacidades dos Estados.

Além disso, fica em aberto a questão da distribuição das soluções aos Municípios, da infraestrutura digital necessária e a necessidade de treinamento e capacitação dos servidores públicos. 

É necessário que o SEI seja aperfeiçoado para se consolidar como uma solução que efetivamente assegure a transparência dos atos praticados no processo administrativo eletrônico. A experiência do processo judicial eletrônico deve ser aproveitada no âmbito do SEI. É preciso viabilizar acesso à integra dos autos do processo administrativo pelas partes e seus representantes. Atualmente, não são raros os casos em que o SEI limita o acesso de documentos às partes, inviabilizando o exercício de prerrogativas fundamentais para a defesa de seus interesses.

12. Conclusão

A instituição do ProPEN representa um passo significativo na jornada de modernização da Administração Pública brasileira. As perspectivas são amplamente positivas, com expectativas de que o programa se consolide como referência para a consolidação do processo administrativo eletrônico em todo o território nacional. No entanto, como qualquer reforma, traz consigo diversos desafios. A transição para processos administrativos totalmente digitais promete eficiência e transparência, mas a efetivação desses benefícios dependerá de uma implementação cuidadosa, que considere os direitos das partes, as disparidades regionais em termos de infraestrutura tecnológica e capacitação de pessoal. Ao observarmos o desenvolvimento e a implementação do ProPEN, é essencial continuar avaliando seu impacto e ajustando estratégias para superar tais desafios, garantindo que o programa atinja seu pleno potencial.

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1 As informações sobre a adesão ao PEN estão disponíveis no site do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos: https://www.gov.br/gestao/pt-br/assuntos/processo-eletronico-nacional/Jornada-do-PEN/1-adesao. Acesso em 13.03.2024.

2 Súmula 633 do Superior Tribunal de Justiça: "A Lei n. 9.784/1999, especialmente no que diz respeito ao prazo decadencial para a revisão de atos administrativos no âmbito da Administração Pública federal, pode ser aplicada, de forma subsidiária, aos estados e municípios, se inexistente norma local e específica que regule a matéria: "A Lei 9.784/1999, especialmente no que diz respeito ao prazo decadencial para a revisão de atos administrativos no âmbito da Administração Pública federal, pode ser aplicada, de forma subsidiária, aos estados e municípios, se inexistente norma local e específica que regule a matéria."

3 Informações extraídas da aba PEN em números. Disponível em https://www.gov.br/gestao/pt-br/assuntos/processo-eletronico-nacional. Acesso em 13.03.2024.

4 Disponível em https://www.gov.br/gestao/pt-br/assuntos/processo-eletronico-nacional/noticias/2023/gestao-firma-primeiro-acordo-para-uso-do-sistema-eletronico-de-informacoes-nos-municipios. Acesso em 13.03.2024.

5 Disponível em https://www.gov.br/gestao/pt-br/assuntos/processo-eletronico-nacional/noticias/2024/gestao-e-rio-grande-do-sul-firmam-acordo-para-uso-do-sistema-eletronico-de-informacoes. Acesso em 13.03.2024.

Marçal Justen Neto

Marçal Justen Neto

Sócio do escritório Justen, Pereira, Oliveira & Talamini Advogados Associados.

Lucas Spezia Justen

Lucas Spezia Justen

Acadêmico de Direito (IDP). Colaborador de Justen, Pereira, Oliveira e Talamini (Brasília).

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