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Tutela rescisória no Juizado Especial: Após 15 anos, STF decide pela possibilidade de desconstituição da coisa julgada

A desconstituição da coisa julgada, especialmente nos Juizados Especiais, é debatida. A ação rescisória, regulamentada pelo CPC, corrige vícios de julgamento, essencial para manter a confiança no sistema jurídico, com avanços reconhecidos pelo STF.

terça-feira, 12 de março de 2024

Atualizado em 15 de março de 2024 14:14

A desconstituição da coisa julgada é tema sempre debatido e, quando se trata de lei específica, como é o caso daquela que rege os Juizados Especiais, a questão fica ainda mais delicada. 

A ação rescisória é um importante mecanismo de correção de vícios de julgamento já transitados, essencial para a manutenção e confiança dos jurisdicionados no sistema jurídico. Ao observarmos os dispositivos que regulamentam o seu cabimento (art. 966 e seguintes do CPC), percebemos, à exceção do art. 966, VII, que se tratam de hipóteses em que a coisa julgada sequer poderia ter se operado, tamanha a injustiça da decisão.

O STF já vinha avançando na autorização para a desconstituição da coisa julgada eivada de grave irregularidade, flexibilizando o rol previsto no CPC/73. Em 2016, com o julgamento da ADIn 2418, decidiu pela possibilidade de rescisão da chamada 'coisa julgada inconstitucional', regra que ganhou previsão no CPC/15, que entrou em vigência no mesmo ano.

Mas poucos debates quanto à coisa julgada foram tão acalorados quanto a possibilidade de sua flexibilização no âmbito dos Juizados Especiais, já que a lei 9.099/95 não traz previsão semelhante; ao contrário, seu art. 95 veda a propositura de ação rescisória contra decisões prolatadas sob seu rito. O STJ já tinha se pronunciado no sentido de que incumbe aos TJs exercer o controle da competência dos Juizados Especiais, mas havia ação que discutindo o tema perante o STF, que, encontrou seu deslinde em novembro/23, com a publicação de decisão no RE 586068, com repercussão geral sob o Tema 100.

A decisão reformou o acórdão da 2ª Turma Recursal do Paraná, reestabelecendo a decisão do juízo de 1º grau do Juizado Especial Federal quanto ao mérito da impugnação ao cumprimento de sentença formulada pelo INSS. No STF a procedência se deu por maioria, seguindo o entendimento do voto do ministro Gilmar Mendes, e vencidos a ministra relatora, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Edson Fachin.

O RE foi afetado à repercussão geral em 2008, ainda na vigência do CPC/73, porém, a norma questionada, parágrafo único do art. 741 do CPC/73, encontra previsão idêntica no CPC vigente, no § 5º do art. 535. Além disso, o STF realizou modulação temporal dos efeitos da decisão, permitindo desconstituição da coisa julgada no âmbito dos juizados especiais desde que o trânsito em julgado da fase de conhecimento seja posterior a 27/8/01.

Por unanimidade, foram fixadas as seguintes teses: "1) é possível aplicar o art. 741, parágrafo único, do CPC/73, atual art. 535, § 5º, do CPC/15, aos feitos submetidos ao procedimento sumaríssimo, desde que o trânsito em julgado da fase de conhecimento seja posterior a 27.8.01; 2) é admissível a invocação como fundamento da inexigibilidade de ser o título judicial fundado em 'aplicação ou interpretação tida como incompatível com a Constituição' quando houver pronunciamento jurisdicional, contrário ao decidido pelo Plenário do STF, seja no controle difuso, seja no controle concentrado de constitucionalidade; 3) o art. 59 da lei 9.099/95 não impede a desconstituição da coisa julgada quando o título executivo judicial se amparar em contrariedade à interpretação ou sentido da norma conferida pela Suprema Corte, anterior ou posterior ao trânsito em julgado, admitindo, respectivamente, o manejo (i) de impugnação ao cumprimento de sentença ou (ii) de simples petição, a ser apresentada em prazo equivalente ao da ação rescisória."

Vê-se das linhas finais do julgamento que o STF buscou preservar o procedimento simplificado dos juizados especiais, fazendo constar que: "(i) se o entendimento do STF for anterior ao fim do processo no juizado, a pessoa poderá pedir ao juiz que impeça o cumprimento da decisão inconstitucional (por impugnação ao cumprimento de sentença); e (ii) se o entendimento do STF for posterior ao fim do processo no juizado, a pessoa poderá pedir ao juiz a revisão da decisão definitiva (por simples petição), desde que no mesmo prazo da ação rescisória (dois anos)".

Com a força vinculante desta decisão (art. 927, IV do CPC), a solução deverá ser aplicada em cerca de 2.522 casos sobrestados em todo país.

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https://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/RE586068informac807a771oa768sociedadecoisajulgadanosjuizadosespeciaisvF.pdf

Manuelle Senra Colla

Manuelle Senra Colla

Advogada sócia do escritório Ernesto Borges Advogados, docente no curso de Direito, especialista em Direito Civil e Processo Civil. É membro na comissão de Direito Processual Civil e Vice-Presidente da Comissão de Estudos em Execução Civil da OAB/MS.

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