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Usucapião extrajudicial

A importância da propriedade. A usucapião extrajudicial como forma de regularização de imóveis.

quarta-feira, 6 de março de 2024

Atualizado às 08:13

Usucapião é um daqueles nomes que todos já ouviram falar, mas muitos, que não são da área, não sabem do que se trata exatamente. Primeiramente, o correto é dizer "a usucapião", e não "o usucapião".

Uma vez aplicado o artigo correto, vamos para o que interessa: afinal, o que é a usucapião?

Antes de adentrar o assunto, temos um dado interessante a compartilhar: você sabia que metade dos imóveis no Brasil não estão regularizados perante o Cartório de Registro de Imóveis?

O fato é que a propriedade de imóveis, no Direito Brasileiro, só é transmitida com o registro da escritura pública no Cartório de Registro de Imóveis. É assim que o legislador brasileiro quis, uma vez que em alguns países europeus, por exemplo, um contrato particular, sem qualquer registro em Cartório, é apto a realizar esse tipo de transferência.

Mas, então, você pode estar questionando: "ora, eu fiz um contrato de compra e venda de uma casa/apartamento, reconheci firma, inclusive, no Cartório de Notas, e apenas não registrei a escritura no Cartório de Registro de Imóveis, e então esse imóvel não é meu?" E a resposta é "sim", ele é teu, mas há algumas observações a serem feitas. O imóvel é teu sim, pois você possui um dos atributos da propriedade que é a posse, e posse é o exercício de fato dos poderes do proprietário. No entanto, posse não é direito real (que consta expressamente no art. 1.225 do Código Civil). Portanto, posse não é direito, posse é fato. Posse é algo que acontece na prática, não algo que consta em documento. 

Compra e venda de imóveis sem registrar o contrato/escritura pública no cartório de registro de imóveis é algo bastante comum. E com esse contrato sem registro, a posse é transmitida, e o comprador se torna possuidor. Esse comprador só não seria mantido na posse do imóvel se uma outra pessoa aparecesse reclamando o imóvel, dizendo ser dona dele, e apresentasse a escritura pública registrada no Cartório de Registro de Imóveis, constando o seu nome como proprietário.

Portanto, se você comprou um imóvel e levou a registro a escritura pública no Cartório de Registro de Imóveis, então você possui a propriedade do bem, e consequentemente a posse do mesmo. Mas, se você comprou o imóvel e não levou a escritura pública a registro no Cartório de Registro de Imóveis, então você tem a posse, mas não a propriedade.

Na prática, o possuidor tem os mesmos poderes do proprietário, podendo usar, gozar e dispor desse imóvel. Mas o jus possessionis persevera até que o jus possidendi o extinga, ou seja, o direito do possuidor prevalece até que o direito do proprietário o extinga. Imagine que você comprou um imóvel através de um contrato de compra e venda sem registrá-lo no Cartório de Registro de Imóveis. O imóvel é teu e você detém a posse do bem. E então, depois de alguns meses, aparece uma pessoa dizendo que é dona desse mesmo imóvel que você comprou, mas esta pessoa detém a escritura registrada no Cartório de Registro de Imóveis, e portanto ela é a proprietária, ela detém o domínio da coisa. Nesse caso, a pessoa que detém a escritura pública registrada em Cartório ficará com o bem, cabendo a você, que não registrou a escritura, apenas tentar reaver o valor pago de quem te vendeu o bem.

Pelo acima exposto, percebe-se que é uma grande vantagem, ao comprar um imóvel, registrar o contrato/escritura pública no Cartório de Registro de Imóveis, sem contar que ao constar o teu nome nesta escritura, seja através de compra e venda, ou através de usucapião, o imóvel tem grande valorização, e alguns defendem que essa valorização é da ordem de, no mínimo, 30%.

Agora que já explicitamos, brevemente, sobre posse e propriedade, abordaremos, mais especificamente, a usucapião.

Como foi afirmado anteriormente, metade dos imóveis no Brasil não estão regularizados perante o Registro de Imóveis. E por que a usucapião é tão importante? Porque muitas vezes é a única forma, ou a forma mais fácil, de fazer essa regularização. E é assim pois, na maioria das vezes, o imóvel foi comprado há muitos anos, e nem se sabe ao certo o paradeiro de quem vendeu, e muitas vezes nem quem vendeu tinha seu nome registrado na matrícula do imóvel. E tendo em vista a usucapião ser forma originária de aquisição da propriedade imóvel, não há, portanto, transferência de uma pessoa para outra, não há necessidade de se localizar o vendedor do imóvel. Portanto, a usucapião é forma originária de aquisição de propriedade, não ocorrendo transferência do vendedor ao comprador, ou seja, você preenche os requisitos de determinada espécie de usucapião, prova a posse ad usucapionem com animus domini, e o imóvel é registrado no teu nome.

E o CPC/15, juntamente com o provimento 65/17 do CNJ, trouxe a possibilidade de realização do processo de usucapião totalmente de forma extrajudicial, ou seja, no Cartório de Registro de Imóveis, sem necessidade de ação judicial.

A usucapião ainda pode ser feita na via judicial também, ficando a critério do requerente/solicitante optar, mas a via extrajudicial é muito mais vantajosa por ser mais barata, e muito mais rápida.

As principais espécies de usucapião são a Extraodinária e a Ordinária. A Extraordinária é a que se exige a posse do imóvel, como se fosse seu, pelo prazo de 15 anos, sem interrupção e nem oposição, ou seja, posse mansa e pacífica; posse ad usucapionem e animus domini. Não é necessário justo título e boa-fé. A usucapião Ordinária é a que se exige a posse do imóvel por dez anos, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé. O justo título poderia ser uma escritura de compra e venda que nunca foi registrada no Cartório de Registro de Imóveis. Tem boa-fé, por exemplo, aquele que se comporta como dono, que paga IPTU, etc. É necessário que o vendedor do bem tenha estado presente, e a posse ser exercida diretamente no bem, e prova de posse mansa e pacífica.

Existe também a usucapião especial, que não será tratada no presente artigo.

Uma vez que o requerente se enquadre nos requisitos de uma das espécies de usucapião, então é necessário que um engenheiro civil ou arquiteto elabore uma planta e memorial descritivo do imóvel, e juntamente com as provas de posse, encaminha-se a documentação ao Tabelião de Notas que elaborará uma Ata descrevendo suas observações sobre a situação do imóvel e da documentação apresentada. Uma vez feita a Ata, esta deve ser encaminhada ao Registro de Imóveis, juntamente com toda a documentação, para que o processo da usucapião tenha início. E uma vez que o processo tenha terminado, e estando tudo em ordem, o Registrador registra a aquisição da propriedade pela usucapião e, se necessário for, realiza a abertura de matrícula para o imóvel.

Observe-se que o reconhecimento extrajudicial de usucapião, em Cartório, será requerido pelo interessado, que deve estar representado por advogado, conforme art. 216-A da lei 6.015/73 (lei dos registros públicos), artigo esse que foi incluído pelo CPC/15.

Portanto, deter a propriedade do imóvel, que pode ser adquirida pela usucapião, é de extrema importância, pois a propriedade é um Direito Real constante do Código Civil, o que confere muita segurança e valorização ao bem.

Marco Aurélio Pinheiro

VIP Marco Aurélio Pinheiro

Advogado. Especialista em Direito Civil pelo Mackenzie, com Extensão em Direito Processual Civil pela FGV. Presidente da Comissão de Direito Civil da OAB - Subseção de Itapevi/SP.

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