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Desta vez, a discussão é sobre a retirada do ICMS do cálculo dos créditos de PIS e Cofins

Em 2023, o governo editou a MP 1.159/23 excluindo o ICMS na apuração de créditos do PIS e Cofins. Originou-se da Receita Federal após o RE 574.706, mas não foi adiante. A MP perdeu eficácia por não virar lei no prazo constitucional.

sábado, 27 de janeiro de 2024

Atualizado em 26 de janeiro de 2024 14:58

No início do ano de 2023, o governo editou a MP 1.159/23, que determinava que o contribuinte não computasse o ICMS na apuração de créditos do PIS e da Cofins.

Este raciocínio decorreu inicialmente da Receita Federal do Brasil, um tempo após não obter êxito no RE 574.706, que julgou a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. Todavia, o entendimento da Receita Federal não prosperou, após o Parecer SEI 14.483/21/ME, em que a Procuradoria- Geral da Fazenda Nacional externou o entendimento jurídico sobre a decisão do STF, entendendo que "a exclusão do ICMS da base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, tal como definida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Tema n. 69, não autoriza a extensão à apuração dos créditos dessas contribuições".

A MP 1.159/23 perdeu a sua eficácia, pois não foi convertida em lei no tempo previsto pelo art. 62 da Constituição.

Todavia, foi inserido na lei 14.592/23, que foi fruto de conversão da MP 1.147/22, que o ICMS deve ser excluído do cômputo de créditos de PIS e Cofins.

A MP 1.147/22 tratava do Perse, um benefício fiscal concedido para determinados setores em razão dos efeitos da pandemia. Ou seja, a determinação de que o ICMS deve ser excluído do cômputo de créditos de PIS e Cofins, constitui um "jabuti legislativo", tendo em vista que foi fruto de uma emenda parlamentar, situação que o STF tem entendimento pacificado de que é inconstitucional.

O STF, ao julgar a ADIn 5.127/16, decidiu que o Congresso Nacional não pode incluir, em medidas provisórias, emendas parlamentares que não tenham pertinência temática com a norma, como é o presente caso, em que a medida provisória que foi convertida na mencionada lei tratava de um benefício fiscal concedido para determinados setores, tendo em vista os efeitos da pandemia Covid-19.

A lei 14.592/23, pelo entendimento do STF na ADIn 5.127, deveria tratar exclusivamente do Perse; não poderia ter dado redação às leis 10.637/02 e 10.833/03, como fez.

É evidente a ausência de pertinência temática entre as matérias que foram tratadas na MP 1.147/22 e na MP 1.159/23.

A previsão de que o ICMS deve ser excluído do cômputo dos créditos de PIS e Cofins constitui um "jabuti legislativo", pois pegou "carona" em uma conversão de medida provisória em lei que não tinha correspondência temática.

Matéria inserida, mediante emenda parlamentar, em projeto de conversão de medida provisória em lei - instituto de iniciativa privativa do Presidente da República -, que trata de objeto absolutamente distinto daquele originalmente veiculado no texto apresentado à conversão é inconstitucional, por evidente afronta à separação dos Poderes, bem como é ilegal por violação da lei Complementar 95/98.

No julgamento da citada ADIn o STF entendeu que: "caracterizado pela introdução de matéria estranha a medida provisória submetida à conversão, não denota, a meu juízo, mera inobservância de formalidade, e sim procedimento marcadamente antidemocrático, na medida em que, intencionalmente ou não, subtrai do debate público e do ambiente deliberativo próprios ao rito ordinário dos trabalhos legislativos a discussão sobre as normas que irão regular a vida em sociedade." Nesses casos, há violação do princípio democrático e do devido processo legislativo, previstos nos arts. 1º, caput, parágrafo único, 2º, caput, e 5º, caput, e LIV, todos da Constituição da República.

O art. 7°, inciso II da LC 95/98 tem a seguinte redação:

"Art. 7°

(...)

II - a lei não conterá matéria estranha a seu objeto ou a este não vinculada por afinidade, pertinência ou conexão;"

Ainda que com a explícita violação à LC 95/98 e a Constituição, houve violação à Resolução n°1/02 do Congresso Nacional, que, em seu art. 4°, §4° proíbe o vício no processo legislativo que desencadeou o contrabando legislativo. Veja-se:

"Art. 4°

(...)

§ 4º É vedada a apresentação de emendas que versem sobre matéria estranha àquela tratada na Medida Provisória, cabendo ao Presidente da Comissão o seu indeferimento liminar."

A observância do devido processo legislativo é matéria que se insere na análise dos pressupostos de admissibilidade do texto enviado ao Senado Federal.

Diante da flagrante ilegalidade e inconstitucionalidade da previsão, o Poder Judiciário vem deferindo medidas liminares favoráveis aos contribuintes, podendo ser citadas as liminares concedidas nos processos 1094034-84.2023.4.06.3800, 5001361-70.2023.4.03.6133 e 5058002-97.2023.4.02.5101.

Tal conduta do Poder Legislativo deve ser reconhecida como uma grande violação do princípio democrático, não podendo ser convalidada pelo Poder Judiciário.

Sem alongar sobre o tema violação de princípios, é inadmissível ignorar este princípio constitucional, haja vista que, nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello: "[...] violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio violado, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra".

Gustavo Leite

Gustavo Leite

Advogado no escritório Martins Freitas Advogados Associados.

André Freitas

André Freitas

Sócio Administrador no escritório Martins Freitas Advogados Associados.

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