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Aspectos relevantes da recém-sancionada lei das bets (lei 14.790/23)

Lei 14.790/23 ('lei das Bets') regulamenta apostas esportivas, estabelecendo tributação, critérios de exploração, sanções e atribuições ao Ministério da Fazenda.

quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

Atualizado em 12 de janeiro de 2024 09:50

O Presidente da República sancionou, com vetos, a lei 14.790/23 ("lei das Bets"), publicada no Diário Oficial da União no dia 30 de dezembro de 2023, para regular o mercado de apostas esportivas e promover alterações nas leis 5.768/71, 13.756/18 e na MP 2.158-35/01.

A lei das Bets, que trata de apostas virtuais, físicas, eventos esportivos reais e jogos online, estabelece critérios de tributação, requisitos para exploração do serviço, destinação das receitas arrecadadas, determina as sanções em caso de descumprimentos, além de definir as competências do Ministério da Fazenda na regulamentação, autorização, no monitoramento e na fiscalização das atividades relacionadas ao mercado de apostas de quota fixa. 

Dentre os principais aspectos da lei das Bets, podem ser destacados os seguintes:

  • Regime de exploração. As apostas de quota fixa serão exploradas em ambiente concorrencial, com prévia autorização a ser concedida pelo Ministério da Fazenda. A autorização para essa exploração será um ato discricionário do Ministério da Fazenda, levando em consideração o interesse nacional e a proteção dos interesses da coletividade;
  • Prazo e contraprestação da autorização. A autorização será outorgada ao chamado "agente operador de apostas" em caráter personalíssimo (ou seja, apenas para aquela pessoa jurídica), inegociável e intransferível, com prazo de duração de 5 anos e mediante o pagamento de contraprestação de até 30 milhões de reais, considerando o uso de 3 marcas comerciais a serem exploradas em seus canais eletrônicos;
  • Revisão da autorização por operações societárias. A autorização outorgada ao agente operador de apostas poderá ser revista em processo administrativo específico, nos termos da regulamentação a ser criada pelo Ministério da Fazenda, sempre que houver na pessoa jurídica autorizada alguma operação societária (fusão, cisão, incorporação e transformação), bem como transferência ou modificação de controle societário direto ou indireto;
  • Requisitos para outorga. Somente serão elegíveis a receber a autorização para exploração de apostas de quota fixa as pessoas jurídicas constituídas segundo a legislação brasileira, com sede e administração no território nacional, que atenderem às exigências constantes da regulamentação a ser definida pelo Ministério da Fazenda - que deverá tratar, por exemplo, da obrigatoriedade de participação de sócio brasileiro no agente operador de apostas, com um percentual mínimo do capital social;
  • Impedimentos societários. O sócio ou acionista controlador de qualquer agente operador de apostas, individual ou integrante de acordo de controle, não poderá deter participação, direta ou indireta, em Sociedade Anônima do Futebol - SAF ou organização esportiva profissional, nem atuar como dirigente de equipe desportiva brasileira;
  • Tributação. Além da incidência e cobrança de outros impostos e demais tributos (IRPJ/CSLL/PIS/COFINS/ISS), os agentes operadores de apostas também serão tributados em 12% sobre o Gross Gaming Revenue (GGR) - receita bruta da operação. Os prêmios líquidos dos apostadores, por sua vez, serão tributados pelo IRPF à alíquota de 15% (aplicável também à modalidade de fantasy sport);
  • Políticas corporativas. A expedição e manutenção da autorização dependerá de comprovação, pela pessoa jurídica interessada, de que adotou políticas, procedimentos e controles internos, incluindo: (i) prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo; (ii) incentivos ao jogo responsável; (iii) prevenção aos transtornos de jogo patológico; e (iv) integridade das apostas e prevenção à manipulação de resultados ou fraudes; entre outras;
  • Prazo de adequação. O Ministério da Fazenda estabelecerá condições e prazos, não inferiores a 6 meses, para que as pessoas jurídicas que já estiverem, hoje, em atividade possam se adequar às disposições da Lei das Bets e às normas por ele estabelecidas em regulamentação específica;
  • Regras de publicidade. A Lei das Bets prevê uma série de regras de publicidade e propaganda1 que deverão ser observadas pelas loterias de apostas de quota fixa, como (i) avisos de desestímulo ao jogo e advertência dos seus malefícios, (ii) elaboração de código de conduta e difusão de boas práticas para conscientização dos apostadores e (iii) proibição a publicidades que veiculem afirmações infundadas sobre as probabilidades de ganho dos apostadores ou que sugiram que a aposta pode constituir alternativa de solução para problemas financeiros;
  • Impedimentos para apostar. É vedada a participação na condição de apostador, direta ou indiretamente, inclusive por interposta pessoa, de, por exemplo: (i) proprietário, administrador, diretor, pessoa com influência significativa, gerente ou funcionário do agente operador de apostas; (ii) pessoa que tenha ou possa ter qualquer influência no resultado do evento esportivo objeto das apostas, como árbitros, técnicos, integrantes da comissão técnica, membro de órgão da administração de competição, atleta participante de competições organizadas pelas entidades do Sistema Nacional do Esporte; e (iii) agente público com atribuições diretamente relacionadas à regulação, controle e fiscalização da atividade;
  • Aplicabilidade do CDC. Ficam assegurados aos apostadores todos os direitos dos consumidores previstos no Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990);
  • Vedação aos bônus promocionais. É vedado ao agente operador de apostas conceder, sob qualquer forma, adiantamento, antecipação, bonificação ou vantagem prévia, ainda que a mero título promocional, de divulgação ou de propaganda, para realização de apostas;
  • Forma de pagamento. O pagamento dos prêmios deverá ser efetuado exclusivamente por meio de transferências, de créditos ou de remessas de valores em favor de contas bancárias de titularidade dos respectivos apostadores e que sejam mantidas por eles em instituições financeiras com sede e administração no Brasil, e que sejam autorizadas pelo Banco Central do Brasil a funcionaram neste país;
  • Fiscalização. O agente operador de apostas deverá utilizar sistemas auditáveis, aos quais deverá ser disponibilizado acesso irrestrito, contínuo e em tempo real ao Ministério da Fazenda, sempre que por este requisitado;
  • Penalidades. A Lei das Bets estabelece uma série de penalidades aplicáveis às pessoas físicas e jurídicas que infringirem as regras nela dispostas, como multas de até 2 bilhões de reais, suspensão parcial ou total do exercício das atividades, proibição de se obter titularidade de nova autorização, proibição de realizar determinadas atividades ou modalidades de operação pelo prazo máximo de 10 anos, entre outras; e
  • Desnecessidade de autorização para Fantasy Sport. A Lei das Bets dispensa de autorização do poder público a atividade de desenvolvimento ou prestação de serviços relacionados ao fantasy sport - definido como o esporte eletrônico em que ocorrem disputas em ambiente virtual, a partir do desempenho de pessoas reais.

Dentre os vetos presidenciais, destacam-se os relacionados aos encargos tributários. Houve a exclusão da regra que estabelecia a isenção de tributação para prêmios anuais inferiores a R$ 2.112,00 (primeira faixa do IRPF), de modo que todos os apostadores passam a ter seus prêmios líquidos tributados à alíquota de 15%, sem isenções.

Além disso, excluiu-se a conceituação de "prêmios líquidos" e a definição de que os apostadores teriam a apuração do imposto de renda com periodicidade anual, com pagamento até o último dia útil do mês subsequente ao da apuração - ambas anteriormente previstas no PL que originou a lei das Bets (PL 3.626/23).

Os trechos vetados serão analisados pelo Congresso Nacional em sessão conjunta, na qual deputados e senadores poderão manter ou derrubar os vetos presidenciais.

O mercado de apostas esportivas está a pleno vapor no Brasil, sendo as empresas envolvidas no mercado de apostas atualmente as maiores financiadoras do futebol nacional2, mediante patrocínios a clubes, emissoras de televisão e jogadores.

As expectativas de arrecadação do Governo com a regulação da atividade são bilionárias, como ocorre, aliás, em outros países. No Reino Unido, por exemplo, onde a cultura e tradição de apostas esportivas é secular, são arrecadados aproximadamente 26 bilhões de reais por ano3.

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1 A propósito, o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária divulgou, no dia 29 de dezembro de 2023, a criação do Anexo "X" do Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, estabelecendo regras para a publicidade de apostas. Disponível em: http://www.conar.org.br/pdf/conar-regras-apostas-folder-web.pdf.

2 Ao todo, 39 dos 40 clubes das Séries A e B do Campeonato Brasileiro de 2023 possuíam patrocínios de casas de apostas (ESTADÃO. Como os sites de apostas se tornaram o maior financiador do futebol brasileiro. Disponível em: https://www.estadao.com.br/esportes/futebol/como-os-sites-de-apostas-se-tornaram-o-maior-financiador-do-futebol-brasileiro/).

3 BAND. Apostas esportivas representam bilhões aos cofres públicos de países europeus. Disponível em: https://www.band.uol.com.br/noticias/jornal-da-band/ultimas/apostas-esportivas-representam-bilhoes-aos-cofres-publicos-de-paises-europeus-16633080.

Rodrigo R. Monteiro de Castro

Rodrigo R. Monteiro de Castro

Professor de Direito Comercial do IBMEC/SP. Ex-presidente do MDA. Ex-presidente do IDSA. Ex-professor de Direito Comercial do Mackenzie. Doutor em Direito Comercial pela PUC. Sócio do escritório monteiro de castro, setoguti advogados.

Leonardo Barros Corrêa de Araújo

Leonardo Barros Corrêa de Araújo

Graduado em Direito pela UFPE. Mestrando em Direito Comercial pela PUC/SP. Pós-graduado (LL.M.) em Direito Societário no Insper/SP. Membro da Comissão de Direito Bancário da OAB/PE. Advogado com atuação em Direito Societário no escritório monteiro de castro, setoguti advogados.

Daniel Jerônimo Magalhães

Daniel Jerônimo Magalhães

Bacharel em direito pela UFPE (Universidade Federal de Pernambuco). Advogado atuante na área de direito societário, M&A e mercado de capitais do Monteiro de Castro Setoguti Advogados.

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