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Voto e vigilância: estruturando a regulação da inteligência artificial em eleições municipais no Brasil

A IA em eleições municipais traz desafios com deepfakes. Autoridades buscam regulamentação para conter riscos e promover uso responsável e inovador.

quinta-feira, 28 de dezembro de 2023

Atualizado às 13:38

À medida que a IA permeia diversos aspectos da vida cotidiana, sua expansão impõe desafios e oportunidades significativas, especialmente em períodos críticos como eleições municipais. A proliferação de deepfakes e outras ferramentas de manipulação digital durante esses períodos eleitorais ilustra a urgência de uma regulamentação apropriada. Autoridades do executivo, legislativo e judiciário brasileiro estão cada vez mais conscientes dessa necessidade, mobilizando-se para estabelecer um marco legal que não apenas contenha os riscos associados ao uso indevido da IA, mas também promova seu desenvolvimento responsável e inovador.

A proposta de regulamentação apresentada no Senado reflete uma abordagem equilibrada, enfatizando a importância da participação humana no ciclo de IA e a rastreabilidade das decisões, visando garantir transparência e responsabilidade. Trata-se do PL 2338/23 de autoria do Senador Rodrigo Pacheco, que logo em seu primeiro artigo, traz: "Art. 1º Esta lei estabelece normas gerais de caráter nacional para o desenvolvimento, implementação e uso responsável de sistemas de IA no Brasil, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais e garantir a implementação de sistemas seguros e confiáveis, em benefício da pessoa humana, do regime democrático e do desenvolvimento científico e tecnológico".

A adoção da IA no processo eleitoral carrega consigo um paradoxo de empoderamento e risco. Por um lado, tecnologias avançadas podem aprimorar a eficiência do processo eleitoral, promover a inclusão e facilitar o acesso à informação. Por outro, a possibilidade de manipulação de informações e a criação de conteúdos falsos ameaçam a integridade das eleições e, por extensão, a própria democracia. A regulamentação deve, portanto, equilibrar a inovação tecnológica com salvaguardas robustas para proteger o voto, a opinião pública e o debate democrático.

No contexto da propaganda eleitoral, a IA tem o potencial de personalizar mensagens, otimizar estratégias de campanha e até mesmo identificar padrões de comportamento do eleitorado. No entanto, a mesma ferramenta que pode direcionar conteúdos relevantes e informativos também pode ser usada para disseminar desinformação e conteúdo polarizador. Portanto, a regulamentação deve prever mecanismos que assegurem a autenticidade e a transparência das informações veiculadas, protegendo o eleitorado de campanhas desleais ou manipuladoras.

Contudo, a complexidade e a rápida evolução da tecnologia impõem desafios significativos à formulação de políticas eficazes. A regulação deve ser suficientemente flexível para se adaptar à evolução tecnológica, mas robusta o suficiente para prevenir abusos e mitigar riscos, como a discriminação e a violação de direitos.

Enquanto o mundo observa e participa da corrida pela inovação em IA, o Brasil se encontra em um momento crítico para definir seu lugar nesse cenário. A adoção de uma legislação nacional de IA não é apenas uma medida preventiva contra os perigos potenciais; é também uma oportunidade para o país estabelecer padrões e liderar discussões sobre ética e governança da IA no cenário global. Investimentos em pesquisa e desenvolvimento, acompanhados de uma estratégia nacional bem articulada, podem posicionar o Brasil como um player de destaque na arena internacional de IA.

No entanto, é crucial que a regulação não sufoque a inovação. Deve-se buscar um equilíbrio entre controle e estímulo ao desenvolvimento de novas tecnologias, assegurando que a IA seja usada como uma força para o bem, promovendo o desenvolvimento socioeconômico e aprimorando os serviços públicos. A regulação da IA no Brasil representa, portanto, não apenas um desafio normativo, mas também uma oportunidade estratégica para o país moldar o futuro da tecnologia e seu impacto na sociedade.

Em conclusão, enquanto o Brasil navega na regulamentação da IA, particularmente em relação às eleições municipais, é fundamental que as políticas adotadas reforcem a integridade eleitoral e a confiança pública. Ao mesmo tempo, devem incentivar a inovação e a adoção de novas tecnologias. Com equilíbrio e visão, o Brasil pode não apenas proteger sua democracia, mas também se estabelecer como um líder no debate global sobre a governança ética e eficaz da inteligência artificial.

Thiago Ferrarezi

VIP Thiago Ferrarezi

Consultor em Políticas Públicas, Relgov e Gestão de Projetos | Advogado especialista em Direito Público (USP). Mestre em Administração Pública (FGV). Doutorando em Inteligência Artificial (PUC-SP).

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