O mandado de segurança como instrumento de defesa das prerrogativas do advogado
Um breve contexto histórico da defesa da Ordem dos Advogados do Brasil em prol das prerrogativas profissionais, a partir de sua criação em 18 de novembro de 1930 até o advento da Carta da República de 1988.
terça-feira, 21 de novembro de 2023
Atualizado em 17 de novembro de 2023 13:28
A pedra fundamental - e consequente alicerce institucional - da Ordem dos Advogados do Brasil deu-se em 18/11/1930, ano de sua fundação, em plena Era Vargas, por meio do decreto 19.408. Há de se dizer que 87 anos antes, especificamente no ano de 1843, houvera o exsurgimento do Instituto dos Advogados do Brasil, o qual desempenhou o papel precípuo de representatividade da categoria até a implementação efetiva da Ordem.
Na sua essência mais genuína, a Ordem dos Advogados do Brasil soergue-se no mesmo berço do Estado Novo, isto é, em um regime antidemocrático. Nesse sentido, tem-se, naquele momento histórico, uma advocacia marcada pela combatividade, porquanto forjada na defesa inafastável dos direitos e garantias universais do homem. Portanto, uma advocacia atenta e vigilante, acima de qualquer coisa.
É nesse contexto histórico, conturbado e, sobremaneira, exacerbado, no sentido político da palavra, inaugura-se uma nova era dentro da República Federativa do Brasil, à medida que pôs fim à República Velha. Nos idos de 1930, Getúlio Vargas depõe Washington Luís do poder. Nas palavras do escritor Lira Neto1, in verbis:
De 1930 a 1945, as intolerâncias, violências e perseguições do regime getulista deixariam marcas traumáticas na vida do país. Mas esse mesmo intervalo de tempo também serviria para arrancar o Brasil de uma condição essencialmente agrária, transformando-o em uma nação com aspirações urbanas e industriais, embora este não fosse o objetivo delineado pela revolução.
É nesse clima que se instala, precipuamente, os arautos da novel Ordem dos Advogados do Brasil. Forjada na supressão de um Estado efetivamente democrático no sentido estrito da palavra. Ao revés, a Ordem dos Advogados do Brasil empenhava esforços incomensuráveis e superlativos em prol dos direitos e garantias individuais.
Desse modo, conveniente o excerto do desembargador André Faria Pereira2, acerca do processo de instalação da OAB, in verbis: "Um verdadeiro milagre, dado o fenômeno paradoxal que se observava: ao mesmo tempo em que o governo concentrava os três poderes da República em suas mãos, entregava para órgãos da própria classe dos advogados a disciplina e a seleção de seus membros, uma aspiração que vinha desde o século XIX".
Na mesma trilha, nas palavras do advogado e historiador Alberto Venâncio Filho, Pereira3 revela, in verbis:
Levei o projeto [que viria a se tornar o decreto 19.408/30 a Osvaldo Aranha, que lhe fez uma única restrição, exatamente no artigo 17, que criava a Ordem dos Advogados, dizendo não dever a Revolução conceder privilégios, ao que ponderei que a instituição da Ordem traria ao contrário, restrição aos direitos dos advogados e que, se privilégio houvesse, seria o da dignidade e da cultura". A argumentação sustentada por Pereira foi convincente e o art. 17 foi mantido no decreto, acabando por criar a OAB.
Neste retígrado, após o transcurso da Era Vargas, período compreendido entre 1930/1945, e, após, mediante voto da população de 1950/1954, passado um hiato de quase 10 anos, em 31 de março de 1964 sobrevém o famigerado golpe militar. Tal período é o berço de um novo regime constitucional, marcado por patente supressão dos direitos universais do homem.
Além do mais, o advento do ato institucional n. 5, de 13 de dezembro de 1968, emanado pelo Governo do General Costa e Silva, suprimiu dos cidadãos os seguintes direitos, in verbis:
Art. 5º - A suspensão dos direitos políticos, com base neste Ato, importa, simultaneamente, em:
- cessação de privilégio de foro por prerrogativa de função;
- suspensão do direito de votar e de ser votado nas eleições sindicais;
- proibição de atividades ou manifestação sobre assunto de natureza política;
- aplicação, quando necessária, das seguintes medidas de segurança:
- liberdade vigiada;
- proibição de freqüentar determinados lugares;
- domicílio determinado,
Art. 10 - Fica suspensa a garantia de habeas corpus, nos casos de crimes políticos, contra a segurança nacional, a ordem econômica e social e a economia popular.
Art. 11 - Excluem-se de qualquer apreciação judicial todos os atos praticados de acordo com este Ato institucional e seus Atos Complementares, bem como os respectivos efeitos.
- Confira aqui a íntegra do artigo.
1 Neto, Lira - Getúlio: dos anos de formação à conquista do poder (1882-1930) - 1. ed - São Paulo: Companhia das Letras, 2012, pág. 523.
2 Disponível em: https://www.migalhas.com.br/quentes/203009/criacao-da-oab-por-getulio-vargas-foi--verdadeiro-milagre
3 Disponível em: https://www.migalhas.com.br/quentes/203009/criacao-da-oab-por-getulio-vargas-foi--verdadeiro-milagre
Luís Octávio Outeiral Velho
Formado pela Faculdade de Direito de Santa Maria (FADISMA), advogado inscrito na OAB/SC n. 53.254-B e coordenador do núcleo criminal do escritório Silva e Silva Advogados Associados.