A hibridização constitucional na América Latina
Independente da forma de preservar ou unir culturalmente, faz-se necessária difusão do ideal integralizador, sem a hibridização hierárquica da época da colonização. Isto é, deve-se utilizar do constitucionalismo raiz para minimizar os prejuízos que ocorreram com os povos autóctones, cujos valores foram substituídos pelo modelo europeu.
sexta-feira, 27 de outubro de 2023
Atualizado às 10:19
Com o início da colonização latino-americana, instaurou-se a desterritorialização de culturas nativas, que, até então, permaneciam sem interferências dos ideais e costumes europeus. Nessa perspectiva, abriu-se espaço para questionamentos a respeito da nocividade de imposição cultural, social e religiosa em relação aos povos originários. Destarte, questionou-se sobre a necessidade de preservação da cultura imaterial dos povos nativos, combatendo a hierarquização horizontal dos povos dominadores. Nesse contexto, pode-se citar como um símbolo de insurreição à dominação colonial espanhola na América Latina a publicação da Carta da Jamaica, em 1815, por Simón Bolívar. Ou seja, já havia o desejo explícito de se formar uma confederação hispânico-americana, uma vez que se contrapunham à imposição axiológica europeia.
Segundo o antropólogo Nestor Canclini, "Reivindicar a heterogeneidade e a possibilidade de múltiplas hibridações é um primeiro movimento político para que o mundo não fique preso sob a lógica homogeneizadora com que o capital financeiro tende a emparelhar os mercados, a fim de facilitar os lucros ".(Canclini, 2008, p. 38).Nesse diapasão, há divergências no tocante a função da hibridização cultural, pois esta pode especializar em demasia ou teria o condão integrar uma multiplicidade de quesitos culturais. Nessa toada, apesar das controvérsias sobre a temática, há um consenso no objetivo maior de proteção de culturas em relação a América Latina e sua forma de colonização impositiva.
Nesse contexto de interculturalização, constatou-se que estava ocorrendo uma hibridização maléfica, uma vez que se invadia o núcleo central de manifestação cultural, falseada de objetivos integrativos. Em outras palavras, iniciou-se um processo de miscigenação de valores com predomínio de ideias europeus, estabelecendo-se a hegemonia cultural da classe dominante. Nesse viés, cada vez que se especializava um determinado tipo cultural, havia uma verdadeira simulação integrativa para encobrir a fragmentariedade axiológica idealizada pelos colonizados. Consequentemente, muitas autoridades se enredaram a construir o conceito das cláusulas latino-americanas, tentando implementar em 12 países um nível de abertura ao compartilhamento cultural, por meio da construção de uma Constituição cooperativa.
Outrossim, para muitos juristas, a Lei Maior de cada país seria a representação da maior ou menor abertura a universalização de valores culturais, sociais, econômicos e até religiosos. Destarte, as Constituições do Brasil, Colômbia e do Peru têm, em seu preâmbulo, a descrição da possibilidade de positivação de princípios internacionais. Todavia, existem as Constituições de abertura intermediária, como a da Argentina, da Colômbia, do Paraguai e do Uruguai que somente permitem, em abstrato, a cooperação e integração internacional.
Finalmente, deve-se argumentar sobre os Estados plurinacionais, cuja Carta Magna menciona, preambularmente, a integração latino-americana, a diversidade cultural, criando um eixo estratégico constitucional. Assim, os países que se enquadram nessa descrição são a Bolívia e o Equador, sendo um exemplo de dialeticidade cultural com fomento à comunicação, ao mercado comum da América latina.
Desse modo, independente da forma de preservar ou unir culturalmente, faz-se necessária difusão do ideal integralizador, sem a hibridização hierárquica da época da colonização. Isto é, deve-se utilizar do constitucionalismo raiz para minimizar os prejuízos que ocorreram com os povos autóctones, cujos valores foram substituídos pelo modelo europeu. Destarte, para muitos juristas, quanto maior a abertura constitucional, maior a valorização à diversidade cultura, religiosa e econômica de um país.
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Alves de Souza, A. M. Cultura, no Mercosul: uma política do discurso. Brasília: Plano Editora, 2004.
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