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Colusão futura como teoria do dano concorrencial em integrações verticais e conglomerais: o que analisar?

Como se trata de uma análise voltada para relações verticais e conglomerais, os estudos concentram-se no potencial lesivo à concorrência a jusante (ou seja, no elo seguinte da cadeia produtiva) e na cadeia à montante (ou seja, no elo anterior da cadeia produtiva).

segunda-feira, 9 de outubro de 2023

Atualizado às 07:41

Conforme mencionado nos sete artigos anteriores,1 que trataram do conceito de integrações verticais e conglomerais, do seu fluxo de análise pelo CADE e das principais teorias do dano, passamos agora para o aprofundamento sobre as preocupações relacionadas aos efeitos coordenados/riscos de colusão.

A versão preliminar do chamado "Guia V+" do CADE consolida as melhores práticas e procedimentos usualmente adotados pela autarquia na análise de efeitos não horizontais em atos de concentração.2 Como se trata de uma análise voltada para relações verticais e conglomerais, os estudos concentram-se no potencial lesivo à concorrência a jusante (ou seja, no elo seguinte da cadeia produtiva) e na cadeia à montante (ou seja, no elo anterior da cadeia produtiva).

Diferentemente do que vínhamos apresentando até aqui, sobre teorias do dano de efeitos não coordenados/unilaterais3, passa-se a descrever as preocupações concorrenciais resultantes de possíveis efeitos coordenados. Isso porque as integrações verticais podem elevar a probabilidade de coordenação explícita ou tácita entre concorrentes, ou intensificar ou facilitar a coordenação de estratégias que já existiam no mercado antes da operação. Como ações coordenadas entre concorrentes podem afetar negativamente o bem-estar dos consumidores, a autoridade antitruste avalia eventuais riscos de coordenação decorrentes da operação.

De acordo com o Guia de concentrações não-horizontais da União Europeia4, pode haver um aumento do grau de simetria entre as empresas atuantes no mercado, a partir de uma operação vertical.

Além de verificar as atuais características do mercado antes da operação, o Guia V+ sinaliza que se deve analisar se e como a operação afetará as condições de mercado, tornando eventual colusão mais propensa a ocorrer. Argumenta-se que integrações verticais podem favorecer a colusão, uma vez que (i) aumentam a possibilidade de mecanismos de dissuasão por parte da empresa integrada; e (ii) reduzem a possibilidade de reação de empresas que não participam da coordenação e não são integradas, dentre outros fatores.

Ianelli5 identificou, em sua pesquisa empírica envolvendo atos de concentração verticais julgados pelo Tribunal do Cade entre 2014 e 2018, que o Tribunal tende a ser mais relutante em declarar preocupações de efeitos coordenados quando comparado com efeitos unilaterais. Isso porque a possibilidade de comprovação de que a operação seria capaz de facilitar ou incentivar um conluio entre concorrentes seria muito baixa. Essa análise dependeria das condições do mercado, das empresas envolvidas, da conduta praticada, ou seja, de fatores específicos ao caso concreto e à situação mercadológica do momento.

No ato de concentração JBJ/Mataboi, por exemplo, uma preocupação concorrencial poderia ser levantada pela existência de vínculos familiares. A relação de parentesco motivou o Tribunal do Cade a reprovar a operação pois, um aumento do poder de mercado da empresa poderia influenciar significativamente o poder de mercado da outra empresa, de forma a diminuir a concorrência no mercado. Essa diminuição ocorreria devido à possibilidade de troca de informações concorrencialmente sensíveis entre empresas com considerável atuação no mercado. As empresas teriam informações que ampliariam a possibilidade de controlar a oferta e os preços de forma que os consumidores sairiam prejudicados.6

Outro caso que trouxe a preocupação de coordenação em sede de um ato de concentração vertical foi na operação conhecida como "AC das editoras".7 O Conselheiro Relator do caso, em sua análise, apontou a possibilidade de ocorrência de uma coordenação, mas concluiu no sentido de que não havia encontrado indícios suficientes para comprovar a probabilidade do acontecimento.

A mesma lógica apresentada sobre a lente das integrações verticais segue quanto às integrações conglomerais.

Em resumo, pode-se apresentar o seguinte quadro consolidado com os principais elementos de análise quando do aprofundamento da teoria do dano de efeitos coordenados:

 (Imagem: Divulgação)

(Imagem: Divulgação)

No próximo e último artigo, apresentaremos algumas conclusões sobre as teorias do dano em integrações verticais e conglomerais e o contexto atual mais amplo dessas preocupações concorrenciais.

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1 Link: https://www.migalhas.com.br/autor/amanda-athayde

2  Contribuições podem ser apresentadas na plataforma Participa+ Brasil. Acesso em: https://www.gov.br/participamaisbrasil/guia-v

3 Dentre os (1) efeitos não coordenados/unilaterais estão aqueles que podem ser decorrentes da atuação de uma única empresa, individual e unilateralmente. Seria o caso de analisar se a empresa resultante da operação, com posição dominante, poderia implementar determinadas práticas comerciais que teriam o efeito de prejudicar o mercado. Recorda-se, como exemplo de práticas unilaterais, a exigência de exclusividade, a recusa de contratar, a discriminação, a criação de dificuldades à atividade de concorrentes, dentre outros.

4 Guia da Comissão Europeia para Concentrações Não Horizontais. Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:52008XC1018(03)

5 IANELLI, Vivian Salomão. Análise empírica dos atos de concentrações verticais: como o CADE tem endereçado os efeitos unilaterais e coordenados em seus julgados? 2019. 74 f., il. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Direito). Universidade de Brasília, Brasília, 2019. p. 48.

6 Ato de Concentração JBJ/Mataboi. 08700.007553/2016-83.

7 Ato de Concentração Editora Objetiva Ltda. ("Objetiva"); Editora Arqueiro Ltda. ("Arqueiro"); Distribuidora Record de Serviços de Imprensa S.A. ("Record"); Editora Planeta do Brasil Ltda. ("Planeta"); Editora Rocco Ltda. ("Rocco") e ublibook Livros e Papéis S.A. ("LP&M") - e a DLD Distribuidora de Livros Digitais S.A. ("DLD"). 08700.004872/2013-94.

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*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

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Amanda Athayde

Amanda Athayde

Professora doutora adjunta na UnB de Direito Empresarial, Concorrência, Comércio Internacional e Compliance, consultora no Pinheiro Neto. Doutora em Direito Comercial pela USP, bacharel em Direito pela UFMG e em administração de empresas com habilitação em comércio exterior pela UNA, ex-aluna da Université Paris I - Panthéon Sorbonne, autora de livros, organizadora de livros, autora de diversos artigos acadêmicos e de capítulos de livros na área de Direito Empresarial, Direito da Concorrência, comércio internacional, compliance, acordos de leniência, anticorrupção, defesa comercial e interesse público.

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