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Se passou o prazo de garantia do veículo é possível obter reparação?

Problemas no trocador de calor geram despesas significativas e ameaçam integridade do câmbio de veículos, preocupando consumidores. No presente artigo serão abordadas a responsabilidade jurídica das montadoras e outras questões relevantes.

segunda-feira, 11 de setembro de 2023

Atualizado às 14:15

No cenário contemporâneo, caracterizado por avanços tecnológicos na indústria automotiva, os consumidores têm expectativas cada vez mais elevadas quanto à qualidade e durabilidade de veículos. Entretanto, mesmo em meio a essa evolução, vícios e falhas podem emergir, levantando questões sobre a responsabilidade das fabricantes diante dos problemas enfrentados pelos proprietários.

Um exemplo recente que ilustra essa problemática envolve modelos da Fiat e Jeep, que compartilham um problema no câmbio automático. Esse contexto suscita um debate sobre os deveres das fabricantes em relação aos consumidores e a possibilidade de reparação integral do valor empregado na aquisição do bem, inclusive em casos que envolvem danos morais.

O problema em questão está relacionado ao câmbio automático AT6 (Aisin TF72-SC), presente em diversos modelos da Fiat e Jeep, como o Jeep Renegade. Esse vício se manifesta através da falha no trocador de calor, permitindo que o fluido de arrefecimento do motor contamine a transmissão. Isso resulta em danos significativos e prejuízos financeiros para os proprietários. O impacto desse caso ultrapassa os veículos individualmente afetados, uma vez que outros modelos da mesma fabricante também utilizam essa tecnologia.

O que o consumidor pode fazer em caso de problema mecânico no trocador de calor ou no câmbio do veículo? A fabricante possui responsabilidade nesse caso?

As fabricantes de veículos têm a obrigação ética e legal de fornecer produtos seguros, confiáveis e em conformidade com as expectativas razoáveis dos consumidores. Isso engloba a garantia de que componentes essenciais, como o câmbio, sejam projetados e fabricados adequadamente para evitar defeitos e vícios que possam comprometer a segurança e o desempenho do veículo. Quando falhas ocorrem, a responsabilidade da fabricante em assumir as consequências é um tema complexo, mas de suma importância.

Nesse contexto, o Ministério Público de Minas Gerais e o Procon-MG estão investigando o caso dos modelos Fiat e Jeep afetados pelo problema no câmbio, desempenhando um papel crucial na proteção dos direitos dos consumidores. A coleta de informações e a investigação minuciosa podem resultar em ações corretivas, como recalls ou reparos gratuitos.

A resposta da Stellantis, grupo responsável pelas marcas Fiat e Jeep, ecoa uma postura comum adotada por várias fabricantes ao enfrentarem problemas semelhantes. Ao afirmar que seus produtos são de alta qualidade e que não há vícios de produto ou falhas de projeto, as fabricantes tentam resguardar sua reputação. No entanto, essa abordagem muitas vezes entra em conflito com as experiências reais dos consumidores, abrindo espaço para insatisfação e busca por soluções legais.

Recentemente, um proprietário de um Jeep Compass 19/19, residente em Niquelândia, GO, compartilhou um relato preocupante sobre um problema em seu veículo. No dia 21 de fevereiro de 2022, ao estacionar na garagem de sua residência, ele notou um estranho barulho e evidências de vazamento de óleo. Surpreendentemente, nenhum alerta foi exibido no painel para indicar qualquer problema. Esse incidente levou à necessidade de rebocar o veículo para uma concessionária para análise. O diagnóstico revelou a necessidade de substituir o câmbio automático, com um custo alarmante de R$ 52.787,41. Para complicar ainda mais a situação, a garantia do veículo havia expirado recentemente, menos de 30 dias antes do ocorrido.

Vale destacar que esse é apenas um de milhares de reclamações feitas por consumidores no site Reclame Aqui. Desse modo, a postura das montadoras acima relatada pode ser justificada, sob um ponto de vista econômico, visto que reconhecer a falha no produto, certamente as levariam a um prejuízo milionário.

Uma reportagem recente, intitulada "Autodefesa: falha no câmbio pode custar R$ 20.000 a donos de Renegade", publicada em maio de 2020 pela revista Quatro Rodas, ressalta um problema crítico no câmbio do Jeep Renegade que pode resultar em um ônus significativo para os proprietários afetados.

O artigo aborda a ocorrência de uma falha no câmbio do Jeep Renegade, uma questão que pode impactar a funcionalidade e a segurança dos veículos. Especificamente, é destacado que os custos envolvidos na correção desse problema podem alcançar valores consideráveis, chegando a até R$ 20.000. Tal cenário não apenas coloca os proprietários em uma posição financeira delicada, mas também levanta questões sobre a responsabilidade das fabricantes em relação a vícios que podem resultar em despesas substanciais para os consumidores.

O relato de um caso específico, no qual um proprietário conseguiu realizar o conserto do câmbio afetado, serve como um exemplo real das complexidades envolvidas nesse tipo de situação. A experiência desse proprietário evidencia não apenas os desafios enfrentados por aqueles que se deparam com problemas mecânicos em seus veículos, mas também destaca a necessidade de soluções eficazes e acessíveis para os consumidores afetados.

A reportagem da Quatro Rodas fornece um ponto de partida para a análise mais ampla da responsabilidade das fabricantes no que diz respeito aos vícios em veículos. A discussão sobre quem deve arcar com os custos decorrentes de tais problemas é crucial para proteger os direitos e interesses dos consumidores. Além disso, evidencia a relevância de políticas de garantia robustas e sistemas de suporte ao cliente que possam lidar eficazmente com situações de vício e falhas.

Portanto, o caso do Jeep Renegade ilustra a importância de uma abordagem mais holística para a análise de problemas em veículos. A discussão sobre custos de reparo não deve ser isolada; em vez disso, deve ser contextualizada em um debate mais amplo sobre os deveres das fabricantes, as expectativas dos consumidores e a necessidade de sistemas que garantam produtos automotivos confiáveis e seguros. É imperativo que os órgãos reguladores, a indústria automobilística e os defensores dos direitos do consumidor colaborem para encontrar soluções justas e equitativas que protejam tanto os interesses das fabricantes quanto os dos consumidores.

Expectativa de durabilidade desses bens de alto valor

Além da responsabilidade das fabricantes em relação aos problemas nos veículos, é imprescindível considerar a expectativa de durabilidade desses bens de alto valor. Ao adquirir um veículo, os consumidores esperam que ele seja duradouro e isento de vícios significativos que possam comprometer seu funcionamento e valor ao longo do tempo. A durabilidade e a confiabilidade são fatores cruciais na decisão de compra, e as fabricantes têm o dever ético e legal de cumprir essas expectativas.

A situação também é agrava devido a ausência de indicação para troca revisional nos manuais dos veículos.

Caso tenha se passado o prazo de garantia do veículo, ainda será possível obter reparação?

No âmbito da jurisprudência brasileira, um relevante precedente estabelecido pela Terceira Turma do STJ resp 1.787.287 traz à tona uma abordagem fundamental no que tange à responsabilidade do fornecedor em casos de defeitos ocultos em produtos, mesmo após o término do período de garantia contratual. Nessa decisão, ficou claramente estabelecido que a obrigação do fornecedor se mantém quando os defeitos emergem dentro do prazo de vida útil do produto, desde que não haja comprovação de uso inadequado por parte do consumidor.

Este entendimento reforça a ideia de que o compromisso do fornecedor em lidar com defeitos ocultos que se manifestam após o término da garantia contratual é uma extensão natural do seu papel. A decisão ressalta que, em determinados contextos, a responsabilidade civil do fornecedor pode persistir mesmo quando a garantia já expirou, desde que o defeito em questão surja durante o período estimado de vida útil do produto.

Para ilustrar essa postura, os ministros do STJ reformularam uma sentença do TJ/SP e restabeleceram uma decisão que ordenava ao fornecedor a obrigação de reparar ou substituir dois eletrodomésticos defeituosos pertencentes a uma consumidora. Adicionalmente, o fornecedor foi condenado a indenizar a consumidora em R$ 5 mil por danos morais.

A base desse veredicto reside na rejeição da alegação de uso inadequado do produto pelo consumidor como fundamento para isentar o fornecedor de responsabilidade. O relator da ação, ministro Villas Bôas Cueva, esclareceu que a matéria em questão já havia sido examinada anteriormente pela Quarta Turma, em 2012, em um julgamento que estabeleceu premissas relevantes.

Uma delas é que o ônus de comprovar a natureza do vício recai sobre o fornecedor, visto que qualquer falta de evidência nesse sentido tende a favorecer o consumidor. Além disso, foi estabelecido que o prazo de decadência para alegar defeitos que surgem com o uso difere do prazo de garantia pela qualidade do produto, que pode ser convencional ou legal.

Villas Bôas Cueva sublinhou que o CDC não fixa um prazo legal para que o fornecedor seja responsabilizado por vícios do produto após o término da garantia. No entanto, a partir desta decisão, é evidente que a responsabilidade do fornecedor persiste durante a vida útil do produto, desde que o defeito surja nesse período.

O critério adotado nesse caso se baseia no parágrafo 3º do artigo 26 do CDC, que estipula o critério da vida útil do produto em relação a defeitos ocultos, em vez do critério da garantia. Portanto, essa abordagem permite que o fornecedor seja responsabilizado por defeitos mesmo após o término da garantia, desde que tais defeitos ocorram dentro do período estimado de vida útil do produto.

A avaliação feita pelo ministro Villas Bôas Cueva ressaltou que a sentença original havia considerado uma vida útil de nove anos para os produtos defeituosos, baseando-se em um documento apresentado pela consumidora. O relator salientou que, uma vez que o fornecedor não contestou essa informação, o TJ/SP não poderia descartá-la.

Em síntese, essa decisão estabelece um precedente sólido para a responsabilidade do fornecedor em relação a defeitos ocultos em produtos após o término da garantia. Ela realça a importância de considerar a vida útil dos produtos ao avaliar responsabilidades e destaca a necessidade de que os fornecedores cumpram sua obrigação mesmo após o término da garantia contratual. Isso também reforça a relevância do papel do fornecedor em prover produtos duradouros e de qualidade, em conformidade com as expectativas razoáveis dos consumidores.

Conclusões

Em muitos casos, quando um vício sério é identificado, os consumidores têm o direito de buscar reparação integral do valor desembolsado na aquisição do veículo defeituoso. Isso pode incluir não apenas o reembolso do valor pago pelo veículo, mas também eventuais despesas relacionadas a reparos, manutenção e perda de valor de revenda.

Além disso, em situações pontuais em que os vícios causam transtornos significativos e frustrações emocionais, os consumidores podem buscar reparação por danos morais, como forma de compensação pelo sofrimento e inconveniência enfrentados.

Nesse contexto, é crucial que os consumidores estejam cientes dos seus direitos e busquem aconselhamento legal adequado quando confrontados com problemas sérios nos veículos que adquiriram. A colaboração com órgãos de defesa do consumidor e a consulta a profissionais jurídicos especializados podem ajudar a determinar a melhor abordagem para alcançar uma resolução justa e satisfatória. Em última análise, a responsabilidade das fabricantes vai além do simples fornecimento de produtos, incluindo a garantia de que seus veículos atendam às expectativas de durabilidade, segurança e confiabilidade que os consumidores têm ao fazer um investimento tão significativo.

A transparência, o diálogo aberto e a busca por soluções justas são essenciais para manter a confiança dos consumidores. 

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1 "Autodefesa: falha no câmbio pode custar R$ 20.000 a donos de Renegade." Quatro Rodas. Disponível em: https://quatrorodas.abril.com.br/auto-servico/autodefesa-falha-no-cambio-pode-custar-r-20-000-a-donos-de-renegade/

2 "Procon-MG apura vícios relacionados ao Jeep Renegade e convoca proprietários a prestar informações ao órgão." Ministério Público de Minas Gerais. Disponível em: https://www.mpmg.mp.br/portal/menu/comunicacao/noticias/procon-mg-apura-vicios-relacionados-ao-jeep-renegade-e-convoca-proprietarios-a-prestar-informacoes-ao-orgao.shtml#:~:text=O%20Minist%C3%A9rio%20P%C3%BAblico%20de%20Minas,solicita%20aos%20propriet%C3%A1rios%20que%20repassem

3 "Fornecedor pode ser responsabilizado por defeito oculto apresentado em produto fora do prazo de garantia." Superior Tribunal de Justiça (STJ). Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/11042022-Fornecedor-pode-ser-responsabilizado-por-defeito-oculto-apresentado-em-produto-fora-do-prazo-de-garantia.aspx

4 "Problema Câmbio Automático Jeep Compass: Vício Oculto." Reclame Aqui. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/jeep/problema-cambio-automatico-jeep-compass-vicio-oculto_Fc-3e-BdQ4vaIHhQ/

5 "Problema de câmbio no Jeep Renegade 1.8 2016." Reclame Aqui. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/jeep/problema-de-cambio-no-jeep-renegade-1-8-2016_CyQdARnUG-l0XtM2/

6 "Nunca comprem Jeep!" Reclame Aqui. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/jeep/nunca-comprem-jeep_dB7KwN54Gl3KEc3l/

7 "Problema Crônico - Vício em Jeep Renegade junto à negligência de concessionária." Reclame Aqui. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/jeep/problema-cronico-vicio-em-jeep-renegade-junto-a-negligencia-de-conceciona_NgKX8Js9OQNsL6YL/

8 "Problema crônico de fábrica no câmbio automático do Renegade Diesel Longitude." Reclame Aqui. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/jeep/problema-cronico-de-fabrica-no-cambio-automatico-do-renegade-diesel-longitu_sCU5o7I5aO58jLp7/

9 "Jeep Renegade com vazamento de água (radiador para o câmbio) e óleo do câmbio." Reclame Aqui. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/jeep/jeep-renegade-com-vazamento-de-agua-radiador-para-o-cambio-e-oleo-do-cambi_vNyNeic1NFl3zHk5/

10 "Problema no câmbio automático do Renegade Sport." Reclame Aqui. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/jeep/problema-no-cambio-automatico-do-renegade-sport_13939680/

11 "Vergonha! Renegade com trocador de calor defeituoso que afeta o câmbio." Reclame Aqui. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/jeep/vergonha-renegade-com-trocador-de-calor-defeituoso-que-afeta-o-cambio_UIPgFxOtINjsvkuA/

12 "Jeep Renegade - Trocador de calor/câmbio quebrou - Custa 20 mil o conserto." Reclame Aqui. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/jeep/jeep-renegade-trocador-de-calor-cambio-quebrou-custa-20-mil-o-conserto__RNZA7it8HaLeUaj/

13 "Defeito oculto de fabricação no trocador de calor - Montadora se nega a cobrir." Reclame Aqui. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/jeep/defeito-oculto-de-fabricacao-no-trocador-de-calor-montadora-se-nega-a-cob_NsxmHKI7XoS1bQB8/

14 "Problema de câmbio - Jeep Compass 2017 - Conserto custa mais de 1/3 do valor do carro." Reclame Aqui. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/jeep/problema-cambio-jeep-compass-2017-concerto-custa-mais-de-1-3-valor-carro_Oh_lYizYTrBRXYuJ/

15 "Jeep nunca mais! Marca não importa com o consumidor e vende produtos defeituosos." Reclame Aqui. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/jeep/jeep-nunca-mais-marca-nao-importa-com-o-consumidor-e-vende-produtos-defeit_1YYUDK9QgTA2dpTi/

16 "Jeep Renegade." Reclame Aqui. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/jeep/jeep-renegade_8g1fyfhYJkxPr1Bj/

17 "Câmbio quebrou." Reclame Aqui. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/jeep/cambio-quebrou_zUmz2AaBQWZvebs-/

18 "Jeep Renegade - Câmbio automático flex versão 2016." Reclame Aqui. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/jeep/jeep-renegade-cambio-automatico-flex-versao-2016_m0SrrKVJKZuKGoyD/

David Vinicius do Nascimento Maranhão Peixoto

David Vinicius do Nascimento Maranhão Peixoto

Especialista em Ciências Criminais e Fraudes Bancárias. Advogado Sócio do Escritório Nascimento & Peixoto Advogados Associados.

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