Precisamos falar sobre a prisão preventiva
Não se nega a necessidade da prisão em sua forma preventiva, a qual pode e deve ser decretada pelo Juiz competente quando se mostrar indispensável para a garantia de determinados direitos que possam vir a ser maculados caso o sujeito seja mantido em liberdade.
quarta-feira, 23 de agosto de 2023
Atualizado às 14:15
Diversos acontecimentos recentes escancaram episódios de corrupção e manipulação da máquina pública, sobretudo com o uso do poder político manejado para a satisfação de interesses particulares de determinados grupos que, em busca da liderança, estabelecem verdadeiras guerras eleitorais.
Também não é de se olvidar que o sistema jurídico estabelecido pela Constituição da República e regulado pelo nosso Código Penal e Processual Penal, além das legislações esparsas, constituem-se em importantes instrumentos de limitação do poder para, dentro das normas existentes, punir a prática daqueles que excedem as "regras do jogo", causando danos aos demais jogadores ou até mesmo a terceiros.
Sob este viés, é necessário discutir a ferramenta de maior repressão colocada à disposição do Estado-Julgador para coibir a prática de condutas criminosas: a prisão preventiva, a qual uma vez mais ganha destaque diante do episódio protagonizado por um Ex-Diretor da Polícia Rodoviária Federal preso por suposta interversão nas eleições presidenciais de 2022.
Neste contexto, não se nega a necessidade da prisão em sua forma preventiva, a qual pode e deve ser decretada pelo Juiz competente quando se mostrar indispensável para a garantia de determinados direitos que possam vir a ser maculados caso o sujeito seja mantido em liberdade.
Ademais, extrai-se daí o primeiro elemento característico da prisão preventiva, o da garantia dos direitos dos demais integrantes da sociedade, mesmo que através da restrição da liberdade da pessoa detida preventivamente.
Quer-se dizer: a prisão preventiva busca, conforme preceitua o Art.312/CPP, a garantia da ordem pública, da instrução criminal e da aplicação da lei penal, cabível, portanto, sempre que a liberdade do agente ameaçar tais postulados e, por óbvio, haver prova da existência do crime e indícios suficientes acerca de sua autoria.
Logo, a lei autoriza que alguém possa ter sua liberdade restringida preventivamente nos casos em que, solto, ameace a estabilidade (ordem) pública, consubstanciada na paz social, segurança e aplicação da lei penal.
Todavia, além do preenchimento de todos os requisitos mencionados, os quais são expressamente previstos na norma regulamentadora do instituto, também é indispensável que exista algum elemento atual que aponte para o risco de que, no momento da prisão, o agente possa afrontar algum dos postulados já comentados.
Desta forma, o instituto tem a sua razão de ser esvaziada após o decorrer de um lapso temporal considerável desde o cometimento do delito até o momento de sua decretação, razão pela qual a custódia cautelar não pode ser determinada hoje em razão de um fato cometido a muito tempo atrás, que não produz mais nenhum efeito negativo no presente, dai extraindo-se o chamado princípio da contemporaneidade, segundo o qual os fundamentos que motivam a prisão devem ser contemporâneos, ou seja, atuais.
A despeito de serem claros os referenciais normativos que norteiam a utilização da prisão preventiva, tem se tornado cada vez mais comum à sua determinação em face de sujeitos sobre os quais não há qualquer temor social e nem tão pouco risco à aplicação da lei penal, fatores estes quase sempre ignorados, sobretudo quando o delito discutido se insere em um contexto de disputa política, estatuindo um verdadeiro uso da lei para fazer guerra.
Leonardo Tajaribe Jr.
Advogado Criminalista. Especialista em Direito Penal Econômico (COIMBRA/IBCCRIM). Pós-Graduado em Direito Penal e Processual Penal (UCAM). E-mail: [email protected]