Razões que não podem levar um candidato à eliminação de um concurso: entenda quais são e o que fazer
Concurseiro, se você está com medo de algumas dessas questões polêmicas, pode se acalmar: a jurisprudência está a seu favor.
sábado, 19 de agosto de 2023
Atualizado em 18 de agosto de 2023 15:39
No mundo dos concursos públicos existem uma porção de questões polêmicas, que toda vez que vem à tona, deixam os concurseiros à beira da loucura. São muitas dúvidas e muita desinformação, sem contar as "fake news".
Caros concurseiros, seus problemas acabaram. Neste artigo, fizemos uma seleção dos temas que mais geram polêmica: tatuagem, doença transitória, inadimplência, responder a inquérito policial e formação superior ao exigido pelo edital. Todas essas questões trazem muitas incertezas aos candidatos, mas saiba: elas não podem eliminar o candidato, salvo em raras exceções.
Para entender detalhadamente, acompanhe o artigo:
1. Tatuagem
Exceto se o conteúdo da tatuagem ferir algum princípio constitucional (como a tatuagem de um símbolo nazista, por exemplo), ela não pode ser fator eliminatório em concurso público.
A tatuagem é uma característica cada vez mais comum na nova sociedade e é vista, inclusive, como forma de manifestar a arte e gostos pessoais de cada indivíduo. Ser eliminado de concurso público pelo simples fato de possuir tatuagem fere o princípio da razoabilidade. Além disso, o fato de ter tatuagem em nada atrapalha o desempenho das atribuições relativas ao caso.
Em 2016, o STF decidiu sobre o tema: "Editais de concurso público não podem estabelecer restrição a pessoas com tatuagem, salvo situações excepcionais, em razão de conteúdo que viole valores constitucionais".
2. Doença transitória
O objetivo da etapa de exame médico é avaliar se o candidato tem condições físicas para exercer as atribuições do cargo a que concorre.
As doenças transitórias são aquelas doenças controláveis, não permanentes, que podem ser facilmente revertidas. Elas não são incapacitantes e, portanto, não dificultam a execução das atribuições relativas ao cargo. Logo, não há razões para a eliminação do candidato.
Alguns exemplos de doenças transitórias são: colesterol e triglicérides altos, elevação da pressão arterial, sobrepeso e etc. Essas condições, ainda que previstas em edital, não podem eliminar o candidato do concurso.
3. Inadimplência
Alguns concursos, como os de carreira policial, tem uma etapa chamada "investigação social". Nesta etapa, a vida do candidato é investigada a fundo e é necessário que ele apresente também algumas certidões, como de antecedentes criminais, por exemplo.
Durante essa etapa, muitos candidatos têm medo de serem reprovados por estarem inadimplentes - ter o nome em cadastro de inadimplentes como SPC e Serasa, ou seja, ter o "nome sujo".
Exceto no caso de concurso para bancários, o fato de estar inadimplente não constitui causa para eliminação de concurso público.
A lei Federal 8.112/90, que é a lei que versa sobre o serviço público federal e traz requisitos para tomar posse em cargo público, não menciona a inadimplência como um quesito que elimine o candidato.
Apesar disso, é recomendável, se possível, que o candidato tente negociar e regularizar a dívida para evitar possíveis desgastes.
4. Responder a inquérito policial
É importante que se tenha em mente que, no Brasil, ninguém deve ser considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Logo, um candidato ser punido com a eliminação por responder a um inquérito policial, fere o princípio da presunção da inocência.
Uma decisão do STF determinou que o edital ou administração pública pode estabelecer critérios mais rigorosos para alguns cargos, como é o caso de juízes e integrantes da segurança pública, por conta da natureza das atribuições. Contudo, o simples fato de responder a inquérito não é motivo suficiente para eliminação.
Confira a decisão do STF no RE 560.900:
"Sem previsão constitucional adequada e instituída por lei, não é legítima a cláusula de edital de concurso público que restrinja a participação de candidato pelo simples fato de responder a inquérito ou ação penal".
Um caso que gerou grande repercussão aconteceu em Minas Gerais: um candidato para o cargo de agente penitenciário foi reprovado na investigação social por responder a inquérito policial, por conta de estelionato.
O candidato recorreu judicialmente da decisão. A administração pública alegou que a conduta do candidato não era compatível com o cargo. O candidato, por outro lado, alegou ao STJ que o princípio da presunção de inocência foi ferido.
Em sua decisão, Gurgel de Farias, Ministro do STJ, afirmou:
"Ainda que absolutamente reprovável a conduta imputada ao recorrente, inexiste o cenário de exceção reservado pelo precedente do Supremo a situações completamente desfavoráveis ao candidato. Entender de modo contrário implica o risco de a exceção se tornar a regra, desvirtuando a razão do precedente e provocando insegurança jurídica".
5. Formação em nível superior ao exigido em edital
Eu sei, parece absurdo e não faz qualquer sentido, mas algumas bancas insistem em querer eliminar candidatos que apresentam um nível de escolaridade superior ao exigido para o cargo.
Explico: suponhamos que saia um edital para o cargo de técnico em contabilidade. Você acha razoável que a banca elimine um contador por possuir nível de escolaridade superior ao exigido para o cargo? É óbvio que não!
Assim também entende a jurisprudência:
"A jurisprudência do STJ entende que não se mostra razoável impedir o acesso ao serviço público de um candidato detentor de conhecimentos em nível mais elevado do que o exigido para o cargo em que fora devidamente aprovado mediante concurso" (AgRg no REsp 1375017/CE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, 2ªT, DJe 4/6/13).
Eliminar um candidato com nível de escolaridade maior que o exigido pelo cargo, sem dúvidas, fere o princípio da razoabilidade (exige coerência) e da proporcionalidade (quando as vantagens que promove superam as desvantagens que provoca).
Concurseiro, se você está com medo de algumas dessas questões polêmicas, pode se acalmar: a jurisprudência está a seu favor.
Candidato eliminado por qualquer dessas hipóteses, conheça os seus direitos e não abra mão deles. Procure um bom advogado, que irá te orientar e garantir que seus direitos não sejam violados.
Lindson Rafael Silva
Advogado, diretor do VIA Advocacia, especialista em concursos públicos, professor da Escola Superior de Advocacia.