Reabilitação criminal, vale a pena?
Uma breve apresentação do instituto penal, seu alcance, requisitos, utilidade em tempos atuais, na visão e experiência do autor.
quarta-feira, 9 de agosto de 2023
Atualizado às 13:57
Natureza, conceito e histórico
Benefício, instituto jurídico, direito de cidadania, favor legal e judicial, entre outros rótulos que recebeu ao longo do tempo, são muitas as classificações da reabilitação, ato judicial declaratório do cabal cumprimento da pena (e decurso de determinado prazo) pelo condenado, para que recupere seu status jurídico e moral anterior à sentença1, readquirindo prestígio junto à sociedade, cessando efeitos negativos da sanção penal, permanecendo como providência indispensável à sua reintegração, significando que nada mais deve à sociedade.
É instituto tradicional em nosso direito, existindo, com diferenças enormes ao que hoje conhecemos, desde a primeira constituição imperial (1824), embora tenha sido até confundida com a revisão penal, em determinada época (Código Penal 1890, art. 72, onde inaugurado o termo "rehabilitação"), assumindo a feição atual desde a reforma do Código Penal pela lei 7209/84, cuja exposição de motivos contém excelente definição, que transcrevemos:
A reabilitação não tem, apenas, o efeito de assegurar o sigilo dos registros sobre o processo e a condenação do reabilitado, mas consiste, também, em declaração judicial de que o condenado cumpriu a pena imposta ou esta foi extinta, e de que, durante dois anos após o cumprimento ou extinção da pena, teve bom comportamento e ressarciu o dano causado, ou não o fez porque não podia fazê-lo. Tal declaração judicial reabilita o condenado, significando que ele está em plenas condições de voltar ao convívio da sociedade, sem nenhuma restrição ao exercício de seus direitos
É de grande importância para os servidores públicos civis e militares, cumprindo distinguir os conceitos de atestado de antecedentes e folha de antecedentes: no primeiro, é uma lista informativa elaborada pelos órgãos de segurança (polícia), para saber se houve investigação sobre o cidadão, a qual será apagada quando reabilitado; a segunda, é a informação processual que os juízes recebem em toda ação penal, na qual constarão inquéritos findos, em andamento, todas as ações penais que dizem respeito àquela pessoa. A reabilitação não interfere na folha, servindo-a para informar Magistrados e MP sobre o passado daquele cidadão, mesmo reabilitado, sendo de acesso restrito.
Como existe uma tradição dos órgãos de segurança em resistir ao apagamento dos antecedentes, é salutar um trabalho complementar do advogado para deletá-los, utilizando conforme o caso mandado de segurança, habeas data ou requerimentos administrativos via Corregedoria da Distribuição.
De todo modo, a utilização desses mecanismos pelo cidadão em reintegração social sinaliza, para a sociedade em geral e órgãos judiciários em particular, que tem real interesse em possuir imagem sem qualquer mácula, e sua intenção de evitar qualquer outro envolvimento em prática ilícita.
Fundamentos legais: dos artigos 93 a 95 do Código Penal, e 743 a 750 do Código de Processo Penal, e os artigos 134 do Código Penal Militar, na forma dos arts. 651 a 658 do Código de Processo Penal Militar, respectivamente Decretos-lei 1001 e 1002/69.
Os requisitos para requerer reabilitação criminal são, grosso modo:
- decurso do prazo de dois anos2 depois do integral cumprimento da pena (ou sua extinção);
- residência no Brasil nesse prazo;
- bom comportamento, público e privado;
- Reparação do dano causado à vítima, ou impossibilidade de fazê-lo3
Pode ser revogada, em caso de reincidência, ou seja, apesar dos dados se tornarem sigilosos em caráter geral, continuarão acessíveis aos juízes e Ministério Público.
Reabilitação em tempos de superexposição informática e LGPD
O Judiciário brasileiro tem tomado medidas para manter a grande utilidade e alcance dessa ferramenta de política criminal, que tem como objetivo principal a reinserção social do condenado, ajudando-o a recomeçar e ter futuro.
No entanto, há muitos críticos sociais a respeito da pouca ou nenhuma assistência ao egresso do sistema punitivo para recolocação em mercado de trabalho, seu reaproveitamento, sua reeducação com cursos e outras medidas, seguindo as recomendações da ONU na matéria, deixando os condenados à própria sorte, sujeitos à reincidência.
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1 Miotto, Armida Bergamini, O instituto jurídico da reabilitação, 1981, Senado
2 Cinco anos, na reabilitação militar (CPPM, art. 651)
3 pode ocorrer a penúria do reabilitando, podendo declarar pobreza, Lei 7115/83), ou mesmo perdão da vítima, pagamento direto ou por consignação, entre várias hipóteses