Os reflexos do pacote anticrime nos crimes de estelionato e "estelionato judiciário"
Entendemos ser coerente a obrigatoriedade da representação da vítima para que seja oferecida a denúncia após apuração da justa causa, que é uma condição de procedibilidade, posto que em se tratando de um crime meramente patrimonial, nos parece acertada deixar ao alvedrio da vítima a representação/autorização, a qual possui o prazo decadencial de 6 (meses), caracterizando um incentivo para que o autor do crime de estelionato repare o dano material à vítima dentro do referido prazo, resolvendo o conflito com o fito da paz social e com a economia do aparato estatal, evitando-se o desdobramento de ações penais.
segunda-feira, 31 de julho de 2023
Atualizado às 11:01
1.Considerações iniciais;
A Lei 13.964/19, a qual contou com forte trabalho publicitário com viés político para que fosse denominada como pacote "anticrime", por vários aspectos foi e está sendo alvo de fundadas e severas críticas por grande parte do meio acadêmico, senão todos, bem como dos operadores do direito, sobretudo dos advogados atuantes na seara criminal, posto que desconsiderou dados científicos acerca da criminologia e deu azo ao punitivismo exacerbado com o temeroso argumento de se combater a violência através da persecução penal estatal mais rigorosa, e cujo resultado lógico aguardado será o aumento da população carcerária e, por óbvio, tornando ainda mais gravoso o já colapsado sistema prisional pátrio.
No que se refere ao crime de estelionato e "estelionato judiciário", a Lei 13.964/19 inseriu o §5º no art. 171 do Código Penal e, assim, apresentou avanços importantes a serem considerados, cabendo aos operadores do direito a busca de soluções acerca dos seus reflexos para a aplicação da nova norma processual penal material, portanto mista ou híbrida, em conjugação com o direito intertemporal, já que a ação penal para os crimes de estelionato passou a ser de ação penal pública incondicionada para ação penal pública condicionada à representação da vítima, via de regra, considerando as exceções quando são vítimas a Administração Pública, direta ou indireta, criança ou adolescente, pessoa com deficiência mental ou maior de 70 (setenta) anos de idade ou incapaz.
Causa estranheza, para alguns, a terminologia ora posta: "estelionato judiciário". Não obstante, necessário trazer à baila o tema, pois muito embora a doutrina e a jurisprudência sejam pacíficas acerca da atipicidade do denominado "estelionato judiciário", é de se considerar que temos notícias concretas de que advogados foram e ainda estão sendo processados, e até condenados, com penas altíssimas pelo referido "crime", o qual fora fomentado por alguns representantes do Ministério Público através de denúncias infundadas, porém, agasalhados pelo Poder Judiciário, o que caracteriza clara usurpação do Poder Legislativo. Dito isso, tamanho equívoco ao ser criado um tipo penal pela via inadequada, não cabendo ao presente estudo discutir suas motivações, destaque-se que se criou um desafio ainda maior para aplicação do § 5º no art. 171 do Código Penal inserido pela Lei 13.964/19, restando obrigatória a representação da vítima acerca do tipo penal inovado - "estelionato judiciário".
Entendemos ser coerente a obrigatoriedade da representação da vítima para que seja oferecida a denúncia após apuração da justa causa, que é uma condição de procedibilidade, posto que em se tratando de um crime meramente patrimonial, nos parece acertada deixar ao alvedrio da vítima a representação/autorização, a qual possui o prazo decadencial de 6 (meses), caracterizando um incentivo para que o autor do crime de estelionato repare o dano material à vítima dentro do referido prazo, resolvendo o conflito com o fito da paz social e com a economia do aparato estatal, evitando-se o desdobramento de ações penais.
2. A natureza jurídica da novatio legis que incluiu o § 5º no art. 171 do Código Penal.;
A partir da ocorrência de novos fatos enquadrados nos crimes do art. 171 do CP, a manifestação de vontade da vítima, representação, salvo as exceções, dando condição de procedibilidade ao parquet, a partir da sua vigência da nova lei deverá ocorrer para todos os fatos ocorridos, não apresentando qualquer dificuldade.
Todavia, e quanto aos fatos pretéritos, inquéritos policiais e ações penais em andamento, algumas com sentença condenatória e, ainda, ações penais em fase de execução de pena? Quais serão os efeitos do §5º do art. 171 do Código Penal inserido pela Lei 13.964/19? Sem pretensão de exaurir a questão, iremos apresentar soluções para a problemática que nos deparamos.
Verifica-se, pois, que estamos diante de uma norma mista, híbrida, ou seja, que possui conteúdo de direito processual penal e também conteúdo de direito material. No caso, embora seja regra de direito processual penal, ao tratar de uma condição de procedibilidade, possui efeito material penal, já que o Ministério Público necessita da representação (autorização) da vítima para oferecer a denúncia, o que poderá gerar reflexos em eventual condenação do agente e sua consequente privação da liberdade, caso venha a ser enquadrado e condenado acerca da norma do art. 171 do CP.
É cediço que a lei processual penal se aplica desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior, com a ressalva que é admitida a interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como a observância dos princípios gerais do direito, não olvidando que a regra é da irretroatividade.
Entretanto, as normas previstas no Código de Processo Penal de natureza híbrida, ou seja, com conteúdo de direito processual penal e de direito material, devem respeitar o princípio que veda a aplicação retroativa da lei penal quando seu conteúdo for prejudicial ao réu. Ou seja, a regra de irretroatividade não se aplica às normas processuais que também possuem em seu conteúdo natureza de direito material, como se verifica na espécie.
Considerando os dois princípios que regem o Direito Intertemporal das leis em matéria criminal, destaca-se que a lei penal não retroage salvo para beneficiar o réu nos termos do art. 2°, parágrafo único do Código Penal e art. 5°, XL da Constituição Federal. O segundo princípio é o da aplicação imediata da lei processual penal, preconizado pelo art. 2°. do Código de Processo Penal e que fundamenta a regra da aplicação imediata (tempus regit actum).
Sobre a lei mais severa, frise-se, a lei mais benigna deve prevalecer, prosseguindo além do momento de sua revogação, ou retroagindo ao tempo em que sua vigência não existia mais. É ultrativa e retroativa, ou seja, essas duas qualidades da mais benigna recebem o nome de extra atividade1.
In casu, não estamos diante de abolição do crime2 de estelionato (abolitio criminis), a qual ocorre quando a lei nova deixa de considerar crime o fato que foi tipificado anteriormente como ilícito penal. Nesse caso, o legislador retira a ilicitude da conduta, descriminalizando o ato que outrora era considerado como delito3.
Contudo, o §5º do art. 171 do Código Penal inserido pela Lei 13.964/19, possui norma processual penal de natureza híbrida, a qual apresenta benefício para o agente do fato (a lei nova beneficia a situação do acusado)4, qual seja, condiciona o oferecimento da denúncia à representação da vítima, sendo certo que a nova regra mais benéfica irá apresentar reflexos aos fatos pretéritos, seja os que se encontram em fase de inquérito policial, as ações penais em trâmite, e, ainda, nas ações penais em fase de execução de sentença.
Ademais, o art. 2º, parágrafo único, do Código Penal, possui a seguinte redação: "a lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado", ressaltando o ensinamento do mestre Rogério Greco (2013, p.87) acerca do referido artigo leciona: "...que os dispositivos da lei nova que ainda incriminando o fato comina penas menos rigorosas em qualidade ou quantidade, ou favorece ao agente de outra forma, acrescentado circunstância atenuante não prevista, eliminando a agravante, prevendo a suspensão condicional com maior amplitude, estabelecendo novos casos de extinção da punibilidade e reduzindo requisitos para a concessão de benefícios".
Estamos, pois, diante do princípio da retroatividade da lei penal benigna, já que a lei nova que agrava a situação não tem aplicação na esfera penal brasileira. Quando a lei posterior agrava a situação do sujeito, sem abolir precedentes ou criar novas incriminações, ela não retroage.
O festejado professor Cezar Roberto Bitencourt (2013, p. 163)5 leciona no mesmo sentido, bem como Luís Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho (1998, p.137)6.
Portanto, o §5º do art. 171 do Código Penal inserido pela Lei 13.964/19 deve retroagir para atingir fatos pretéritos, sejam inquéritos policiais em andamento, sejam ações penais ou ainda execuções penais em que restou evidenciada a tipificação do art. 171 do CP, não havendo que se falar, na espécie, em irretroatividade da lei penal, porquanto deve atingir os fatos pretéritos em benefício do réu7.
Anteriormente à vigência da Lei 13.964/19, os crimes de estelionato possuíam o status de ação penal pública incondicionada, ou seja, o parquet oferecia a denúncia em juízo após formar o seu convencimento e concluir pela existência da justa causa, sem considerar que a vítima tivesse ou não tal pretensão. Após a vigência da Lei 13.964/19, via de regra, mesmo após formar o seu convencimento e apuração da justa causa, o ministério público só poderá oferecer a denúncia em juízo com a autorização da vítima.
Considerando que o §5º do art. 171 do Código Penal inserido pela Lei 13.964/198 deve retroagir para atingir fatos pretéritos, vamos enfrentar as dificuldades e apresentar soluções para a sua aplicação aos casos pretéritos, já que a referida lei não expressou quando seria iniciado o prazo decadencial de 6 (seis) meses para a representação da vítima.
3. Os possíveis reflexos da inclusão do dispositivo no direito processual e penal;
A primeira problemática será quando observarmos uma investigação policial em curso para apuração do crime do art. 171 do CP, ainda pendente o oferecimento da denúncia. Nos parece imprescindível que a vítima deva comparecer à presença da autoridade policial ou junto ao representante do ministério público para que seja efetivada a representação, não havendo que se falar em obrigatoriedade de intimação da vítima para exercer sua faculdade, sendo o prazo decadencial de 6 (seis) meses iniciado a partir da entrada em vigor da lei 13.964/19, qual seja, dia 23/1/20.
A segunda hipótese é verificada nos casos das ações penais em curso, já ocorrido o recebimento da denúncia, mas ainda pendente de julgamento. Nesta hipótese, entendemos que o animus da vítima deverá ser observado. Caso já tenha sido ouvida em juízo ou não, defendemos a necessidade de comparecimento em audiência especial dentro do prazo de 6 (seis) para que exerça seu direito à representação e, caso não o faça, o juiz deverá extinguir a punibilidade pela decadência, na forma do art. 107, IV, do Código Penal. No caso de sentença absolutória, sustentamos que o parquet apenas teria legitimidade para interpor recurso de apelação caso a vítima exerça seu direito de representação dentro do prazo recursal.
A terceira situação verifica-se após a prolação de sentença penal condenatória, ainda que transitada em julgado. Nessas situações nosso posicionamento é de que nos processos sem a ocorrência do trânsito em julgado devem ser adotadas a solução da segunda hipótese, qual seja, o animus da vítima deverá ser observado. Caso já tenha sido ouvida em juízo ou não, deverá comparecer em audiência especial dentro do prazo de 6 (seis) para que exerça seu direito à representação e, caso não o faça, o juiz deverá extinguir a punibilidade pela decadência, na forma do art. 107, IV, do Código Penal. Já nos processos com trânsito em julgado, idêntico procedimento deverá ser adotado, porém pelo juízo da execução, o qual deverá extinguir a punibilidade extinguindo-se o processo por falta de pressuposto processual (condição da ação), com a extinção da punibilidade, em analogia ao art. 485, IV, do Código de Processo Civil c/c o art. 107, IV, do Código Penal, caso a vítima não exerça seu direito de representação.
A quarta e última hipótese apresentada, e mais problemática, restará enfrentada no malfadado e denominado "estelionato judiciário".
4. Da atipicidade do estelionato judiciário;
Com a brevidade que se impõe, iremos esclarecer o significado do "tipo" penal acima referido, ainda que seja ao arrepio da lei penal, porém necessário se faz o enfrentamento da questão porque não são poucos os casos em que Advogados foram e são processados, e condenados, por "estelionato judiciário" na esfera estadual do Rio de Janeiro e em outros Estados da Federação, frise-se, pelo simples ajuizamento de ações cíveis representando clientes em face de determinadas empresas em que se busca a reparação por danos morais.
Ora, o Advogado não comete crime quando elabora uma petição, já que petição é constituída de alegações do início ao fim, pois se trataria de um crime epistêmico, crime pelo exercício da inteligência, consoante assevera Guilherme de Souza Nucci, ressaltando que o ajuizamento de ação não pode ser compreendido como pratica delitiva, pois, com a teoria da tipicidade conglobante de ZAFFARONI, não há como imaginar a ilicitude de um procedimento que o sistema normativa lhe confere, em outro dispositivo, licitude.
Em suma, a conduta de advogado não apresenta qualquer indicio de antinormatividade, eis que é legitimada pelo inc. XXXV, do art. 5º e art. 133, ambos da Constituição Federal, com destaque para a lição irretocável de Guilherme de Souza Nucci, Código Penal Comentado, 11ª Edição, p. 1.116 /1.1179.
Para além da atipicidade, não há como imaginar antijuridicidade na suposta prática de "estelionato judiciário", uma vez que a ação concerne a mero exercício regular de direito (o exercício da advocacia), conforme a justificante prevista no inc. III, do art. 23, do CP, ressaltando, como exemplo, Acórdão da Terceira Câmara Cível do Rio de Janeiro10, da lavra do Des. Fernando Foch de Lemos Arigony da Silva, que, não só considerou lícita a conduta do Advogado, como acolheu os seus argumentos e afastou a incidência da Súmula 385 do STJ, não havendo que se falar, portanto, de ilícito penal tal como ocorrido, concretamente, e lamentavelmente, no Poder Judiciário em casos semelhantes, já que uma conduta não pode ser considerada ilícita e lícita ao mesmo tempo, consoante a teoria da tipicidade conglobante de ZAFFARONI, o que violaria, ainda, o princípio da reserva legal.
Entretanto, a quarta questão posta aqui se impõe. Quais os reflexos e soluções da lei 13.964/19 diante da teratologia do "estelionato judiciário"?
O chamado "estelionato judiciário", pela elaboração de uma petição cível, provocando o Estado-Juiz a entregar a prestação jurisdicional não deveria ser caso de fato típico, quiçá do advogado que não é parte, ele atua em nome da parte, sendo certo que, deveria, também, figurar o seu cliente (autor da ação cível) como acusado na referida ação penal, por força do princípio da obrigatoriedade.
Outrossim, em qualquer hipótese, seja na fase pré-processual ou no curso da ação penal, inclusive com trânsito em julgado, em que se apura o "estelionato judiciário", destaque para a teratologia: quem seria ou quem é a vítima para que seja verificado o animus e, eventualmente, seja exercido o direito de representação no prazo de 6 (seis) meses, nos termos do §5º do art. 171 do Código Penal inserido pela Lei 13.964/19?
Data venia, uma empresa demandada não pode, jamais, ser considerada vítima por ter sido demandada na esfera cível e, aquele que fora arrolado eventualmente como vítima (cliente de advogado), no caso, deveria figurar como coautor do "estelionato judiciário", razão pela qual entendemos que restaria insanável a apuração do animus da "vítima", qual seja, a representação, razão pela qual defendemos que o juiz, seja em qualquer fase do processo, inclusive na fase de execução, deverá extinguir o processo por falta de pressuposto processual (condição da ação), com a extinção da punibilidade, em analogia ao art. 485, IV, do Código de Processo Civil c/c o art. 107, IV, do Código Penal, reprise-se, considerando a impossibilidade de ocorrer a representação pela inexistência de vítima, porquanto, esta, no melhor dos mundos, deveria ter figurado como coautora na ação penal em que se apurou o denominado e teratológico "estelionato judiciário".
5. Considerações finais.
Por derradeiro, concluímos que o §5º do art. 171 do Código Penal, inserido pela Lei 13.964/19, trouxe ao ordenamento pátrio avanços, os quais serão importantes para a pacificação social e economia para o Estado, porquanto se aguarda a diminuição no número de demandas penais acerca dos crimes de estelionato e "estelionato judiciário", este que sequer faz parte do ordenamento pátrio.
Nesse sentido, o crime de estelionato visa a tutela patrimonial, e a partir da entrada em vigor da lei 13.964/19, dia 23/01/2020, haverá a necessidade de representação da vítima para que o parquet possua condição de procedibilidade para oferecer denúncia contra o agente enquadrado no tipo penal do artigo 171 do CP. Outrossim, com eventual ressarcimento patrimonial, o animus da vítima possivelmente será diminuído, contentando-se exclusivamente com a reparação material outrora sofrida.
Sob outra vertente, no que se refere ao teratológico "estelionato judiciário", o §5º do art. 171 do Código Penal, inserido pela Lei 13.964/19, evidenciou de forma patente se tratar de um desarranjo construído de modo temerário e com induvidosa usurpação do Poder Legislativo pelo Poder Judiciário, eis que ao tornar obrigatória a representação da vítima para dar condição de procedibilidade para a ação penal, a qual transmudou de ação penal pública incondicionada para ação penal pública condicionada à representação, com as ressalvas, na medida que o autor de ação cível figurou equivocadamente como vítima em ação penal para apuração de "crime" estranho ao ordenamento jurídico pátrio, não há outra solução que não seja a extinção da ação penal por ausência de pressuposto processual válido, com a consequente extinção da punibilidade, sendo inquestionável que ação cível não pode ser entendida como ardil, mas, por óbvio, deve ser o que é, ou seja, exercício regular do direito do Advogado atuar em seu múnus público, manifestando, outrossim, uma mancha indelével para o Poder Judiciário e para o Ministério Público.
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1 (...) é a capacidade que tem a lei penal de se movimentar no tempo regulando fatos ocorridos durante sua vigência, mesmo depois de retroagir ou de ter sido revogada, ou de retroagir no tempo, a fim de regular situações ocorridas anteriormente à sua vigência, desde que benéficos ao agente.
(Rogério Greco, 2013, p.79)
2 A abolição do crime representa a supressão da figura criminosa. Trata-se de revogação de um tipo penal pela superveniência de lei descriminalizadora e ocorre sempre que o legislador, atendendo às mutações sociais (e ao princípio da intervenção mínima), resolve não mais incriminar determinada conduta, retirando do ordenamento jurídico-penal a infração que a previa, julgando que o Direito Penal não mais se faz necessário à proteção de determinado bem jurídico. (Cunha, 2013, p. 100)
3 Dispõe o art. 2º do Código Penal que "ninguém pode ser punido por fato que a lei posterior deixar de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória".
4 O advento de uma lei nova poderá beneficiar o agente não apenas quando descriminaliza o fato anteriormente punível, mas quando institui uma regra de Direito Penal que: a) altera a composição do tipo de ilícito; b) modifica a natureza, a qualidade, a quantidade ou a forma de execução da pena; c) estabelece uma condição de punibilidade ou processabilidade; d) de qualquer outro modo é mais favorável. (Dotti, 2010, p.34)
5 "Toda lei penal, seja de natureza processual, seja de natureza material, que, de alguma forma, amplie as garantias de liberdade do indivíduo, reduza as proibições e, por extensão, as consequências negativas do crime, seja ampliando o campo da licitude penal, seja abolindo tipos penais, seja refletindo nas excludentes de criminalidade ou mesmo nas dirimentes de culpabilidade, é considerada lei mais benigna, digna de receber, quando for o caso, os atributos da retroatividade e da própria ultratividade penal."
6 "Se a norma processual contém dispositivo que, de alguma forma, limita direitos fundamentais do cidadão, materialmente assegurados, já não se pode defini-la como norma puramente processual, mas como norma processual com conteúdo material ou norma mista. Sendo assim, a ela se aplica a regra de direito intertemporal penal e não processual."
7 (...) incluem-se aí as situações em que as leis posteriores cominam pena mais grave em qualidade, para o caso de reclusão em vez de detenção, por exemplo, ou quantidade, no que se refere aos limites de duração da reprimenda, ou ainda, se acrescentam circunstâncias qualificadoras ou agravantes não previstas anteriormente, se eliminar atenuantes ou causas de extinção da punibilidade, se exigem mais requisitos para a concessão de benefícios, dentre outras. (Mirabete e Fabbrini, 2013, p. 89)
Alguns doutrinadores entendem que na hipótese de a lei nova favorecer o agente em um aspecto, possibilitando-lhe o sursis, por exemplo, e prejudicá-lo em outro, cominando pena mais severa em quantidade, deverá ser aplicada apenas uma lei, a que, afinal, favorece o agente. E, concluem o ensinamento ao afirmar que a melhor solução, porém, é a de que pode haver combinação de duas leis, aplicando-se sempre os dispositivos mais benéficos. (Mirabete e Fabbrini, 2013, p. 75)
8 § 5º Somente se procede mediante representação, salvo se a vítima for:
I - a Administração Pública, direta ou indireta;II - criança ou adolescente;III - pessoa com deficiência mental; ouIV - maior de 70 (setenta) anos de idade ou incapaz.
9 "Petição de advogado: não é considerado documento, para fins penais. Na realidade, o documento é uma peça que tem possibilidade intrínseca (e extrínseca) de produzir prova, sem necessidade de outras verificações. Aliás, essa é a segurança da prova documental. Portanto, se alguém apresenta uma cédula de identidade, quem a consulta tem a certeza de se tratar de pessoa ali retratada, com seus dados pessoais. Não se faz verificação do conteúdo desse documento. No entanto, a petição de advogado é constituída de alegações (do início ao fim), que merecem ser verificadas e comprovadas. Por tal motivo, não pode ser considerada documento penalmente relevante nos moldes do art. 299 do Código Penal. (...) A simples indicação falsa de endereço em petição inicial de ação não configura crime de falsidade ideológica, pela ausência de qualquer potencialidade lesiva, um de seus elementos subjetivos" (HC416.172-3/3, Santa Fé do Sul, 3ª C., rel. Walter de Almeida Guilherme, 08.04.2003, v.u. JUBI 83/03). Idem: TJSP:"Ora, a petição inicial de qualquer ação cível, antes de seu ingresso em juízo, é de cunho particular e pode ser alterada por seu autor de acordo com a sua vontade. Outrossim, enquanto não ajuizada, tal petição não é documento, já que ainda não é capaz de produzir qualquer efeito jurídico" (HC 468.011-3/5, 5ª C., rel. Gomes de Amorim, 13.01.2005, v.u., Bol AASP 2.419)"
10 Apelante: JOSENILDO VILELA DE ARAUJO. Apelada: BANCO SANTANDER BRASIL S.A. Relator: Des. Fernando Foch Processo Originário: 0350591-36.2010.8.19.0001. Juízo do Direito da 21ª Vara Cível Comarca da Capital.
ACÓRDÃO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. COBRANÇA E INSCRIÇÃO INDEVIDAS EM CADASTROS DE RESTRIÇÃO CREDITÍCIA. DANO MORAL. Ação proposta por consumidor por equiparação em face de sociedade empresária com a qual não contratara, mas ainda assim teve seu nome inscrito em cadastros de restrição ao crédito. Sentença de parcial procedência tão somente para declarar a inexistência da dívida, bem como para determinar a exclusão do nome do autor da nominata desabonadora. Apelo que visa à condenação da ré ao pagamento de indenização por dano moral. 1. Não é lícito inscrever quem nada deve em cadastro de restrição creditícia. 2. Tal inscrição causa dano moral in re ipsa, ainda mais se tem reflexos sobre a reputação do inscrito; a ilicitude da inscrição gera o dever de indenizar (Súmula 89 do TJERJ) que não se afasta pela existência de anotações preexistentes cuja legitimidade não restou demonstrada. 3. Recurso ao qual se dá provimento.