O caso Marielle Franco: A urgente reivindicação por justiça e rigor no tratamento de crimes políticos
Novas revelações sobre o caso Marielle reforçam a importância de abordagens diferenciadas para crimes políticos, destacando a urgência de uma justiça imparcial para preservar os pilares democráticos.
quarta-feira, 26 de julho de 2023
Atualizado às 10:41
Do ocorrido
O assassinato da vereadora Marielle Franco, ocorrido em 14 de março de 2018, foi um evento que abalou profundamente o Brasil e ganhou repercussão internacional1. Ao longo de sua carreira política como vereadora da cidade do Rio de Janeiro, Marielle Franco enfrentou desafios significativos, especialmente ao lidar com as milícias, que são grupos paramilitares formados, muitas vezes, por ex-policiais e militares, que exercem controle ilegal sobre vastas áreas urbanas do Rio de Janeiro. Ela tornou-se conhecida por sua postura incisiva ao denunciar abertamente a atuação desses grupos criminosos, que frequentemente estão envolvidos em atividades ilegais e violentas. Sua presença no cenário político representava um símbolo poderoso de resistência e empoderamento para as mulheres, especialmente para as minorias, que historicamente foram marginalizadas na política brasileira.
Após sua morte, o legado de Marielle se tornou uma fonte de inspiração para movimentos sociais, lideranças políticas e defensores dos direitos humanos. Protestos e manifestações ocorreram em diversas cidades brasileiras e ao redor do globo, clamando por justiça e por um esclarecimento completo das circunstâncias que levaram ao seu assassinato.
Contudo, recentemente, houve um desenvolvimento no caso que trouxe à tona novas informações sobre os responsáveis pelo crime. O ex-policial militar Élcio Queiroz, preso em 2019 suspeito de participação no assassinato de Marielle Franco, fez uma delação premiada, onde confessou ter dirigido o carro no dia do ataque à vereadora e afirmou que Ronnie Lessa, também ex-policial militar, foi o autor dos disparos que atingiram Marielle e o seu motorista Anderson Gomes2.
Esse novo desdobramento na investigação reforça a motivação política por trás do assassinato de Marielle Franco, uma vez que os envolvidos têm ligações com forças de segurança e se valeram de suas posições para perpetrar o crime. Isso se torna claro quando observamos que a participação de ex-policiais militares, supostamente ligados a milícias e interesses escusos, no crime contra uma representante eleita democraticamente evidencia um ataque à pluralidade democrática e à liberdade de expressão política.
Análise
A gravidade dos crimes políticos em relação aos crimes comuns envolve questões complexas que abrangem a democracia, o respeito aos direitos humanos e a proteção dos grupos minoritários. Neste contexto, o assassinato da vereadora Marielle Franco se destaca como um exemplo emblemático de como tais crimes podem abalar profundamente os alicerces democráticos, impactando negativamente camadas específicas da sociedade como um todo. Tendo em vista que a democracia é um sistema político baseado na participação ativa dos cidadãos, no respeito aos direitos fundamentais e na garantia do Estado de Direito, quando um crime político ocorre, os fundamentos democráticos são ameaçados, uma vez que a ação criminosa visa silenciar vozes discordantes, intimidar defensores de causas justas e minar a confiança na institucionalidade.
Em sociedades democráticas, é essencial que os cidadãos se sintam seguros para exercerem seus direitos civis e políticos, incluindo o direito à liberdade de expressão e participação política. Quando um crime político como o assassinato de Marielle ocorre, o medo e a insegurança se instalam, desencorajando outros ativistas e defensores dos direitos humanos a continuarem sua luta por justiça e igualdade. Isso resulta em um efeito intimidador que mina o pluralismo político e enfraquece o debate público, elementos essenciais para o funcionamento saudável de uma democracia.
Além disso, a violência política tem impactos diretos e indiretos sobre as minorias ou grupos marginalizados que são representados por figuras como Marielle Franco. Ela era uma voz ativa na luta por direitos e oportunidades para as mulheres, os negros, as comunidades LGBT+ e os moradores de favelas. Consequentemente, o assassinato de Marielle envia uma mensagem a esses grupos, indicando que suas lutas por igualdade e inclusão podem resultar em consequências devastadora, criando uma atmosfera de vulnerabilidade e desamparo para essas comunidades.
Logo, quando o Estado falha em investigar e punir adequadamente os crimes políticos, há uma clara violação da garantia de acesso à justiça e da proteção dos direitos humanos. Isso porque a impunidade gera um ambiente permissivo para que tais crimes se repitam, criando um ciclo de violência e violações de direitos.
Em suma, a seriedade dos crimes políticos reside no impacto que têm sobre os princípios fundamentais da democracia, na ameaça à diversidade de vozes e perspectivas, bem como na insegurança gerada para os grupos minoritários. O assassinato de Marielle Franco é uma dolorosa lembrança de que a luta por uma sociedade mais justa e igualitária pode custar vidas preciosas, destacando a necessidade de fortalecer a proteção dos direitos humanos, a independência do sistema judicial e o compromisso inabalável com a preservação dos valores democráticos. Somente assim poderemos honrar o legado de Marielle Franco e de tantos outros defensores da justiça que perderam suas vidas em busca de um mundo melhor.
Portanto, a resposta jurídica a crimes políticos deve ser robusta, assegurando investigações imparciais, julgamentos justos e penas proporcionais aos responsáveis. Pois a não punição de crimes políticos enfraquece a confiança da sociedade no sistema de justiça e, consequentemente, nas instituições democráticas.
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1 O caso Marielle - Intercept Brasil
2 Em delação, Élcio Queiroz apontou ex-sargento da PM como "intermediário" em morte de Marielle Franco (cnnbrasil.com.br)