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Ligações e mensagens excessivas de cobrança: Uma análise jurídica

Cansado de receber ligações de cobrança? Você sabia que existem protocolos adequados de acordo com a situação para evitar ligações excessivas de cobrança?

sábado, 22 de julho de 2023

Atualizado em 21 de julho de 2023 09:37

Resumo

Este artigo jurídico tem como objetivo analisar a (i)legalidade das ligações excessivas de cobrança realizadas por empresas e instituições financeiras, sob a ótica do ordenamento jurídico brasileiro. Serão abordadas as normas legais que protegem os consumidores contra práticas abusivas nesse contexto, bem como as consequências jurídicas e medidas de combate a esse tipo de conduta.

Introdução

As ligações de cobrança são uma ocorrência comum e muitas pessoas já tiveram que lidar com essa situação pessoalmente ou conhecem alguém que passou por isso. No entanto, é crucial ressaltar que as empresas devem respeitar limites ao entrar em contato com os clientes, mesmo quando estão inadimplentes.

Esses limites existem para preservar o bem-estar dos clientes e assegurar o cumprimento da legislação em vigor.

Características das ligações excessivas de cobrança

As ligações excessivas de cobrança caracterizam-se por uma repetição desproporcional e constante de contatos telefônicos feitos por empresas e instituições financeiras com o objetivo de cobrar dívidas. Essa prática, além de causar desconforto e constrangimento, pode configurar uma violação aos direitos do consumidor.

Legislação protetiva

O Código de Defesa do Consumidor (lei 8.078/90) é a principal legislação que regula as relações de consumo no Brasil. Ele estabelece direitos fundamentais do consumidor e proíbe práticas abusivas por parte dos fornecedores de produtos ou serviços.

O art. 42 do CDC, por exemplo, dispõe que na cobrança de dívidas, o consumidor inadimplente não poderá ser exposto a ridículo ou submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.

Já o art. 71 do mesmo código afirma: "Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer".

Para as demais ligações ao consumidor que não envolvam necessariamente cobrança, como as de telemarketing e outras para fins comerciais, o código estabelece como direito básico do consumidor, no art. 6°, inciso IV: "... a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços ...".

O "Código de Ética do Telemarketing" elaborado pela Associação Brasileira de Telesserviços (http://abt.org.br/codigo-etica-probare/)  é mais uma das opções do consumidor, na tentativa de evitar o abuso, prática comum em que os operadores extrapolam a faculdade de oferecer o produto ou serviço e assediam um potencial cliente de forma infeliz.

Seu art. 7º - Respeito à Privacidade do Consumidor, diz que "os responsáveis pelo serviço devem utilizar as informações dos Consumidores de maneira adequada e respeitar o seu desejo em retirar estas informações das bases de dados".

Por conseguinte, aduz o parágrafo 1º: "A Central de Relacionamento deve remover ou solicitar a remoção do nome de Consumidores que não desejarem figurar nas listas, para a Empresa/Contratante, sempre que for solicitado. Por sua vez, a Empresa/Contratante deve assegurar esta remoção ou ainda encaminhar solicitação ao proprietário da lista."

Cadastro de bloqueio

Com o intuito de coibir as ligações e mensagens indesejadas, foi criado o Cadastro Nacional de Bloqueio de Telemarketing (CNBT), regulamentado pela Resolução 632/14 da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Os consumidores podem cadastrar seus números de telefone no CNBT, de forma gratuita, para não receberem ligações de telemarketing.

O cadastro deve ser feito no site https://www.naomeperturbe.com.br/: o site permite de forma fácil e gratuita o bloqueio do contato de ligações de prestadoras de serviços em telecomunicações, como operadoras de telefonia e TV por assinatura, e pelas instituições financeiras como operadoras de cartão de crédito, consignado e empréstimo.   

Sanções e responsabilidades

As empresas que descumprirem as normas de proteção ao consumidor estão sujeitas a sanções administrativas e civis. A Anatel pode aplicar multas e outras penalidades às empresas de telecomunicações que realizarem ligações de telemarketing sem a devida autorização ou em desrespeito às regras estabelecidas.

Se as ligações persistirem, as reclamações poderão ser registradas diretamente na Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) pelo site: https://www.gov.br/anatel/pt-br/consumidor/quer-reclamar/reclamacao.

A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) sugere também anotar os números que realizam chamadas repetitivas, capturar a tela do celular ou mesmo gravá-los, e registrar na plataforma do consumidor: https://www.consumidor.gov.br/pages/principal/?1671024978125. 

Se ainda assim o problema persistir, há sempre a possibilidade de buscar apoio técnico de um advogado. As empresas e instituições financeiras que realizam ligações excessivas de cobrança podem ser responsabilizadas judicialmente pelos danos morais causados ao consumidor.

Neste contexto, a jurisprudência favorável é farta conforme se observa dos julgados pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo a seguir coligidos:

"DANO MORAL - Débito inexistente - Contratação do serviço não demonstrada - Cobranças indevidas - Ligações incessante e diversas mensagens de texto para cobrança - Conduta que ultrapassa o mero aborrecimento - Indenização - Cabimento -. - A hipótese na qual a instituição financeira incessantemente efetua dezenas de ligações acompanhadas de mensagens de texto para cobrança de dívida em nome de terceiro estranho ultrapassa o mero aborrecimento, merecendo ser reparada com a fixação de indenização por danos morais. RECURSO DO AUTOR PROVIDO. RECURSO DO BANCO RÉU PROVIDO EMPARTE" (TJSP, Apelação Cível 1005524-71.2019.8.26.0526; 13ª Câmara de Direito Privado; j. 23/06/2021, rel. Des. Nelson Jorge Júnior).

"APELAÇÃO. Ação de obrigação de não fazer cumulada com indenização por danos morais. Ligações telefônicas de forma excessiva e ininterrupta, supostamente realizadas pela instituição financeira-ré, cobrando dívida de terceiro e desconhecida pelo autor. Pedido do autor para que cessem tais ligações e que seja indenizado pelo incomodo. Alegação do Banco réu de que não cometeu qualquer ilegalidade porquanto procedeu com cobranças utilizando-se de número cadastrado no sistema. Situação que causou desgaste, frustração e retirou a paz de espírito do autor. Dano moral caracterizado. Verba indenizatória fixada em valor condizente com a situação. Sentença de procedência que deve ser mantida. Recurso improvido" (Apelação 1000745-51.2017.8.26.0362, rel. Silveira Paulilo, j. 26 de julho de 2018).

"Ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais e pedido de tutela antecipada. Compra de linha telefônica. Instalação de número que anteriormente pertenceu a uma agência bancária. Número que ainda consta em sítios da internet como sendo da agência bancária. Negativa da Ré em realizar a alteração do número sem cobrança de tarifa. Ligações excessivas que causam perturbação ao sossego e transtornos de ordem moral. Dano moral caracterizado. Fixação de honorários advocatícios que deve se dar sobreo valor da condenação. Sentença parcialmente reformada. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO." (Apelação 1123165-39.2015.8.26.0100, rel. L. G. COSTA WAGNER, jul. 11 de abril de 2018).

"APELAÇÃO. Ação de obrigação de fazer cumulada com reparação de danos morais. Sentença de procedência. Recurso da corré Recovery. Ausência de impugnação aos fundamentos da r. sentença. Claras evidências de que as razões recursais repousam em temática tratada em demanda diversa, sem qualquer relação de congruência com as razões de decidir expostas na sentença proferida neste feito. Recurso não conhecido. Recurso do Banco Santander. Ilegitimidade passiva. Débito cedido à corré, empresa de cobrança. Vinculação entre o banco e o terceiro (José), devidamente demonstrada. Preliminar rejeitada. Cobrança de forma excessiva e ininterrupta, como no caso, corroborada pelo fato de se tratar de dívida de terceiro, configura conduta abusiva do credor. Imposição de obstáculos para solucionar a questão administrativamente. Situação que causa mais desgaste, frustração e retira a paz de espírito do lesado. Dano moral caracterizado. Dano in re ipsa. Desnecessidade de prova. Verba indenizatória fixada em valor condizente com a situação. Termo inicial da correção monetária e dos juros de mora corretamente fixado. Art. 85, § 11, do CPC. Impossibilidade de aplicação. Verba honorária fixada em percentual máximo. Sentença mantida. Recurso não provido." (TJSP 1006919- 71.2017.8.26.0590 Apelação - Relator Silveira Paulilo, Órgão julgador 21ª Câmara de Direito Privado, Data de publicação: 5/3/18).

Medidas do consumidor

Como já mencionado, os consumidores que se sentirem incomodados com as ligações e mensagens de telemarketing incessantes devem registrar reclamações junto ao Procon, à Anatel e, quando necessário, buscar auxílio jurídico para adotar medidas judiciais. Além disso, é importante cadastrar-se no CNBT (https://www.naomeperturbe.com.br/) como forma de reduzir o recebimento dessas ligações.

É sempre importante registrar todas as ocorrências, anotando a data, horário e conteúdo das ligações. Em seguida, o consumidor deve formalizar reclamação junto ao Procon, órgão de defesa do consumidor, e solicitar a cessação imediata das ligações. Caso as ligações persistam, é recomendável buscar orientação jurídica para ingressar com uma ação judicial.

Conclusão

Com base na análise realizada, fica evidente que as ligações excessivas de cobrança são ilegais e violam os direitos dos consumidores. O ordenamento jurídico brasileiro, por meio do CDC, estabelece proteção contra práticas abusivas, como a exposição ao ridículo e ao constrangimento. Os consumidores têm o direito de exigir o respeito à sua privacidade e dignidade, podendo buscar reparação judicial por danos morais decorrentes dessas ligações. É fundamental que os consumidores estejam cientes de seus direitos e ajam de acordo para combater essa prática abusiva, garantindo assim o respeito aos seus direitos enquanto consumidores.

Thyago Garcia

VIP Thyago Garcia

Advogado, Sócio-Fundador do escritório "Garcia Advogados", Diretor da OAB/PG, pós-graduado em Direito do Trabalho e em Processo Civil pela Universidade Católica de Santos/UniSantos.

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