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A indicação para o Supremo Tribunal Federal e as lições de Sobral Pinto

Ontem, 21/6, perante a Comissão de Constituição e Justiça, em Brasília, foi feita a sabatina do advogado Cristiano Zanin para compor o Supremo Tribunal Federal.

quinta-feira, 22 de junho de 2023

Atualizado às 09:55

Ontem, 21/6, perante a Comissão de Constituição e Justiça, em Brasília, foi feita a sabatina do advogado Cristiano Zanin para compor o Supremo Tribunal Federal. Zanin teve os votos necessários e será o sucessor da cadeira do ex-Ministro Ricardo Lewandowski.

Para além de todos os comentários que já foram feitos, sejam eles a favor da indicação - como os de que Zanin cumpre com os requisitos constitucionais, apesar de sua jovialidade, como notou o ex-Ministro Celso de Mello - ou sejam eles contra - como aqueles que questionam o conflito de interesses que haveria entre o advogado e o Presidente Lula -, certo é que, sem moralismo, a decisão de indicar um nome ao Supremo é eminentemente política. E isso vale para todos que ocupam ou já ocuparam qualquer cadeira na mais alta instância judicial do país.

Não faz muito tempo, o campo progressista dos juristas, principalmente os advogados e advogadas, do qual eu me considero parte, criticava - e com razão - a indicação para o Supremo do então juiz da Operação Lava-Jato, Sergio Moro, pelo ex-Presidente Bolsonaro. O que mudou, então, senão a conveniência? Longe de querer ser meu objetivo desqualificar a figura do Dr. Cristiano Zanin, gostaria apenas de trazer à memória a figura do também advogado Dr. Heráclito Fontoura Sobral Pinto.

Falecido em 30 de novembro de 1991, Sobral Pinto exerceu seu mister durante períodos nebulosos, para dizer o mínimo, da nossa história recente: o Estado Novo (1937-1946) e a Ditadura Civil-Militar (1964-1985). Disse certa vez o historiador José Murilo de Carvalho, que "tocar no Sobral Pinto era mais difícil do que fechar o Congresso".

Apesar de ser um católico fervoroso e convicto, sua ética como advogado em nada o impediu de defender os comunistas Luiz Carlos Prestes e Harry Berger do julgo do Tribunal de Segurança Nacional, em 1937. E o fez com amor e dedicação, rendendo uma amizade verdadeira entre Sobral e Prestes até o fim de suas vidas.

Em 1955, em mais uma, das tantas, tentativa de golpe por setores da Forças Armadas, Sobral Pinto, mesmo fazendo oposição à candidatura de Juscelino Kubitschek, fundou e encabeçou a Liga de Defesa da Legalidade, ajudando a garantir que a democracia e o processo eleitoral fossem respeitados.

O agora Presidente da República, em 1956, Juscelino Kubitschek ofereceu a Sobral uma cadeira no Supremo Tribunal Federal como demonstração de gratidão e retribuição pelo importante papel que cumprira em prol de sua candidatura. Sobral, de pronto, recusou o convite, já que não queria que pensassem que suas ações haviam sido movidas por interesse pessoal.

Sobral Pinto, advogado, merece sempre estar em nossas memórias como símbolo de que podemos - e devemos - ser senhores de nossas próprias decisões. Afora o rito republicano e às formalidades constitucionais, sempre o que nos resta é a substância de nossas atitudes.

Enfim, resta-nos desejar que o novo Ministro Cristiano Zanin seja, em sua prática agora judiciária, um defensor dos direitos humanos e da Constituição, especialmente em matéria penal.

Luca Parentoni

Luca Parentoni

Graduado pela Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie, participou da VII Escola Alemã de Ciências Criminais realizada pelo Centro de Estudos de Direito Penal e Processo Penal Latino-americano (CEDPAL) da Universidade Georg-August de Göttingen (Alemanha), especializando-se em Direito Penal Econômico pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra/Portugal, é parecerista, responsável pela área consultiva de temas específicos do Direito Penal e Penal Econômico, atuante nos Tribunais Superiores. Membro do IBRADD - Instituto Brasileiro do Direito de Defesa e do IBCCRIM - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais.

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