A imputação de lavagem de dinheiro como muleta acusatória
É necessária a reflexão acerca do uso da imputação do crime de lavagem de dinheiro como muleta acusatória, o que ocorre na maioria das situações nas quais há a apreensão de elevados montantes, contas bancárias no exterior e demais elemento.
sexta-feira, 12 de maio de 2023
Atualizado às 14:29
Uma vez mais a apreensão de quantias consideráveis de dinheiro em espécie envolvendo contextos políticos ganha destaque na mídia, após busca na residência de personagem que participou ativamente do mandato do ex-Presidente da República em período marcado pela pandemia da Covid-19.
Neste cenário, como era de se esperar, a diligência promovida pela Polícia Federal, que resultou na localização do montante em espécie na residência do militar, agora preso preventivamente, subsidiou também o início de investigações policiais para apurar a suposta prática do crime de lavagem de dinheiro.
É bem verdade, entretanto, que muito do que é publicamente noticiado trata-se, no mais das vezes, de um fragmento daquilo que de fato condiz totalidade do ocorrido, de forma que não se sabe se, além do que fora publicado, há outros elementos que corroborem de forma plausível a atuação das autoridades públicas.
Todavia, também é de se afirmar que determinados contextos nacionais tendem gerar uma atuação estatal questionável, como ocorre em um cenário no qual há a apreensão de valores em dinheiro, que quase sempre resulta na apuração do crime de lavagem de dinheiro, como se aquela conduta fosse requisito lógico para a caracterização desta infração penal.
Assim sendo, é necessário que se analise, brevemente, alguns pressupostos lógicos, tanto para a abertura de uma investigação criminal, quanto para a responsabilização pelo delito de lavagem de capitais.
Neste sentido, sabe-se que a abertura de uma investigação criminal requer, por óbvio, que haja um crime a ser apurado. Se assim não fosse, as policiais judiciárias estariam extremamente ocupadas averiguando as mais diversas condutas atípicas.
Ademais, isto é tão contundente na jurisprudência de nosso país, que uma das hipóteses que admite o trancamento (suspensão) excepcional de uma investigação é a atipicidade da conduta que está sendo perquirida pelo Estado.
É necessário que se diga, portanto, qual é o núcleo essencial para a tipicidade do delito de lavagem de capitais, previsto na lei 9.613/98, e que frequentemente é etiquetado em contextos que fogem de sua essência repressiva.
Isto é, o crime de branqueamento de capitais trás, em sua essência, a punição àqueles que objetivam reinserir na economia formal os valores obtidos através de prática ilícitas, como o tráfico de drogas e a corrupção, escondendo as suas origens escusas.
Partindo deste pressuposto de política criminal que motivou a edição da legislação antilavagem, e também do disposto no art.1º da norma, conclui-se que o elemento indispensável para a tipificação do delito é o ato destinado a ocultar a origem criminosa de determinado bem, valor, dinheiro ou ativo.
À vista disto, seria forçoso enxergar a prática de lavagem de dinheiro na conduta do sujeito que, simplesmente, guarda quantias em espécie em sua residência, não encontrando um respaldo lógico para que o Estado promova uma persecução criminal prévia ao sujeito acerca de condutas que não preenchem, num primeiro momento, os pressupostos lógicos.
Por conseguinte, também é necessária a reflexão acerca do uso da imputação do crime de lavagem de dinheiro como muleta acusatória, o que ocorre na maioria das situações nas quais há a apreensão de elevados montantes, contas bancárias no exterior e demais elementos que, por si só, não indicam a prática de qualquer atividade ilícita, mas que, no mais das vezes, motivam investigações policiais e até ações penais que ocasionam grandes embaraços para o sujeito investigado ou acusado.
Leonardo Tajaribe Jr.
Advogado Criminalista. Especialista em Direito Penal Econômico (COIMBRA/IBCCRIM). Pós-Graduado em Direito Penal e Processual Penal (UCAM). E-mail: [email protected]