O Poder Judiciário. Vocação, ética e independência
E um ponto essencial é que as pessoas e órgãos responsáveis pelas indicações desses importantes agentes públicos privilegiem a vocação, a ética e a independência dos futuros integrantes do Poder Judiciário.
sexta-feira, 12 de maio de 2023
Atualizado às 08:30
O dia 10 de maio é reservado para celebrar o "Dia da Memória do Poder Judiciário". A data faz referência ao alvará de 10 de maio de 1808 de D. João VI, que criou a Casa de Suplicação do Brasil, primeiro órgão de cúpula do Poder Judiciário, considerado por muitos como precursora do Supremo Tribunal Federal.
É evidente que a rica história do Poder Judiciário do Brasil tem muitas recordações e sua memória deve ser preservada, pois retrata a história de luta do próprio país e de seu sofrido povo.
Mas a data também serve para, celebrando a memória, refletirmos o futuro.
O Judiciário é o mais importante dos poderes. É ele quem aplica as leis, quem julga seus pares, quem cuida do destino de cada cidadão quando analisa o direito por eles reclamado. É, ou deveria ser, o guardião da ética, da moral e do justo.
Justamente nesse ponto que é necessário fazer observações apropriadas para reflexão.
O Poder Judiciário, sucateado em grande parte do Brasil e afogado em número absurdo de processos, na grande maioria das vezes, foi construído por valorosos e abnegados magistrados e magistradas, com atuação destemida e nem sempre reconhecida pela sociedade.
Não estamos aqui falando de juízes ou juízas que buscam os holofotes da mídia para se tornarem celebridades e galgarem no futuro postos políticos. E sim de pessoas anônimas, mesmo que autoridades legalmente constituídas, que trabalham arduamente por pura vocação, que é o atributo principal que configura ser um julgador diferenciado dos demais.
Daí a necessidade de se buscar cada vez mais pessoas vocacionadas para esse tipo de atividade.
De certa forma, com o devido respeito, pouco importa o vasto conteúdo acadêmico de um aspirante ao cargo de magistrado, se lhe falta a verdadeira vocação. E a vocação, registre-se, não é pelo cargo, mas sim pela missão de fazer justiça, que nem sempre depende de atos complexos, ao contrário, muito se faz com a aplicação simples do direito ao caso concreto.
Quem é verdadeiramente vocacionado, carrega consigo, também, provavelmente até como fio condutor dessa vocação, o prazer e a necessidade de ser ético.
Como já pontuou o desembargador José Renato Nalini, ex-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, "ética é mais importante do que o conhecimento jurídico, que pode ser facilmente acessado, enquanto a primeira deve estar presente na cabeça e no coração."
Assim, preservar a memória do Poder Judiciário deveria também ser preservar a vocação e a ética de seus integrantes.
E para preservação desses dois pilares - vocação e ética - necessário respeitar a independência do julgador, o que resultará em atuações imparciais, de fato e de direito. No mundo do direito, não basta ser, deve parecer ser, como a mulher de César.
E essa independência do postulante ao cargo de julgador, assim como a vocação e a ética, é condição intrínseca da pessoa. Ou ela tem ou não tem. Simples assim!
A concorrência para um cargo público, como o de juiz, como sabemos, é grande. Mas toda dificuldade não justifica nenhum tipo de subserviência para alcançar seu objetivo. Isso lhe retira a independência, além de mostrar uma fraqueza de espírito do candidato.
Os órgãos responsáveis pelo recrutamento, nomeações ou indicações de magistrados e magistradas igualmente não devem estimular, como ocorre em muitas situações atuais, a subserviência de candidatos. Isso enfraquece a própria instituição responsável por prover as nomeações ou indicações e ajuda a destruir o Poder Judiciário, que deixará de contar em seus quadros com pessoas vocacionadas, éticas e independentes.
Essa tríade - vocação, ética e independência - deve ser considerada a base sólida de todo o Poder Judiciário. A valorização desses pontos é que deve nortear, dentro do possível, as nomeações e indicações dos ocupantes de cargos junto ao Poder Judiciário.
Não há mais espaço, e nunca deveria ter tido, para nomeações e indicações baseadas em compadrio, bajulação, troca de favores ou jogo puramente político. Todos os candidatos devem concorrer em igualdades de condição, sem distinção de qualquer natureza, preservando sempre um tratamento isonômico, ainda pouco visto em certas realidades. Também aqui, não basta dizer que é, deve parecer que seja!
Para cobrarmos um Poder Judiciário melhor, mais ágil e eficiente, temos que primeiro fazer nossa parte na construção dessa melhoria. E um ponto essencial é que as pessoas e órgãos responsáveis pelas indicações desses importantes agentes públicos privilegiem a vocação, a ética e a independência dos futuros integrantes do Poder Judiciário. Isso servirá para preservar a memória do Poder Judiciário e acima de tudo do Direito!
Renato de Mello Almada
Advogado, sócio de Chiarottino e Nicoletti - Advogados. Membro da 23ª Turma do TED/OAB-SP (2013/2020). Pós-graduado em Processo Civil e em Direito dos Animais. Membro associado do IBDFAM.