Acumulação de cargo ou emprego público: É possível?
É essencial que você fique atento quanto às regras e limitações de acumulação de cargos, os horários e a remuneração, para evitar problemas no futuro.
terça-feira, 9 de maio de 2023
Atualizado às 07:54
O servidor público pode acumular outro cargo ou emprego público. No entanto, existem regras previstas na Constituição Federal, pois, em alguns casos, a acumulação pode ser considerada ilegal e passível de penalidades.
No Brasil, a legislação sobre a acumulação de cargos públicos é complexa e varia conforme o tipo de cargo e a esfera de governo. Por isso, é fundamental que o servidor público conheça seus direitos e deveres em relação a esse tema.
Neste artigo, vou explicar as regras para acumulação de cargos públicos no país e quais são as exceções previstas na lei.
Quem se enquadra nas regras de acumulação de cargos?
São os servidores públicos com cargos, empregos ou funções na administração pública.
Ou seja, todos que mantêm vínculo de trabalho profissional com os órgãos e entidades governamentais, conforme abaixo:
- Integrados em cargos ou empregos da União;
- Estados;
- Distrito Federal;
- Municípios e suas respectivas autarquias;
- Fundações;
- Empresas públicas e sociedades de economia mista.
Em outras palavras, a acumulação ou cumulação de cargos se aplica às pessoas que trabalham na administração pública:
- direta (União, Estados ou Municípios e Distrito Federal); ou
- indireta (autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista e suas subsidiárias); ou
- sociedades controladas pelo poder público, direta ou indiretamente.
Servidor público: é possível acumular cargo ou emprego público?
Desde a Constituição Federal de 1988, houve limitação quanto à possibilidade de acumulação de cargos ou empregos públicos.
Atualmente, só é possível acumular cargos ou empregos públicos nas seguintes situações:
- dois cargos de professor;
- um cargo de professor com outro técnico ou científico;
- dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas;
- juiz, promotor ou procurador de Justiça, apenas com uma de magistério (professor).
Exemplos:
- Uma professora da Universidade de Brasília - UNB pode assumir outro cargo de professora na Universidade Federal de Goiás - UFG;
- Um juiz do Tribunal de Justiça de Goiás pode ter outro cargo de professor na Universidade Federal de Goiás - UFG.
Então, é essencial ficar atento a essas exceções.
Qual o limite para acumulação de cargos públicos?
Com base na Constituição Federal brasileira, o limite máximo é de dois vínculos com a administração pública.
Ainda, conforme a legislação, se tiver mais de dois contratos de trabalho, ainda que de médicos e/ou de magistério, caracteriza acumulação ilícita de cargos públicos.
Por fim, também existe limitação quanto ao teto da remuneração, que é o limite máximo que um servidor público pode receber em seus cargos, e que varia conforme a esfera governamental, conforme abaixo:
- na União, por exemplo, o teto é o subsídio mensal dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, que é o valor máximo que eles podem receber por mês;
- nos Estados e no Distrito Federal, a limitação varia de acordo com o órgão ou empresa pública;
- no âmbito do Poder Executivo, o limite é o subsídio mensal do Governador;
- no Poder Legislativo, o limite é o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais;
- no Poder Judiciário, o limite é o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça;
- nos municípios, o teto é o subsídio do Prefeito, ou seja, o valor máximo que ele pode receber mensalmente.
É importante destacar que o objetivo das limitações é evitar a acumulação excessiva de cargos públicos, além garantir que os servidores não recebam remunerações exacerbadas e/ou indevidas.
Tenho dois cargos públicos, posso ter um emprego privado?
Em regra, não existe nenhuma restrição em relação ao acúmulo de cargos públicos com emprego privado, mesmo que você já exerça dois cargos públicos.
Porém, reforço que é necessário cumprir os requisitos para a acumulação de cargos, incluindo as atividades e os horários compatíveis, incluindo os intervalos e o descanso entre as atividades.
E é preciso avaliar o eventual conflito de interesses entre ambos os cargos públicos e o emprego privado.
Por exemplo, advogados que atuam em defesa de pessoas com interesses conflitantes com a Administração Pública.
Acumular cargos públicos por mais de 60 horas semanais
É possível acumular cargos públicos mesmo que a carga horária ultrapasse 60 horas semanais, desde que cumpra os demais requisitos para a acumulação de cargos, incluindo as atividades e os horários compatíveis.
Sabemos que a nossa Constituição Federal trata sobre as exceções em que é possível a acumulação de cargos, mas não existe uma limitação de carga horária semanal ou mensal.
Na realidade, a Constituição fala que deve haver compatibilidade de horários, não que existe limite na jornada semanal de trabalho.
Dessa forma, não há problema nenhum em acumular cargos públicos que ultrapassam a carga horária semanal de 60 horas.
Por que existe essa confusão? Até o início de 2019, uma regra criada pela Advocacia-Geral da União (AGU) limitava a 60 horas semanais a jornada total no acúmulo de cargos públicos. Essa regra também era aplicada por vários Estados e Municípios.
Inclusive, com base nesse parecer da AGU, houve diversas penalidades de demissão em processos disciplinares. Por esse motivo foram iniciados vários processos na Justiça.
Como solicitar autorização para acumular cargos públicos?
Para acumular cargos públicos, é necessário que o servidor público solicite autorização prévia aos órgãos competentes.
O pedido deve ser feito por escrito e apresentado à chefia imediata de cada um dos órgãos em que o servidor pretende acumular cargos.
Além disso, é importante que o servidor verifique se os cargos que pretende acumular têm compatibilidade de horário.
A legislação estabelece que a jornada de trabalho do servidor não pode ultrapassar 60 horas semanais, e a carga horária de cada cargo não pode ser superior a 40 horas semanais.
Em alguns casos, a carga horária máxima permitida pode ser superior a 60 horas semanais, desde que haja compatibilidade de horários e que a carga horária não ultrapasse 80 horas semanais. São eles:
- cargos de professores;
- médicos; e
- profissionais da saúde.
Acumulação de cargos públicos em esferas diferentes de poder
A acumulação de cargos públicos também pode ocorrer em esferas diferentes de poder, ou seja, entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Nesses casos, as regras de compatibilidade de cargos e horários é mantida.
Exemplo:
- Um servidor que exerce cargo de professor na rede estadual pode acumular um cargo técnico-administrativo em uma universidade federal, desde que haja compatibilidade de horários e que as funções exercidas não sejam incompatíveis.
No entanto, é importante destacar que a acumulação de cargos públicos em esferas diferentes de poder é limitada pela Constituição Federal. Um servidor não pode acumular cargo em outro poder, exceto nos casos abaixo:
- professores;
- médicos; e
- profissionais de saúde.
Desvio de função no acúmulo de cargos
O desvio de função é um dos aspectos mais relevantes quando se trata da acumulação indevida de cargos públicos. Isso ocorre quando o servidor público é designado para exercer atividades diferentes daquelas que foram definidas no seu cargo original.
No caso de acúmulo de cargos, é preciso verificar se a nova atividade exercida pelo servidor público é compatível com as atribuições do seu cargo original.
Caso contrário, isso pode ser considerado desvio de função e gerar consequências graves para o servidor público, já que é uma prática proibida.
A exceção será quando o desvio de função ocorrer por pedido da Administração Pública, desde que o pedido seja temporário, ou seja, por um período determinado e tenha caráter de urgência.
Readaptação e o desvio de função
A readaptação é uma das possibilidades previstas pela legislação para que um servidor público possa se adequar a novas atividades dentro da mesma carreira.
É importante, entretanto, destacar que a readaptação não pode ser confundida com o desvio de função.
A readaptação é uma medida que visa preservar a saúde e a integridade do servidor público que esteja impossibilitado de exercer as atividades previstas em seu cargo original por motivos de saúde.
Já o desvio de função ocorre quando o servidor público é deslocado para exercer atividades diferentes daquelas que foram definidas em seu cargo original.
Direitos do servidor público desviado da função
Em decisão do STF, ficou determinado que o servidor desviado de sua função, ainda que não tenha direito a enquadramento, tem direito aos vencimentos correspondentes à função que foi desempenhada.
Além disso, a decisão relata que o servidor que está em desvio de função, tem direito:
- às férias e ao 13º salário do cargo desviado;
- às verbas das diferenças remuneratórias decorrentes do exercício desviado, relativo aos últimos cinco anos;
- e todos os direitos que um servidor daquele cargo tem, a fim de se evitar o enriquecimento ilícito por parte da administração pública.
No entanto, mais uma vez, desde que esteja a pedido da Administração Pública.
Penalidades da acumulação de cargos de forma indevida
Além da demissão, veja o que pode acontecer após ser comprovada a acumulação indevida de cargos:
- perda do cargo público;
- perda de bens (conforme o caso);
- suspensão temporária dos direitos políticos;
- ressarcimento de eventuais danos;
- pagamento de multa de até 100 vezes o valor dos salários recebidos;
- proibição de contratação com o poder público ou de recebimento de benefícios, ou incentivos fiscais, ou creditícios.
Para evitar problemas relacionados à acumulação de cargos públicos, é fundamental que os servidores públicos estejam sempre atentos às normas e legislações vigentes.
Acumular cargo público é improbidade?
A resposta é sim! Ao acumular um cargo público de forma indevida, além do processo disciplinar que pode levar à sua demissão, ainda pode ser aberto o processo judicial por improbidade administrativa.
A improbidade administrativa é o ato ilegal ou contrário aos princípios básicos da Administração Pública no Brasil, cometido por agente público, durante o exercício de função pública ou decorrente dela.
PAD - Processo administrativo disciplinar
O Processo administrativo disciplinar - PAD é o processo em que a Administração Pública se utiliza e pode chegar a punir os servidores pelas infrações funcionais praticadas por eles. Ou seja, infração cometida em sua função.
No PAD, existem três fases bem distintas. Em primeiro lugar, a fase da instauração em que, com a publicação da portaria, haverá a constituição da comissão que deverá analisar a infração do servidor.
A acumulação de cargos públicos é possível seguindo as regras impostas para o acúmulo de cargos e funções. No entanto, caso as regras não sejam cumpridas, não será possível acumular os cargos.
Contudo, é essencial que você fique atento quanto às regras e limitações de acumulação de cargos, os horários e a remuneração, para evitar problemas no futuro.
Agnaldo Bastos
Advogado atuante no Direito Administrativo, especialista em causas envolvendo concursos públicos e servidores públicos, Sócio Proprietário do escritório Agnaldo Bastos Advocacia Especializada.