Academia, assédio e boaventura
O assédio afronta ao corolário direto da dignidade da pessoa humana, constrangendo o assediado, na maioria dos casos assediadas, em situações intimidadoras.
segunda-feira, 24 de abril de 2023
Atualizado às 14:57
As relações interpessoais pautadas na hierarquia são catalisadoras do assédio. Na verdade, é um problema intimamente ligado à microfísica do poder. É uma decorrência direta da forma de estruturação das nossas interações de poder de comando. E, não aflige apenas mulheres, nem tem nos homens autores exclusivos, mas numa sociedade estruturada no machismo, teremos nas mulheres as vítimas mais frequentes.
O assédio é um problema "transversal" à sociedade em si. E, em alguns ambientes, como no meio acadêmico (escolas, faculdades e afins) e no trabalho, a prática é catalisada e se torna deveras comum. Logo, seu enfrentamento é complexo e há de ser multifatorial.
O assédio afronta ao corolário direto da dignidade da pessoa humana, constrangendo o assediado, na maioria dos casos assediadas, em situações intimidadoras. É uma triste e voraz realidade seja na academia, seja no ambiente laboral. O recente caso do professor Boaventura de Sousa Santos da Universidade de Coimbra (Portugal) lança luzes novamente sobre o velho problema.
As organizações precisam atentar para a implementação de um programa de compliance que delineie regras internas de tolerância zero com a prática. Não há mais como fechar os olhos seja para o assédio sexual, em que a vítima é intimidada com incitações sexuais inoportunas, ou para o assédio moral, aquele que submete alguém a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas no tempo.
O comprometimento das instituições com as pessoas que há compõe há de ser irredutível. O docente, importante pesquisador e escritor da área jurídica e social, é uma referência, inclusive em Direitos Humanos, sendo associado a uma prática tão nefasta. Uma pena!
Não cabe mais olhares lascivos, cantadas jocosas, um toque não consentindo ou elogios inadequados. As mulheres querem trabalhar e estudar em paz. Sem "brincadeiras" sobre a sua aparência. Há ambientes em que sermos medidas por nossa beleza constrange e incomoda, e, sim, essa atitude pode ser considerada assédio.
Casos assim, fomentam discussões relevantes sobre o assunto e isto é urgente e vital para podermos criar um amanhã com menos objetificação dos corpos femininos e o esperançar de uma masculinidade menos tóxica que não precisa ser provada por conquistas sem fim ou abuso do poder hierárquico.