TCU e a relicitação de contratos de concessão de aeroportos
Há um impasse sobre a questão dos aditivos que já foram assinados, pois existem concessionárias que querem deixar a administração do aeroporto e outras que querem continuar.
sexta-feira, 3 de março de 2023
Atualizado às 14:44
No início de 2023 o Tribunal de Contas da União deliberou sobre um importante assunto: processos de relicitação.
O caso específico avaliou a concessão do Aeroporto de São Gonçalo do Amarante (ASGA), no Rio Grande do Norte, oportunidade em que o TCU aprovou a relicitação, com algumas determinações à ANAC. Esse aeroporto fica a 30 km do centro de Natal/RN e o contrato de concessão pra exploração da infraestrutura aeroportuária foi assinado com o consórcio Inframérica, em 2011, com prazo de 28 anos.
O ASGA é o primeiro do país a passar pelo processo de relicitação1, mas a decisão pode impactar em outros aeroportos, como o de Viracopos (SP) e Galeão (RJ), que podem ser relicitados nos mesmos moldes.
Contudo, a aprovação foi com condicionantes, pois houve determinação de que, antes de efetivar o novo contrato, a Agência Nacional de Aviação Civil deve fazer ajustes no processo licitatório e encaminhar ao TCU o cálculo da indenização certificado por empresa de auditoria independente.
Além disso, o edital não deve exigir do vencedor, simultaneamente, a garantia da proposta comercial e a de execução contratual e, nas próximas relicitações, a ANAC não deve publicar o edital do novo leilão sem tornar público o valor de indenização aprovado pela diretoria do órgão regulador.
O Ministério da Infraestrutura defendia que a indenização deveria ser após o leilão, com a assinatura do contrato já com a nova administradora do aeroporto e não que o cálculo já estivesse pronto antes da publicação do edital.
Inclusive, foi negociada a inserção de uma emenda na MP do Voo Simples, aprovada em maio do ano passado pelo Congresso, que prevê que o cálculo de indenização e sua conferência não obstam o processo licitatório.
O ministro Aroldo Cedraz, relator do processo, ponderou que a incerteza do valor da indenização no certame fere a competitividade e restringe o interesse de futuros participantes, pois, "somente após conhecer o valor a ser indenizado ao antigo parceiro é que será possível definir se o lance vencedor do leilão será suficiente para cobrir a indenização devida ou se será necessário complementá-la com recursos federais".
Além disso, diante do princípio constitucional da isonomia, é indispensável que o valor da indenização (a ser paga ao antigo parceiro) conste do edital de licitação, para que cada um dos licitantes possa ponderar os riscos percebidos e apresentar as suas propostas comerciais em bases equânimes, trazendo mais segurança e previsibilidade para o certame.
Com isso, o TCU recomendou2 que, nas futuras relicitações, a ANAC se abstenha de publicar novo edital sem publicizar o valor da indenização aprovado pelo órgão e que haja um acompanhamento dos bens reversíveis não amortizados ou depreciados devida à concessionária.
Sobre a questão dos pagamentos, o TCU deu ciência ao Ministério de Portos e Aeroportos e à Anac de que é contrário à lei efetuar pagamento de parcela da indenização para a atual concessionária em momento posterior à celebração do futuro contrato, sem disponibilidade de recursos. No entanto, não se impediu que a parcela seja paga depois, desde que o valor esteja provisionado.
Como esse trabalho foi pioneiro, o TCU avaliará, nas futuras deliberações, os impactos que a MP do Voo simples trará para a lei das relicitações.
Há um impasse sobre a questão dos aditivos que já foram assinados, pois existem concessionárias que querem deixar a administração do aeroporto e outras que querem continuar. Então, algumas empresas optariam por sair do ativo somente quando o governo finalizasse o pagamento do valor da indenização por investimentos não amortizados.
O Ministério Público junto ao TCU emitiu um Parecer sobre o assunto, opinando que o novo trecho da lei de relicitações não desequilibraria aditivos de devolução de concessão já assinados entre governo e concessionárias.
Como alguns pedidos de relicitação foram feitos com base na lei anterior, caberá à área técnica do TCU verificar a temporalidade da lei, especialmente se abarca os casos de Viracopos e Galeão.
Será autuado um processo para cada pedido de relicitação, que passará pela avaliação técnica da unidade especializada, Parecer do Ministério Público junto ao TCU e posterior remessa ao Relator, para elaboração de voto e submissão aos demais Ministros do TCU.
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1 Com base na Lei 13.488/2017, que trata da prorrogação e relicitação nos setores rodoviário, ferroviário e aeroportuário.
2 O TCU tem 3 tipos de encaminhamentos: Determinação, Recomendação e Ciência. A determinação é uma imposição de providências concretas à entidade, que deve cumprir a deliberação, dentro de um prazo estabelecido, sob pena de incorrer em penalidades. A recomendação tem natureza colaborativa e se coloca como uma oportunidade de melhoria aos processos da entidade. Por fim, a ciência tem natureza declaratória, que visa dar conhecimento à entidade para prevenir futura irregularidade.