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CARF e o voto de qualidade

O voto de qualidade sempre se mostrou como um instituto contrário ao ordenamento jurídico do ponto de vista legal e constitucional e sob a ótica dos contribuintes, a insegurança jurídica já está instalada, a percepção que se tem é que a arrecadação é o que mais importa!

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

Atualizado às 14:07

Muito se tem falado da extinção do voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - CARF, mas afinal o que é isso e como isso impacta de forma negativa os contribuintes?

Pois bem, como prometido pelo novo governo, foi publicada Medida Provisória de 1160/23, que retoma o voto de qualidade no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), no qual os conselheiros, representantes da União (presidentes de turmas e câmaras) poderão exercer o voto do desempate.

No âmbito do processo administrativo federal, o CARF é um órgão colegiado e paritário, onde as turmas de julgamento são compostas de representantes dos contribuintes e representantes da Fazenda Nacional. O voto de qualidade, por sua vez, foi instituído pela MP 449/09, através da inclusão do § 9º no artigo 25 do decreto 70.235/721, como um critério escolhido pelo legislador em caso de empates nos respectivos julgamentos, e nesse caso, caberia o uso desse instituto.

A bem da verdade, esses votos acabavam sempre a favor da União em detrimento do contribuinte, mesmo com o dever de imparcialidade e neutralidade dos julgadores.E desde então, muito se discutiu a legalidade e constitucionalidade do voto de qualidade à luz do Código Tributário Nacional como o artigo 112 e também em relação aos dispositivos constitucionais como por exemplo o in dubio pro contribuinte, chegando a discussão no Supremo Tribunal Federal nas ADIs 6403, 6399 e 6415, mas sem resolução final até a presente data.

No ano de 2020 o voto de qualidade deixou de ser aplicado2, e para aqueles casos de empates, os julgamentos deveriam ser resolvidos em favor do contribuinte, mas sob a justificativa de necessidade de aumento na arrecadação tributária federal (já visando sempre que o voto seja em favor da União) o ministro Haddad informou o retorno do voto de qualidade, como de fato aconteceu.

A OAB nacional diante das imensas críticas direcionadas ao restabelecimento do voto de qualidade feita por toda a sociedade, apresentou recentemente a ADI registrada sob o 7347, onde se resume os seguintes pedidos:

"Na ação, é solicitado que, a partir da medida cautelar, seja adotada a regra vigente até a edição da MP 1.160, ou que fique suspensa a proclamação dos resultados de julgamento dos casos em que haja empate na votação, até que haja manifestação do Pleno do STF sobre a matéria, ou que o Congresso Nacional converta em lei a Medida Provisória impugnada. Até 12 de janeiro de 2023, quando passou a vigorar a MP 1.160, o critério de desempate dos julgamentos realizados no Carf era aplicado conforme regra estabelecida no art. 19-E da lei 10.522/02, a qual determina que "Em caso de empate no julgamento do processo administrativo de determinação e exigência do crédito tributário, não se aplica o voto de qualidade a que se refere o § 9º do art. 25 do decreto 70.235, de 6 de março de 1972 , resolvendo-se favoravelmente ao contribuinte".3

Assim, a OAB questiona a reinstituição do voto de qualidade e solicitou que nos casos de empate, haja solução favorável ao contribuinte, nos termos do artigo 112 do CTN. O pleito levou a reuniões entre a OAB , Ministério da Fazenda, Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e representantes dos grandes contribuintes para a resolução do impasse, inclusive com emissão de nota sob o encontro feita pelo ministro Toffoli.4

A solução noticiada é um acordo para que o voto de qualidade quando resolvido

favoravelmente à Fazenda Pública seja considerado alguns pressupostos, dentre eles estão: i) exclusão das multas, cancelamento a representação fiscal para fins penais, ii) exclusão dos juros, se o pagamento do débito se der no prazo de 90 dias, iii) possibilidade de parcelamento em até 12 vezes, iv) admitida a possibilidade de utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL, dentre outros

Espera-se que a solução desse impasse seja alcançada em nome da segurança jurídica, com a análise de todos os vieses, não somente do ponto de vista da União e sob a justificada de arrecadação, mas também do viés da segurança jurídica e previsibilidade ao contribuinte. A expectativa é o próximo passo seja a alteração no texto da MP pelo Congresso Nacional.

O descompasso entre a União e os Contribuintes vem se maximizando, colocando o contribuinte em situação de desvantagem nesse cenário de alta instabilidade e crescente carga tributária.

O voto de qualidade sempre se mostrou como um instituto contrário ao ordenamento jurídico do ponto de vista legal e constitucional e sob a ótica dos contribuintes, a insegurança jurídica já está instalada, a percepção que se tem é que a arrecadação é o que mais importa!

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1 Art. 25, § 9º Os cargos de Presidente das Turmas da Câmara Superior de Recursos Fiscais, das câmaras, das suas turmas e das turmas especiais serão ocupados por conselheiros representantes da Fazenda Nacional, que, em caso de empate, terão o voto de qualidade, e os cargos de Vice-Presidente, por representantes dos contribuintes. (Incluído pela Medida Provisória nº 449, de 2008)

2 Art. 28. A Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 19-E: "Art. 19-E. Em caso de empate no julgamento do processo administrativo de determinação e exigência do crédito tributário, não se aplica o voto de qualidade a que se refere o § 9º do art. 25 do Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972, resolvendo-se favoravelmente ao contribuinte

3 OAB Nacional vai ao STF contra MP que retoma voto de qualidade no CARF. Disponível em <https://www.oab.org.br/noticia/60670/oab-nacional-vai-ao-stf-contra-mp-que-retoma-voto-de-qualidade-no-carf> 

4 Nota sobre encontro do ministro Toffoli com ministro da Fazenda e OAB. Disponível em https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=502407&ori=1

Fábio Rodrigues Garcia

VIP Fábio Rodrigues Garcia

Sócio fundador da RGSA, coordena as áreas tributária e de recuperação judicial. Especialista em direito tributário pela PUC/SP, LL.M em Direito Empresarial pela AESE Business School Lisboa, Portugal

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