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Existe responsabilidade da instituição financeira do estelionatário nos casos de fraude pix?

A abertura de conta fraudulenta merece atenção especial dos bancos, que possuem o dever de adotar sistemas de segurança eficazes para minimizar as ocorrências de fraudes diariamente noticiadas pelos veículos de comunicação.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

Atualizado às 14:52

Os bancos têm o dever de adotar medidas de segurança nas transações via PIX. O pagamento só deve ser realizado, após a análise das devidas verificações de segurança dentro do que o banco central chama de motores antifraude.

A formação da relação jurídica via PIX com a instituição financeira do pagador e com a instituição financeira do recebedor e os seus deveres

A partir do momento que um consumidor realiza uma transação por meio do PIX, forma-se uma relação jurídica triangular (consumidor - banco pagador - banco recebedor) e essa relação quando é fruto de uma fraude, seja por subtração do celular, via whatsapp, via engenharia social, também chamada de "phishing"(sites falsos), código ou Qr code falso, dentre outras, requer tanto do banco do consumidor, quanto o banco que recebe a quantia, uma atuação de forma preventiva e repressiva no combate as situações de fraude.

Ou seja, tanto antes quanto após a realização da operação via PIX, a Resolução do BACEN 1/20, impõe expressamente às instituições financeiras o dever de rejeitar o pagamento quando houver situações de fundada suspeita de fraude (art. 38-A 99 e art. 39, I). Inclusive, as instituições financeiras deverão realizar o chamado bloqueio cautelar dos valores quando vislumbrar fraude, a qual é aferível a partir dos seguintes elementos fixados no art. 39-B da normativa do BACEN, como por exemplo: - a quantidade de notificações de infração vinculadas ao usuário recebedor, à sua chave Pix e ao número da sua conta transacional, o tempo decorrido desde a abertura da conta transacional pelo usuário recebedor; - o horário e o dia da realização da transação; o perfil do usuário pagador, inclusive em relação à recorrência de transações entre os usuários;

Destaca-se que o próprio Banco Central do Brasil argui:

''O Pix conta com "motores antifraude" operados pelas instituições que ofertam o serviço, que permitem identificar transações atípicas, fora de perfil do usuário, bloqueando para análise as transações suspeitas por até 30 minutos, durante o dia, ou 60 min a noite e rejeitando aquelas que não se confirmarem uma transação segura''.

Da responsabilidade da instituição financeira pela abertura de conta sem padrões de segurança

Por estar a relação jurídica neste caso regida pelo CDC, devem as instituições financeiras envolvidas, sempre primar pela segurança do consumidor, pois este é um objetivo da Política Nacional da Relação de Consumo (art. 4º, CDC), é um direito básico dos consumidores (art.6º, I, CDC) e, sem dúvidas, um dever do fornecedor de produtos e serviços (art. 12, §1º e 14, §1º do CDC).

No plano infralegal, o Conselho Monetário Nacional fixa que as instituições financeiras deverão, na contratação de operações e na prestação de serviços deverão assegurar ao consumidor a integridade, a confiabilidade, a segurança e a legitimidade das operações e serviços (Resolução CMN 3.694/09).

Nesse sentido, a instituição financeira que abriu a conta bancária utilizada pelo fraudador para a aplicação de múltiplos golpes, sem padrões mínimos de segurança, tem a sua responsabilidade caracterizada pela negligência na sua atuação, que gerou o evento danoso sofrido pelo consumidor, sendo clarividente  a sua responsabilização.

Interesse é o entendimento sumular do Tribunal de Justiça de São Paulo a respeito do assunto:

Enunciado 14: "Na utilização do PIX, havendo prática de delito ou fraude por terceiros, em caso de fortuito interno, a instituição financeira responde pelas indenizações por danos materiais e morais quando evidenciada a falha na prestação de serviços, falhas na segurança, bem como desrespeito ao perfil do correntista aplicáveis as Súmulas 297 e 479, bem como a tese relativa ao tema repetitivo 466, todas do STJ."

Sobre este assunto se colhe o seguinte precedente:

[...]tem-se que o BRB BANCO DE Brasília não adotou cautelas para abertura da conta corrente que serviu de instrumento para fraude via PIX, deixando de trazer para os autos prova de ação em conformidade com recomendações do BACEN, em especial confirmação do endereço. Violação do regulamento do PIX (art. 39, 88 e 89) na parte das cautelas e riscos das operações via PIX. Aplicação da Súmula nº 479 do Superior Tribunal de Justiça. Ressarcimento dos danos materiais no valor de R$ 1.500,00. Danos morais configurados. Montante indenizatório fixado em. R$ 8.000,00, que atenderá as funções compensatória. E inibitória. Precedentes da Turma julgadora e do TJSP. Ação julgada parcialmente procedente em segundo grau. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSP; AC tj; Ac. 16254911; Ribeirão Preto; Décima Segunda Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Alexandre David Malfatti; Julg. 22/11/22; DJESP 28/11/22; Pág. 1440)98

Conclusão

As instituições financeiras que normalmente nesse caso alegam que foi culpa exclusiva do consumidor, não estão isentas de responsabilização quando se omitem na proteção do consumidor nas relações bancárias. A abertura de conta fraudulenta merece atenção especial dos bancos, que possuem o dever de adotar sistemas de segurança eficazes para minimizar as ocorrências de fraudes diariamente noticiadas pelos veículos de comunicação.

Atribuir apenas ao consumidor a culpa pelo evento danoso é ferir além de todo contexto normativo explicitado, principalmente, a Constituição Federal em seu artigo 170, no qual expressa que, um dos princípios gerais da ordem econômica conforme os ditames de justiça social é a defesa do consumidor, que não pode ser visto como causador de um evento orquestrado por estelionatários que tiveram a seu lado, a negligência da instituição financeira na abertura de conta bancária.

Vale ressaltar, que todo caso concreto precisa ser analisado com devido cuidado e o consumidor após ser vítima da fraude PIX, precisa fazer o boletim de ocorrência, entrar em contato com o seu banco através do SAC solicitando a realização do MED (mecanismo especial de devolução), ou através das plataformas de defesa e proteção do consumidor, guardar o comprovante do PIX realizado, bem como o extrato bancário, dentre outras medidas que precisam ser realizadas, como a notificação também da instituição recebedora do PIX.

No procedimento para se buscar o ressarcimento da fraude sofrida via PIX, primeiramente de forma administrativa e não obtendo sucesso, em seguida, de forma judicial, é suma importância, o acompanhamento de um advogado especialista no tema, que irá orientar e atuar em defesa dos seus direitos, visando equilibrar a relação de consumo, naturalmente desequilibrada em face das instituições financeiras.

Éwerton Padilha

Éwerton Padilha

Advogado. Pós-Graduado em Direito Civil e Direito Processual Civil pela UCAM; Pós-Graduando na Lei Geral de Proteção de Dados; Especialista em Direito do Consumidor com foco no Direito bancário.

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