MIGALHAS DE PESO

  1. Home >
  2. De Peso >
  3. Migalhas de peso >
  4. O bom assistente técnico nas perícias judiciais de engenharia

O bom assistente técnico nas perícias judiciais de engenharia

É essencial que a perícia judicial de engenharia tenha assistente técnico para acompanhar a metodologia do perito e analisar diferentes pontos técnicos. Todavia, isto não o torna um "milagreiro".

sexta-feira, 27 de janeiro de 2023

Atualizado às 10:51

O assistente técnico, pela legislação, é aquele profissional contratado pela parte para participar da perícia judicial. Será o técnico que apresentará sua argumentação nas questões abordadas em perícia, além de evitar irregularidades na prova pericial realizada pelo então perito judicial.

Dentre os assistentes mais requisitados, estão aqueles que atuam nas perícias judiciais de engenharia civil, como nos casos que envolvem vícios construtivos, patologia da construção, danos e avarias entre vizinhos, avaliação de imóveis, dentre outros.

O assistente é de confiança da parte (cabe a esta arcar seus honorários) e atuará desde o estudo técnico das questões de engenharia envolvidas no processo, formulação dos quesitos a serem respondidos pelo perito, acompanhamento e argumentação em vistoria, análise do laudo pericial, emissão de parecer técnico e manifestações posteriores que se façam necessárias para esclarecer a lide.

É um trabalho que ocorre no âmbito judicial, diferente da "assistência técnica pós-obra" realizada por construtoras e incorporadoras no período de garantia.

E neste ponto é interessante ressaltar a importância do assistente técnico com vivência nas perícias, pois o tato em situações delicadas ou estressantes para os envolvidos pode auxiliar a contornar e direcionar para a melhor resolução do caso. E isto começa desde o estudo e formulação dos quesitos.

O assistente técnico experiente sabe que a quantidade e especificação dos quesitos terá impacto na proposta de honorários do perito judicial. Quesitos que exigem laboratório, como a retirada de testemunhos in loco e ensaio de resistência do concreto, devem ser apresentados se realmente houver a necessidade de se apurar este item. Uma perícia para valoração de um imóvel, por exemplo, dificilmente terá como imprescindível um ensaio desta natureza.

Deve-se analisar o processo detalhadamente antes de apresentar ao advogado quesitos com pouca ou nenhuma relevância a serem respondidos no laudo pericial, que só encarecerão os honorários do perito.

E isto, na visão do perito judicial, também é um assunto complicado. O Expert não pode simplesmente reprovar os quesitos formulados. O resultado são os casos em que, não raramente, ocorre a fuga da razoabilidade nos custos da prova pericial, com perícias que representariam a metade ou até ultrapassariam o montante em discussão.

Não é o perito que está propondo valores estratosféricos, mas os quesitos que não foram objetivos ou restritos a real necessidade. O assistente técnico deve contribuir e ser objetivo, pois do contrário trará mais problemas do que soluções para a discussão na prova pericial.

Durante a diligência deve mencionar e explicar seu ponto de vista, atuando sob a ética profissional, ou seja, não buscando convencer o perito com fundamentos técnicos inexistentes, questionáveis ou reprováveis, que sabidamente não se aplicariam à engenharia civil (ou à ciência).

Como em toda área, existem bons e maus profissionais. Existem bons e maus assistentes, bons peritos e outros lastimáveis. Existem também assistentes que detém melhor conhecimento técnico do que alguns peritos, porém é implícito que seu parecer não terá o mesmo peso do laudo, por ser este realizado sob o critério da equidistância e de confiança do juízo - ainda que venha ser um trabalho pouco fundamentado ou até mesmo inseguro.

De toda forma, o assistente dedicado estudará o processo, as técnicas ou metodologias aplicadas, normas da ABNT, boas práticas e disciplinas da engenharia envolvidas no assunto técnico do litígio, e explicará ao perito sua convicção técnica a respeito, que pode ser a mesma dele ou não. Um bom perito estará atento para fazer a leitura da alegação do assistente e considera-la consistente ou não.

E isto mostra como o assistente não pode ser um "milagreiro" da parte.

O assistente não pode prometer nada à parte, já que algumas questões técnicas que deram origem ao processo (como uma falha grosseira na obra, por exemplo) dificilmente poderão ser justificadas em perícia - tampouco os jurídicos, que não são de sua alçada.

O assistente precisa analisar as questões técnicas e ser transparente com a parte e o advogado. Muitos construtores pensam ser possível justificar erros notórios ou de fácil percepção como sendo "normais de qualquer obra" ou decorrentes de "falha de manutenção", o que nem sempre se aplica. Por outro lado, alguns proprietários pensam que uma simples "fissura de reboco" é argumento suficiente para buscar redibir contrato.

O ideal é o assistente experiente explicar como um "perito médio" consideraria os fatos em discussão, sem rodeios e ou falsas esperanças. Ele identifica os pontos relevantes à perícia dentro do processo para propor quesitos que melhor atendam, mas a perícia não é uma ciência exata com resultados 100% precisos e previsíveis, pois envolve a convicção de outro profissional, e muitos casos subjetividade.

Na perícia judicial, o bom assistente buscará as melhores alternativas que justifiquem dentro da ética e das boas regras das perícias. Se o profissional é de confiança do construtor que errou na obra, buscará entender o que causou, se caberia considerar como algo tolerável ou não às normativas e, se for o caso, buscar as técnicas de correções que representem boas práticas de engenharia e que terão resultado satisfatório. Na engenharia podemos ter mais de uma técnica diferente para resolver o mesmo problema. O trabalho pode buscar as técnicas viáveis e exequíveis com respaldo e, havendo boa fundamentação, o perito poderá concordar com a alternativa.

Depois de protocolado o laudo pericial, as partes são intimadas para se manifestarem acerca das conclusões periciais, e é quando os assistentes técnicos serão informados, geralmente pelo advogado da parte, para interpretar e apresentar seu parecer técnico do laudo.

Pode-se apresentar um parecer "concordante" ao laudo pericial, em que o assistente concorda com as conclusões da perícia, eventualmente complementando informações, ou um parecer "parcialmente concordante", no qual existem pontos de divergência, ainda que outros aspectos possam atingir a mesma conclusão do perito. Pode-se ainda apresentar um parecer "discordante", no qual preponderantemente as conclusões do perito, segundo a fundamentação do assistente, estariam equivocadas ou baseadas em erro. E aqui existe outro comentário importante a fazermos.

O fato do engenheiro ou arquiteto ter sido nomeado indica que é de confiança do juízo e equidistante das partes, mas não significa que, necessariamente, detenha mais conhecimento ou que realiza trabalho melhor fundamentado do que algum dos assistentes.

Um bom perito de engenharia busca olhar todas as possibilidades, desde um assistente que apresenta conclusão que se mostra justa e correta, a qual demanda retificar um laudo pericial, bem como demonstrar fundamentalmente que o assistente está buscando alegações sem respaldo técnico. Várias vezes abordamos a "mera questão da opinião" e a sua diferença com o "fundamento normativo", pois opinião cada profissional tem a sua, mas norma técnica é a referência principal de todos.

Apresentados os esclarecimentos pelo perito depois dos pareceres dos assistentes, podem ser necessárias novas manifestações, que consequentemente trazem novos esclarecimentos do perito. De forma geral, esta segunda rodada de debate técnico basta para ajustar pontos imprecisos, porém se permanecerem fundadas dúvidas quanto ao trabalho, poderão ocorrer novas manifestações dos assistentes, com o perito sendo novamente intimado a responder. Até que o vai-e-volta seja interrompido ou encerrado e dado prosseguimento ao processo.

O assistente técnico é de confiança da parte, será o olhar dela durante a perícia, mas deve atuar como um profissional realista e ético para o cliente. Prometer "milagres" ou teses técnicas que sabidamente serão rechaçadas pelo perito trará apenas mais desgaste para a parte envolvida.

Um bom assistente, com notório conhecimento e experiência na engenharia legal, costuma contribuir para que o advogado compreenda um possível resultado técnico da perícia antes mesmo da realização desta, possibilitando buscar alternativas para o caso.

Roger Teixeira

VIP Roger Teixeira

Engenheiro civil pós-graduado em Patologia das Construções e em Perícias e Ciências Forenses, corriqueiro perito judicial, assistente técnico e autor de livros na área de perícias.

AUTORES MIGALHAS

Busque pelo nome ou parte do nome do autor para encontrar publicações no Portal Migalhas.

Busca