Da possibilidade jurídica de extinguir débitos não pagos para empresas
Assim, respondendo ao ponto do título da matéria, é sim possível conseguir o cancelamento de um débito com o fisco, mesmo que processado judicialmente.
terça-feira, 6 de dezembro de 2022
Atualizado às 08:17
É muito comum no meu dia a dia, escutar de empresários que acabaram se enrolando com a carga tributária do nosso país e que acabam encerrando as atividades empresariais, permanecendo com saldo devedor junto ao Fisco.
Bem, antes de mais nada, preciso dizer que isso acontece em 9 de cada 10 pessoas que atendo.
Costuma iniciar respondendo que o governo joga pesado, assim como Grandes Bancos que fazem de tudo, processos, bloqueio de bens, indisponibilidades etc... mas que com os bancos, após identificar o tamanho do problema, acabamos conseguindo uma boa negociação e esse mesmo desejo os empresários sonham em ter junto ao FISCO.
Nesses atendimentos, consigo observar as expressões faciais dos clientes quando se surpreendem quando explico que isso é possível de acontecer.
Existe um direito no Brasil, similar ao que acontece em outros lugares no mundo, que são reconhecidas como formas de extinção de débitos tributários, com expressa disposição no Código Tributário Nacional (CTN), em seu art. 156.
Art. 156. Extinguem o crédito tributário:
I - o pagamento;
II - a compensação;
III - a transação;
IV - remissão;
V - a prescrição e a decadência;
VI - a conversão de depósito em renda;
VII - o pagamento antecipado e a homologação do lançamento nos termos do disposto no art. 150 e seus §§ 1º e 4º;
VIII - a consignação em pagamento, nos termos do disposto no § 2º do art. 164;
X - a decisão administrativa irreformável, assim entendida a definitiva na órbita administrativa, que não mais possa ser objeto de ação anulatória;
X - a decisão judicial passada em julgado.
XI - a dação em pagamento em bens imóveis, na forma e condições estabelecidas em lei. (Incluído pela Lcp 104, de 2001) (Vide lei 13.259, de 2016)
O ponto em destaque aqui é a PRESCRIÇÃO e a DECADÊNCIA, que como o próprio caput diz, são uma das formas de extinção/cancelamento de débitos tributários.
Note que o Governo/FISCO quer receber a todo custo, as acaba encontrando no próprio Poder Judiciário, o limitador desse desejo frenético, já que não existe interesse da Justiça que os processos se tornem perpétuos, e assim como as dívidas de natureza civil podem ser extintas, caso não sejam tomadas medidas judiciais ou extrajudiciais para seu recebimento, isso pode ocorrer nas de natureza tributária.
Hoje quero falar com você, sobre uma dessas possibilidades, na verdade, quero falar sobre uma específica que acontece DURANTE O PROCESSO JUDICIAL, a que denominamos PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE.
Por definição, temos por PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE, segundo os doutrinadores:
"A prescrição intercorrente é modo de extinção do crédito tributário criado pela tradição jurídica brasileira (sob influxo da jurisprudência e da doutrina) e positivado em lei, no § 4º do art. 40 da LEF (por força do advento da Lei 11.051/04, vigente em 30/12/2004). Trata-se de contagem do prazo da prescrição ordinária, aquela regulada no art. 174 do CTN, no curso do processo de execução fiscal. Assim, primeiro tem-se a prescrição ordinária, aquela que se inicia com a constituição definitiva do crédito tributário e é interrompida pelo despacho que determina a citação, conforme art. 174, inciso I, CTN. Enquanto não houver interrupção do prazo, o que se tem é a consumação da prescrição ordinária, o que era bastante comum quando a interrupção da prescrição se dava apenas com a citação, gerando acórdãos com dificuldade na distinção, reconhecendo a prescrição intercorrente quando o caso, na verdade, era de prescrição ordinária. A razão prática para a criação do instituto está na suspensão sine diedo processo diante da não localização do devedor ou de bens penhoráveis. O fundamento é buscado no princípio da segurança jurídica, na raiz do qual está a repulsa à infinitude de situações pendentes. Além disso, contraria a própria natureza do processo que fique suspenso indefinidamente, ad aeternum. Isso não significa que o processo não possa se prolongar no tempo, com sói acontecer por motivos vários, mas que esse prolongamento se dê pela realização de atos úteis para que o processo atinja o seu termo. O processo existe para chegar a um fim, para atingir seu escopo. O fim do processo executivo é a satisfação do crédito do exequente. Mas a busca desse fim só se justifica na medida em que se praticam atos processuais que potencialmente conduzam para esse fim (utilidade). Na medida em que não há mais atos úteis no sentido da localização de bens de devedor, o processo executivo está fadado ao insucesso, está virtualmente impossibilitado de alcançar seu escopo. Precisa, pois, ser extinto, tendo ou não, alcançado o fim a que originariamente serve (o processo executivo)" (Execução Fiscal Aplicada. Análise pragmática dos processos de execução fiscal. Coodenador: João Aurino de Melo Filho. 3º ed. revista, ampliada e atualizada. Editora Juspodium, Salvador, 2014, pp. 498/499).
Em uma definição mais leiga, representa aquela que acontece durante o processo.
Ela acontece todas as vezes em que o FISCO não consegue localizar bens sujeitos a penhora do EXECUTADO, ou encontra em quantia ínfima, fica sendo autorizado a possibilidade desse débito ser cancelado.
Em termos práticos, no pensar do FISCO, daria tanto trabalho, e seria DISPENDIOSO para o FISCO empreender esforços em receber um débito ANTIGO, onde os meios tradicionais de recebimento, não existem ou foram esgotados, e aguardar estatisticamente falando traz poucas possibilidades de recebimento.
É bem verdade que o FISCO atualmente possui ferramentas modernas e um pouco mais eficientes para encontrar e dilapidar segredos que os empresários tentam esconder, tais como SNIPER (Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos) e SIMBA (Sistema de Investigação de Movimentações Bancárias), mas esse pode ser um tema para outro artigo.
A base desse raciocínio está escondida pelo fisco na lei 6.830/80 (Lei de Execuções Fiscais - LEF), assim como em outros instrumentos, tais como a lei. 13.988/20 (regulamentada pela Portaria da PGFN 8.798/2022) que trata de débitos irrecuperáveis ou de difícil recuperação e Súmula Administrativa 59 da AGU de 08 de dezembro de 2011.
Como maneira de entregar esse ponto, de maneira mais clara possível, vou transcrever um julgado recente que demonstra exatamente essa hipótese do caso:
Assim, respondendo ao ponto do título da matéria, é sim possível conseguir o cancelamento de um débito com o fisco, mesmo que processado judicialmente.
Julio Benvindo
Advogado há mais de 14 anos, atuando na defesa de empresas endividadas, conseguindo criar estratégias para soerguimento de empresários.