Fraudes bancárias: O empréstimo de conta corrente e a responsabilização civil pelo ato ilícito
Que mesmo que não haja culpa por parte do "recebedor" dos valores, o mesmo pode ser responsabilizado até a concorrente quantia que recebeu, ou, por vezes, recebeu e repassou para outrem.
segunda-feira, 31 de outubro de 2022
Atualizado às 14:03
De acordo com a FOLHA, com a implementação do sistema PIX, houve aumento exponencial das fraudes bancárias, além de sequestros-relâmpagos, que tiveram um crescimento de 40% em 2021. Em números concretos, houve 42 casos no ano de 2021.
Tal crescimento decorre da utilização do sistema PIX por criminosos, que utilizam-se de contas laranjas para pulverizar o dinheiro das vítimas rapidamente, dificultando eventual bloqueio e repatriação de recursos por parte da Instituição Financeira.
As contas laranjas são contas bancárias abertas por criminosos em nome de outras pessoas, ou, por vezes, o próprio titular da conta corrente realiza o empréstimo de sua conta corrente para que seja possível receber os valores oriundos de atos ilícitos, permitindo que o valor seja repassado para outras contas ou sacado nos caixas eletrônicos, o que de fato, dificulta a rastreabilidade do dinheiro e sua respectiva recuperação.
Os titulares realizam o empréstimo de suas contas em troca do recebimento de uma "comissão", o que por vezes, gira em torno de 10% do valor transacionado¹. Desta forma, criou-se um mercado ilegal de aluguel de contas bancárias, que impulsionam uma série de crimes.
Muitos titulares que emprestam suas respectivas contas, alegam à autoridade policial que precisavam do dinheiro e que não sabiam que a conta seria utilizada pela fins ilícitos.
O que não sabem é que o empréstimo de sua conta pode acarretar sua responsabilidade civil e criminal.
Neste artigo, versaremos tão somente sobre a responsabilidade civil dos titulares "laranjas".
Pois bem.
O titular "laranja" que realizada a cessão de sua conta para que criminosos transacionem valores oriundos de atos ilícitos, também é responsável pela reparação civil, mesmo que tenha o feito sem receber nada em contrapartida.
É o que preconiza o Art. 932, V do Código Civil:
Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
V - os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia.
Se os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, quem dirá o laranja que recebe sua "comissão" para transacionar tais valores.
Sua responsabilidade é uma combinação decorrente dos Artigos 884, 186, 927 e 933, todos do Código Civil.
Em suma, os artigos supramencionados tipificam os atos ilícitos, o dever de reparação e a vedação do enriquecimento sem causa.
O Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em recentíssimos julgados ressaltou a responsabilização do recebedor dos valores ilícitos em sua conta corrente, senão vejamos:
INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - Fraude sofrida pelo autor ao efetuar depósito em conta corrente a mando de terceiro para intermediação da venda de títulos de hotéis - Pagamento realizado para adiantamento das despesas do cartório e dos honorários de corretagem - Fraude - Depósito realizado na conta da ré, que não tinha ciência de sua origem - Ônus da prova a cargo da ré (art.333, II, CPC), que deveria demonstrar a causa do negócio jurídico que justificou o benefício dos valores depositados - Tese exposta na contestação que não convence - Enriquecimento sem causa inequívoco - Devolução dos valores devida, a teor do que prevê o art.932, V c.c. art.933 do CC - Danos morais não configurados - Sentença reformada - Recurso provido em parte.
(TJSP; Apelação Cível 0000130-78.2009.8.26.0582; Relator (a): Fábio Podestá; Órgão Julgador: 5ª Câmara de Direito Privado; Foro de São Miguel Arcanjo - Vara Única; Data do Julgamento: 22/01/2014; Data de Registro: 30/01/2014)
RESPONSABILIDADE CIVIL - Pretensão da autora em ver os demandados condenados na restituição de valores indevidamente subtraídos de sua conta corrente - Fraude na emissão de cheques praticada pela corré Mônica, filha do apelante - Sentença que julgou parcialmente procedente o pedido - Insurgência do recorrente sustentando que não praticara qualquer ato ilícito - Corré que confessou ter emitidos os cheques - Laudo pericial contábil hígido e não atacado especificamente, que concluiu ter havido subtração de R$ 67.484,82, sem demonstração da devolução de quaisquer valores à autora - Obrigação que se estende ao apelante, haja vista sua participação no produto do crime (art. 932, V, do CC) - Responsabilidade solidária do recorrente limitada ao valor de R$ 12.142,61, referente aos quatro cheques depositados em sua conta bancária - Recurso parcialmente provido para esse fim.
(TJSP; Apelação Cível 0006390-83.2013.8.26.0566; Relator (a): Mendes Pereira; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Privado; Foro de São Carlos - 5ª. Vara Cível; Data do Julgamento: 10/08/2017; Data de Registro: 10/08/2017)
Desta forma, conclui-se que mesmo que não haja culpa por parte do "recebedor" dos valores, o mesmo pode ser responsabilizado até a concorrente quantia que recebeu, ou, por vezes, recebeu e repassou para outrem.
Por isso, nunca realizem o empréstimo de sua conta corrente para recebimento de valores de origem desconhecida ou até mesmo em troca de comissões sobre os valores transacionados.
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https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2021/09/pessoas-alugam-suas-contas-para-criminosos-que-recebem-nelas-pix-por-sequestros.shtml