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Mandado de Segurança no CRPS - Conselho de Recursos da Previdência Social (Portaria 3.076/22)

A Portaria 3.076/22 alterou as rotinas administrativas do Conselho de Recursos da Previdência Social - CRPS em relação ao recebimento e processamento de mandados de segurança contra o órgão.

quarta-feira, 5 de outubro de 2022

Atualizado às 09:21

Em 29/9/22 foi publicada a Portaria CRPS/SPREVMTP 3.076/22, que alterou diversas rotinas administrativas do CRPS em razão do recebimento e cumprimento de mandados de segurança em face desse órgão.

O primeiro ponto relevante encontra-se no art. 8º, que revogou a Portaria 2.412 CRPS/MTP, de 3 de agosto de 2022, a qual proibia realização de sustentação oral nos julgamentos de recursos administrativos em que tivesse havido impetração de mandado de segurança para obrigar a respectiva turma julgadora a analisar o recurso em prazo razoável.

Fez-se bem na revogação da Portaria 2.412 CRPS/MTP.

Além de trazer medida francamente retaliatória aos cidadãos e advogados que tivessem se valido do mandado de segurança - remédio com assento constitucional para a correção de ilegalidades praticadas pela Administração Pública - referida portaria padecia de flagrante ilegalidade e inconstitucionalidade.

Com efeito, sofria de inconstitucionalidade por configurar afronta ao acesso à justiça (art. 5º, inciso XXXV), bem como configurar diminuição do próprio instrumento constitucional do mandado de segurança (art. 5º, LXIX), além de afrontar a concepção de que a Advocacia é indispensável à administração da Justiça (art. 133, todos do Texto Constitucional).

Além disso, a Portaria 2.412 CRPS/MTP perpetrava diversas ilegalidades, seja no campo do Processo Civil, a exemplo de ir contra a ideia de cooperação entre todas as partes envolvidas no processo (art. 6º, do CPC), seja em relação ao Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (lei 8.906/94), a exemplo da disposição que permite aos advogados e advogadas falar para órgão de deliberação coletiva da Administração (art. 7º, inciso XII do EOAB).

Portanto, andou bem o art. 8º da Portaria CRPS 3.076/22.

Por outro lado, tem-se que a Portaria CRPS 3.076/22 trouxe diversas alterações procedimentais oportunas e outras que merecem atenção. Vamos a elas.

O primeiro aspecto, digno de elogios, é a criação de uma equipe específica direcionada ao atendimento de decisões judiciais em sede de mandado de segurança:

Art. 1º Fica instituída a equipe de recebimento, processamento e tratamento das intimações e determinações judiciais em sede de Mandado de Segurança no Conselho de Recursos da Previdência Social.

Parágrafo único: Os integrantes da equipe terão dedicação exclusiva, competindo-lhes analisar previamente o conteúdo das intimações e determinações judiciais endereçadas ao Conselho e, após isso, encaminhá-las às Unidades Julgadoras para o seu cumprimento.

Esse tipo de arranjo interno costuma ser bastante producente e eficaz, de sorte que se espera que o CRPS passe a ter mais agilidade e eficiência (conforme caput do art. 37 da Constituição Federal) no atendimento aos mandados de segurança que lhe forem direcionados.

De outra parte, o art. 2º determina a prioridade de inclusão em pauta de julgamento dos recursos administrativos objeto deste tipo de mandamus, dando preferência ainda mais urgente àqueles em que tenha sido fixada multa cominatória:

Art. 2º Recebida as intimações ou determinações judiciais, caberá à Unidade Julgadora incluir, de imediato, o recurso administrativo objeto da demanda judicial em pauta para julgamento, observado, em qualquer caso, a prioridade de inclusão daqueles em que esteja fixada multa em face da autoridade coatora.

§ 1º Os recursos administrativos objeto de mandados de segurança serão julgados de maneira prioritária e no estado em que se encontram, a partir das provas e elementos deles constantes.

§ 2º Nos recursos administrativos, objeto de Mandados de Segurança, o recorrente deverá manifestar sua intenção de desistência, de maneira expressa, por petição ou, ainda, mediante termo firmado nos autos, até antes do início do julgamento.

Questiona-se a disposição do art. 2º, § 1º, em que se estabelece que os recursos administrativos objeto de mandados de segurança serão julgados no estado em que se encontram, a partir das provas e elementos deles constantes.

Esta disposição, a priori, parece adequada, mas impede que ocorra o saneamento do recurso administrativo ou a tomada de alguma diligência, a exemplo do esclarecimento de alguma situação mediante ofício a outros órgãos públicos.

O art. 2º, § 2º, também causa perplexidade.

Apesar da precária redação do dispositivo da Portaria, vislumbra-se que exige a desistência do mandado de segurança no caso dos recursos administrativos que já tenham sido incluídos em pauta de julgamento.

Ora, tem-se aqui evidente inconstitucionalidade, em razão de óbice ao acesso à justiça (art. 5º, inciso XXXV) e por afronta ao próprio instituto do mandado de segurança (art. 5º, LXIX).

Como já se indicou acima, o mandado de segurança consiste em um remédio processual, com assento na própria Constituição Federal, cujo escopo é a eliminação de situações contrárias ao Direito que estejam ou virão a ser praticadas pela Administração Pública. Segundo André Ramos Tavares:

"A Constituição de 1988, ao contemplar o mandado de segurança, orienta-o, inequivocamente, para a proteção de direito líquido e certo violado ou a ser violado por ilegalidade ou abuso de poder por parte de autoridade pública ou equiparado. Esses elementos constitucionais não podem sofrer restrições ou vedações criadas por lei.

(...)

O mandado de segurança deve realizar-se na sua grandeza constitucional, e jamais sucumbir a pretensões minimalistas e reducionistas que o legislador vier a estabelecer. É essa a diretriz constitucional que há de prevalecer para a leitura de qualquer legislação que trate de disciplinar o mandado de segurança."

(Manual do novo Mandado de Segurança, Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 22)

Nesse sentido, se nem mesmo ao legislador é viável diminuir o alcance do mandado de segurança, que dirá do administrador, cujo poder regulamentar é submisso à legalidade, nos termos do art. 84, inciso IV, da Constituição Federal.

Assim, exigir aos segurados que realizem a desistência do processo de mandado de segurança em virtude da simples notícia de inclusão do recurso administrativo na pauta de julgamentos do CRPS corresponde a anular a eficácia e o escopo deste remédio constitucional.

Apenas após a realização do julgamento do recurso administrativo pelo CRPS e comunicação do respectivo resultado ao Poder Judiciário é que se verificará a perda de objeto do mandamus¸ e somente então este processo poderá ser extinto sem exame de mérito, nos termos do art. 485, inciso VI, do CPC, por perda de interesse processual.

Neste ponto específico do art. 2º, § 2º, a Portaria 3.076/22 parece retomar a perspectiva retaliativa que era o cerne da Portaria 2.412/22 - que proibia as sustentações orais nos recursos administrativos objeto de mandado de segurança para julgamento em tempo razoável.

O art. 3º da Portaria 3.076 traz as atribuições dos Presidentes das Unidades Julgadoras:

Art. 3º Compete aos Presidentes das Unidades Julgadoras:

I - Acompanhar e orientar os Conselheiros Julgadores de sua unidade, para que concluam o processo administrativo objeto de eventual intimação ou determinação judicial dentro do prazo fixado pelo Juízo;

II - Acompanhar e orientar sua secretaria/NGP a fim de que sejam distribuídos, de forma proporcional e aleatória, entre todos os seus conselheiros, os recursos administrativos objeto de intimações e determinações judiciais;

III - Cadastrar previamente os seus Conselheiros Julgadores e servidores junto aos respectivos cadastros e sistemas da justiça, mediante a emissão de certificado digital, vedada qualquer outra forma de comunicação com o Poder Judiciário;

IV - Distribuir, aleatoriamente, aos seus Conselheiros Julgadores, as demandas judiciais recebidas;

V - Juntar aos autos do Processo Judicial Eletrônico as peças necessárias ao andamento do processo;

VI - Prestar as informações solicitadas pelo Poder Judiciário ou pela Advocacia Geral da União, diretamente nos sistemas informatizados da Justiça, dando-lhes ciência das providências adotadas; e.

VII - Zelar pela observância aos prazos fixados pelo Juízo.

Em complemento, o art. 4º estabelece as atribuições dos Conselheiros julgadores:

Art. 4º Compete aos Conselheiros Julgadores integrantes das unidades julgadoras:

I - Conferir celeridade aos recursos administrativos objeto de intimações ou determinações judiciais, dando-lhes integral cumprimento;

II - Cumprir as intimações e determinações judiciais nos prazos fixados;

III - Solicitar ao Presidente de sua Unidade a abertura de sessão extraordinária para o atendimento das demandas objeto desta

IV - Após do julgamento do recurso administrativo objeto de Mandado de Segurança, incluí-lo, em até 24 horas, no e-Sisrec.

Parágrafo Único: Nos casos de intimações ou determinações judiciais que constituam obrigação de fazer em face do Conselho, caberá ao Conselheiro Julgador, de imediato, a avocação de processos administrativos em diligência, ainda que em poder de órgãos técnicos ou periciais e independentemente de sua análise ou conclusão, julgando-os a partir dos elementos e provas constantes dos autos.

O art. 5º estabelece a obrigatoriedade de comunicação do julgamento prioritário ao Poder Judiciário:

Art. 5º Recebido o mandado de segurança pelo Presidente da Unidade Julgadora, com ordem para julgamento, deverá informar de imediato ao Poder Judiciário a data em que será julgado o respectivo recurso administrativo ou a impossibilidade de fazê-lo dada as circunstâncias administrativas ao específico caso, pautando o recurso para o mesmo mês, quando possível, ainda que em seção extraordinária, informando novamente o resultado da decisão colegiada.

Parágrafo único: Uma vez o processo retirado de pauta, tal conduta deve ser informada de imediato ao juízo federal respectivo.

As inovações trazidas pela Portaria 3.076/22 do CRPS, apesar das críticas pontuais indicadas, constituem inovações importantes que visam à boa relação entre os Poderes Executivo e Judiciário, no sentido da necessária cooperação entre as partes (art. 6º, do CPC).

Ademais, atende aos novos primados que norteiam a Administração Pública moderna: a eficiência no atendimento dos interesses e direitos do cidadão; a legitimidade da atuação, mais do que a mera legalidade; a boa-fé e lealdade na conduta, todos indicativos da chamada boa governança da Administração.

Marco Aurélio Serau Junior

Marco Aurélio Serau Junior

Diretor Científico do IEPREV - Instituto de Estudos Previdenciários.

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