Lógica: a ética elementar da argumentação
Todo e qualquer exercício abusivo de poder tem como cúmplice originário alguma modalidade de erro cometido pelo pensamento não só contra as leis, mas, também, contra as suas próprias leis. A lógica é ética mais elementar da argumentação. Antes, a lógica, em certa medida, é ética primeira no exercício da razão.
quinta-feira, 29 de setembro de 2022
Atualizado às 14:09
Segurança e certeza da liberdade, no Direito, pouco ou nada importam, quando não conseguem proteger o indivíduo contra o furor arbitrário no exercício dos poderes.
Sobre os Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) já sempre se sabe que tendem ao excesso, inclusive quando se omitem.
Todos os poderes têm as suas respectivas compulsões, para cuja prevenção não bastam tão só os clássicos freios e contrapesos.
Sem doses mínimas de autocontenção racional, até doses máximas de hétero-contenção jurídico-procedimental fracassam.
Certo, ainda não há consenso sobre se existe uma única fonte comum tóxica, em cujo manancial todas as formas de abuso tenham origem.
Mas minha intuição, num convite ao diálogo, arrisca a hipótese de que essa fonte primária e comum exista. E, na procura do elo invisível entre todos os abusos, meu pensamento sempre se volta e retorna ao pensamento mesmo e à rebeldia de seus hábitos e desvios incontinentes.
Salvo engano, todo e qualquer ato abusivo, como toda e qualquer forma de violência, tem como cúmplice originário algum tipo de erro cometido pelo pensamento, a um só tempo, contra as leis e contra as suas próprias leis.
A lógica é a ética mais elementar da argumentação.
Em certa medida, a lógica é a ética primeira no exercício da razão.
No campo especial dos argumentos jurídicos, para abusar das leis, os abusos, quase sempre, abusam, antes, das leis da lógica, que são idôneas sentinelas de racionalidade.
Sentimento e vontade até podem fornecer as motivações precursoras para o crime. Mas a arma letal é sempre alguma modalidade falaz de raciocínio.
Quase todo abuso de poder sempre materializa e põe em movimento, sobretudo no plano institucional, uma ou várias falácias engajadas. Difícil imaginar um eventual abuso que não coprotagonize algum impulso desarticulado, em que a razão se desencontra de si mesma e da realidade, sobretudo normativa.
As falácias não passam de violências que o pensamento comete contra a razão.
Por isso, a regra de ouro, em qualquer sistema normativo, regra que deve atuar, a um só tempo, como condição ética e racional de inteligibilidade do sistema, é a do esforço para pensar bem, pensar com rigor, pensar corretamente - prevenindo falácias e dogmatismos.
Onde não há falácias, nem dogmatismos, também não costuma haver nem autoritários, nem abusos.
A razão é sempre a primeira vítima de ambos.