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O sujeito ativo no crime de gestão fraudulenta de instituição financeira (lei 7.492/86)

Para a correta interpretação desse disposto legal e medição de suas consequências jurídicas, parece ser importante classificar os crimes inscritos no referido artigo a partir do sujeito que pode realizar o delito.

sexta-feira, 2 de setembro de 2022

Atualizado em 5 de setembro de 2022 13:05

Os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional estão disciplinados na lei 7.492/86. Tal diploma visa a proteger, como bem jurídico, o SFN, ou seja, o conjunto de órgãos públicos e privados que regulamenta, fiscaliza e executa as operações necessárias à circulação da moeda e do crédito na economia.

O art. 4 dessa lei dispõe:

Art. 4 Gerir fraudulentamente instituição financeira:

Pena - reclusão, de 3 (três) a 12 (doze) anos e multa.

Parágrafo único. Se a gestão é temerária:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa.

Para a correta interpretação desse disposto legal e medição de suas consequências jurídicas, parece ser importante classificar os crimes inscritos no referido artigo a partir do sujeito que pode realizar o delito.

A determinação do sujeito ativo do art. 4 da lei 7.492/86 não é apenas doutrinária, mas tem implicações práticas bem relevantes, pois, no fim, tem como consequência necessária da classificação quanto ao sujeito do delito, a possibilidade de configuração de participação ou coautoria nas condutas tipificadas.

Cabe definir, pois, se estamos diante de crime comum, crime próprio ou crime de mão própria.

O crime comum é aquele que não exige qualidade específica do sujeito que pratica o delito. Pode ser cometido por qualquer um. O homicídio é um bom exemplo: qualquer indivíduo pode cometê-lo sem interferências de suas próprias características pessoais, funcionais ou circunstancias. 

Já o crime próprio é aquele que exige certa qualidade do sujeito ativo para praticar a conduta típica. Nesse caso, a doutrina admite a coautoria, a autoria e a participação nos crimes próprios. Um bom exemplo talvez seja o do crime de peculato que exige que o sujeito ativo seja funcionário público.

O crime de mão própria exige características personalíssimas por parte do agente, de modo que torna impossível que outra pessoa que não ostente aquelas características o pratique. Nesse sentido, excluiria a ideia de coautoria porque além das circunstâncias do sujeito ativo serem incomunicáveis, um coautor não deixa de ser um autor. O falso testemunho é um exemplo de crime de mão própria. Ou seja, se duas pessoas prestam falso testemunho, cada uma é autora de um crime.

A maior parte da doutrina aponta para o entendimento de que nessa espécie de crime, aqueles tipificados no art. 4 da lei 7.492/86, teríamos crime próprio, pois somente pessoas específicas podem estar enquadradas no tipo.

Se assim for, temos a incidência do art. 29 do CP para fins de concurso de pessoas. O artigo em questão, assim preceitua:

Art. 29: Quem de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade.

Ocorre que dois argumentos em conjunto acabam por nos inclinar a categorizar os crimes previstos no art. 4 da lei 7.492/86 como crimes de mão própria.

O legislador, no caso dessa lei, no art. 25, dispõe norma explicativa em que determina claramente quem são os sujeitos plenamente responsáveis para os fins da lei 7.492/86.

Assim:

Art. 25: São penalmente responsáveis, nos termos desta lei, o controlador e os administradores de instituição financeira, assim considerados diretores e gerentes.

§1º Equiparam-se aos administradores de instituição financeira o interventor, o liquidante ou o síndico.

Nesse sentido, nos parece que os possíveis agentes elencados no art. 25 ostentam características personalíssimas para a configuração do sujeito ativo do delito.

Acresce-se a isso o fato de que o legislador, no núcleo do tipo objetivo do referido art. 4 da lei, utiliza para tipificar a conduta o verbo "gerir". Ora, a gestão de instituição financeira é ação também personalíssima que não pode ser comunicada a nenhum coautor.

O resultado disso é que um agente, então, dentro dessa lógica interpretativa do art. 4 jamais seria capaz de praticar esse tipo de delito na qualidade de coautor, mas, apenas realizar o crime em questão na qualidade de partícipe.

Rodrigo Suzuki Cintra

Rodrigo Suzuki Cintra

Bacharel em Filosofia pela USP. Bacharel, Mestre e Doutor em Direito pela USP. Pós-Doutor pela Universidade de Coimbra, Portugal. Professor Titular da UNIP. Sócio do escritório Petrelluzzi & Cintra Jr

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