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TJ/MG reconhece o direito das candidatas do sexo feminino do concurso da PM/MG a obterem mais vagas no certame

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais declarou inconstitucional a restrição de 10% (dez por cento) das vagas para mulheres para ingresso na PM/MG e no CBM/MG.

terça-feira, 30 de agosto de 2022

Atualizado às 08:27

É sabido por todos que a Polícia Militar de Minas Gerais limita as vagas destinadas as candidatas do sexo feminino em seus concursos. Essa limitação se dá em decorrência da aplicação da lei estadual 22.415/16 que fixa os efetivos da PM/MG e do CBM/MG.

Assim dispõe o art. 3º da referida lei:

Art. 3º - O número de militares do sexo feminino será de até 10% (dez por cento) do efetivo previsto nos Quadros de Oficiais - QO - e nos Quadros de Praças - QP - da PMMG e do CBMMG e no Quadro de Oficiais Complementares - QOC - da PMMG, não havendo limite para o ingresso nos demais quadros.

Ocorre que, não há qualquer substrato técnico ou científico a justificar a limitação de mulheres nos quadros da Polícia Militar de Minas Gerais a apenas 10% do total do efetivo.

A rigor, a igualdade, sobretudo no tocante ao acesso a cargos públicos, deve ser tratada como regra, somente se admitindo a introdução de tratamento discriminatório de forma excepcional, quando circunstâncias de ordem fática, técnica ou social justificarem o tratamento diferenciado. Nesse sentido, assim informa a Constituição Federal de 1988:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;

(...)

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(...)

XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;

No cenário de constitucionalidade e legalidade de requisitos de acesso a cargos públicos baseados em discriminação de gênero, os Tribunais Superiores somente admitem a discriminação quando os critérios diferenciadores sejam autorizados por Lei e devem ter fundamentação adequada e proporcional, no sentido de indicar claramente a motivação da distinção, bem como a legitimidade do objetivo perseguido pela Administração ao aplicar tal distinção. Vejamos os entendimentos do Supremo Tribunal Federal - STF e do Superior Tribunal de Justiça - STJ nesse sentido:

Agravo regimental em recurso extraordinário. 2. Militares da Aeronáutica. Critérios diferenciados para promoção de militares dos sexos masculinos e femininos. Não violação do princípio da isonomia. Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (RE 285.146 AgR, Relator: Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 14/3/06, DJ 7/4/06) Recurso extraordinário. 2. Concurso público. Polícia Militar do Estado de Mato Grosso do Sul. 3. Edital que prevê a possibilidade de participação apenas de concorrentes do sexo masculino. Ausência de fundamento. 4. Violação ao art. 5º, I, da Constituição Federal. 5. Recurso extraordinário provido. (RE 528.684, Relator: Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 3/9/13)

ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. EDITAL. LIMITE DE IDADE. POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DA BAHIA. PREVISÃO LEGAL. NATUREZA DO CARGO. LEGALIDADE. 1. É firme no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que é possível a definição de limite máximo e mínimo de idade, sexo e altura para o ingresso na carreira militar, levando-se em conta as peculiaridades da atividade exercida, desde que haja lei específica que imponha tais restrições. 2. O art. 5º, II, da lei estadual 7.990/01 (Estatuto dos Policiais Militares do Estado da Bahia) aponta a idade como um dos critérios a serem observados no ingresso na Polícia Militar baiana. 3. Deve-se reconhecer a legalidade da exigência de idade máxima estabelecida pelo Edital SAEB/1/08, considerada a natureza peculiar das atividades militares. Não há, portanto, falar em ofensa a direito líquido e certo do impetrante. 4. Agravo Regimental não provido. (AgRg no RMS 41.515/BA, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, STJ, julgado em 2/5/13, DJe 10/5/13).

Conforme dito, a lei estadual 22.415/16 não apresenta qualquer fundamentação legítima dentro dos parâmetros da proporcionalidade para justificar a limitação do efetivo de mulheres nos quadros da Polícia Militar a somente 10% (dez por cento). Ademais, não existe na lei questionada e nem em nenhuma outra lei da PMMG motivos, claros e precisos, técnicos ou científicos, que indique ser plausível a restrição à atuação feminina nas corporações militares.

Por fim, em decisão histórica publicada no dia 10 de agosto de 2022, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais declarou inconstitucional a restrição de 10% (dez por cento) das vagas para mulheres para ingresso na PM/MG e no CBM/MG.

O Órgão Especial do TJ/MG responsável pela análise de constitucionalidade do dispositivo da lei estadual 22.415/16 entendeu que a Instituição não poderia justificar tal limitação tão somente com base na questão da diferenciação biológica, haja visto que a corporação não tem como atividade precípua o só emprego de força física. Vejamos o referido julgado:

EMENTA: ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE MANDADO DE SEGURANÇA - CONCURSO PÚBLICO - POLICIA MILITAR - LEI 22.415/16 - PARTICIPAÇÃO FEMININA LIMITAÇÃO-INCONSTITUCIONALIDADE.

- É inconstitucional, por injustificadamente discriminatório e preconceituoso, o dispositivo da lei estadual 22.415/16, que limita de antemão o percentual do efetivo feminino na Polícia Militar de Minas Gerais, partindo apenas do pressuposto da diferenciação biológica, porquanto consabido que a corporação não tem por atividade precípua o só emprego de força física, empregando para suas finalidades outras tantas ações de prevenção, de inteligência e policiamento ostensivo, para os quais não apenas útil, mas indispensável a diversidade.

- Conquanto a norma possa estabelecer distinções e fixar critérios de ingresso na corporação policial levando em conta a capacidade física, essa a ser devidamente avaliada em testes específicos quando do processo de seleção em concurso público, devendo a análise e a exigência guardar relação estreita e, assim, justificar-se validamente, a partir da natureza da função a ser desempenhada em específico, sem o que o parâmetro distintivo se torna meramente discriminatório e instrumento de exceção, conduzindo à sua inconstitucionalidade. (Arg Inconstitucionalidade 1.0000.20.047368-4/003, j. 10/8/22.)

Giovanni Bruno de Araújo Savini

Giovanni Bruno de Araújo Savini

Advogado do escritório Safe e Araújo Advogados.

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