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Reforma sindical: a reforma trabalhista de que precisamos

A reforma trabalhista de que precisamos é uma que confira efetiva liberdade sindical, extinguindo a unicidade sindical por categoria na base territorial mínima de município. Só assim, haverá plena liberdade e menor intervenção do estado nas relações jurídicas trabalhistas.

quinta-feira, 25 de agosto de 2022

Atualizado às 14:34

A reforma trabalhista de 2017

Tal como hoje, em 2017 o Brasil vivia uma profunda crise política e econômica, o que levou a classe política a buscar respostas drásticas, sob a promessa de efeitos rápidos na economia e na geração de empregos.

A reforma trabalhista nasceu dessa gestação. Filha prematura, foi debatida e aprovada em tempo recorde, modificando de uma só vez disposições de direito individual, coletivo e processual do trabalho.

Sua vocação, segundo projeto original e exposição de motivos, era ampliar os poderes das negociações coletivas e individuais, reduzindo a interferência do Judiciário nas decisões tomadas coletivamente.

Era a predominância do pactuado sobre o legislado.

Nesse sentido, na CLT, descortinaram-se os art. 611-A e 611-B: o primeiro elencando hipóteses em que os acordos e convenções coletivas se sobreporiam à lei; o segundo, hipóteses em que a negociação coletiva a qualquer título não poderia reduzir ou suprimir direitos.

No § 3º inserido no art. 8 da CLT, consagrou-se o princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva, rezando que o negócio jurídico decorrente de negociação coletiva só poderia sofrer intervenção judicial por conta de nulidades formais ou legais. 

Ao mesmo tempo, modificou-se o art. 582 da CLT, de modo que a contribuição sindical, até então obrigatória, tornava-se facultativa, dependente de prévio e expresso consentimento do trabalhador.

A extinção da compulsoriedade da contribuição sindical foi uma das novidades mais alvissareiras, festejadas pela imprensa e trabalhadores em geral e serviu de propaganda em prol das mudanças. Deveras, poucos trabalhadores se sentiam representados por sindicatos. Regra geral, frequentavam-nos apenas para que se fizessem as extintas homologações rescisórias,  nada mais.

De outro lado, muitos questionavam se era prudente que se ampliasse o poder da negociação coletiva ao mesmo tempo em que se retirasse dos sindicatos fonte de custeio tão relevante.

Unicidade plúrima

O Brasil tem na contradição uma das suas características mais marcantes. No plano jurídico-político, desde 1988 vivemos sob a guarda de uma Constituição genuinamente cidadã, ampliativa de direitos individuais e sociais, que primou pela liberdade de associação sindical, livre filiação e desfiliação ao sindicato, mas, concomitantemente, manteve traços do corporativismo, dentre os quais a unicidade sindical por categoria, com base territorial mínima do município.

A despeito disso, a obrigatoriedade de contribuição sindical foi estímulo que fez letra morta da unicidade, propiciando eclodir grande número de sindicatos, seja pela desagregação territorial de sindicatos regionais e estaduais em municípios, seja pela especialização profissional, muitas vezes mais decorrente da criatividade dos "empreendedores" sindicais de que uma segmentação profissional real.

A própria estruturação da representação sindical em categorias, forjada numa perspectiva amorfa e artificial, em nada contribui para que de fato os trabalhadores se sintam plenamente representados.

É nesse cenário contraditório que nasceu a excessiva intervenção judicial nos instrumentos sindicais. Ele, porém, restou intocado pela reforma trabalhista.

Será que a reforma pretendia, de fato, acordos e convenções coletivas melhores ou tinha a intenção de explorar a menor intervenção judicial em instrumentos coletivos negociados por sindicatos de trabalhadores pouco representativos e, agora, sem financiamento?

A reforma que queremos

Muitos são os que apontam no direito do trabalho um excessivo grau de intervenção estatal.

E estão certos.

O direcionamento legislativo excessivo e as por vezes indecorosas interferências judiciais nos instrumentos coletivos não se coadunam com o caráter plúrimo que o direito do trabalho tem em sua origem.

Explique-se.

O direito do trabalho nasce como corpo legislativo e doutrinário, em princípio, pelo reconhecimento da legitimidade das entidades sindicais e da consequente força jurídica vinculante dos instrumentos resultantes da negociação coletiva.

É o pluralismo jurídico, no qual reconhece-se uma variedade de fontes de direito, mas com prevalência das normas coletivamente e especificamente negociadas, autônomas, posto que oriundas da negociação entre os próprios interessados. A lei é a fonte heterônoma, surgida de cima pra baixo, oriunda do vagaroso e inespecífico processo legislativo. A ela, num espaço de liberdade sindical, reserva-se o mínimo existencial, direitos inegociáveis, garantidores do padrão mínimo civilizatório.

A mais relevante reforma trabalhista de que precisamos é a reforma sindical. Uma que, sob o espírito da Convenção 87 da OIT, desate as amarras do artificialismo anacrônico do binômio unicidade sindical e enquadramento por categorias.

Trabalhadores e empregadores devem unir-se em associações sindicais criadas por eles, sem autorização prévia, podendo escolher livremente a entidade que reputarem mais representativa, com ampla e irrestrita faculdade de filiação e desfiliação, sob a única condição de se conformarem a seus estatutos.

É assim que nos países desenvolvidos a unicidade artificial, forjada na lei, deu lugar à unidade sindical de fato, decorrente da efetiva autonomia dos trabalhadores e empregadores na gestão de seus próprios interesses.

Nicolas Basilio

Nicolas Basilio

Bacharel em direito no Largo de São Francisco-USP. Especialista em direito material e processual do trabalho na COGEAE-PUC/SP. Advogado trabalhista, sócio da Nicolas Basilio Advocacia.

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