Franquia: CSRF reconhece a possibilidade de segregação fiscal de atividades
Não seria desarrazoado apostar que a recente decisão servirá de elemento fomentador para o amadurecimento do mercado, o incremento das possibilidades de organização de novos negócios pelo franchising e até mesmo a atualização eficiente e flexível de estruturas contratuais anacrônicas.
terça-feira, 26 de julho de 2022
Atualizado às 08:34
Em 9/5/22, a Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CSRF) julgou o PAF 10830.008568/2008-15 e concluiu que, ausente a artificialidade de formas, é admissível que um contribuinte do ramo de franquias desenvolva outra atividade concomitante (porém relacionada) à franquia e aplique tratamento fiscal diverso aos resultados provenientes dessas duas linhas de negócios.
No caso concreto analisado, a CSRF confirmou a decisão de segunda instância administrativa que, entendendo favoravelmente ao contribuinte (uma empresa que atua no ramo das franquias de escolas de idiomas), afastou uma autuação fiscal que pretendia cobrar os mesmos percentuais de presunção de resultado (para fins do cálculo do lucro presumido) sobre as atividades de franquia propriamente ditas (i.e. 32%, serviços), e venda de mercadorias (i.e. 12%, comercialização de material didático aos franqueados para uso nos cursos de idiomas oferecidos aos alunos).
Em termos práticos, prevaleceu o entendimento que, embora seja sabido que o contrato de franquia é complexo, por considerar um conjunto de relações jurídicas diversas (tais como, cessão de marca, cessão de know-how, concessão de direitos de distribuição etc.), tal circunstância não impede o franqueador de celebrar outros negócios com terceiros (por exemplo, venda de mercadorias, ou prestação de outros serviços), inclusive terceiros que sejam franqueados, e aplicar tratamento tributário próprio e diverso aos resultados dessas linhas distintas de negócios, contanto que inexista artificialidade na atribuição de preços a cada uma dessas prestações diversas (especialmente quando a contraparte delas for um franqueado).
Tal entendimento não é verdadeiramente novo no âmbito administrativo, pois já existem outros precedentes que reconheceram a legitimidade de segregações semelhantes (inclusive com relação à segregação das atividades de distribuição de mercadorias para posterior revenda pelos franqueados) em entidades legais diversas, novamente considerando o cenário em que inexiste artificialidade de formas, ou seja: quando os negócios de fato existem e operam de maneira autônoma e financeiramente independente, ou de preços, ou seja: quando os preços atribuídos a cada uma das prestações são compatíveis com padrões de mercado.
Entretanto, a recente decisão da CSRF é importante e emblemática não apenas pela lucidez com que enfrenta o ponto, e reconhece a possibilidade de segregação, como também pelo momento oportuno em que foi proferida, dado que passamos justamente pela consolidação de um novo modelo de organização das relações jurídicas (entre franqueadores e franqueados) em vista da Nova Lei de Franquias (lei 13.966/19), em vigor há pouco mais de dois anos.
Ainda que o caso analisado pela CSRF envolva negócios realizados na vigência da lei de franquia anterior (lei 8.955/94), não seria desarrazoado apostar que a recente decisão servirá de elemento fomentador para o amadurecimento do mercado, o incremento das possibilidades de organização de novos negócios pelo franchising e até mesmo a atualização eficiente e flexível de estruturas contratuais anacrônicas.
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*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.
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Luiz Roberto Peroba Barbosa
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