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O caso Evidence Previdência: Clientes há mais de 20 anos têm seus contratos e confiança quebrados

A expectativa é que decisões como as referidas sejam cada vez mais frequentes, aplicando-se a efetiva justiça, com a garantia da manutenção do que foi pactuado entre as Partes há décadas.

terça-feira, 19 de julho de 2022

Atualizado às 13:48

Milhares de investidores dos chamados Planos de Previdência tradicional contratados há mais de 20 anos, têm visto projetos de vida desconstruídos pela Evidence Previdência. 

Isso porque a Evidence, empresa do Grupo Santander, têm i) encaminhado Notificações Extrajudiciais e até mesmo ajuizado centenas de ações judiciais, buscando repactuar, ou mesmo rescindir contratos do tipo FGB firmados na década de 1990, e/ou datas anteriores; e ii) negado a realização de aportes esporádicos, alteração do valor da contribuição mensal e outras faculdades contratuais. 

Alegam, dentre outros argumentos genéricos, que o retorno prometido pelo plano, qual seja IGP-M + 6% ao ano, se mostrou excessivamente oneroso, bem como que "o produto FGB possui tábua de expectativa de vida desatualizada e juros fixos completamente incompatíveis com a realidade". 

O que diz o contrato?

Os planos tradicionais foram vendidos como um plano extremamente flexível, em que os contratantes, em regra, possuem faculdades de i) realizar aportes esporádicos; ii) alterar o valor de suas contribuições mensais; e iii) alterar a data de saída de seus planos.

Além disso, o próprio regulamento do plano é claro ao dispor sobre a remuneração de 6% de juros + variação de IGP-M ao ano, livremente ofertada pela Evidence, e aderida pelos consumidores.

Portanto, é evidente o direito dos Contratantes de obter a remuneração contratada, bem como de realizar as faculdades prometidas quando da contratação dos planos tradicionais, direito esse expresso no contrato firmado entre as Partes.

Mesmo assim, ignorando por completo todas as obrigações assumidas, após mais de 20 (vinte) anos, optou a Evidence por "mudar as regras do jogo" de forma completamente unilateral, impondo aos consumidores a rescisão do plano, ou sua alteração por um menos vantajoso (ex: PGBL). 

O que pretende a Evidence?

A princípio, a Evidence encaminhou cartas aos consumidores/contratantes do plano Tradicional, alegando que "houve considerável alteração da política econômica, que aliada às imprevisíveis alterações do cenário macroeconômico mundial e brasileiro causou queda nas taxas de juros e consequente redução na rentabilidade dos investimentos. (...)"

Aduziram que "a garantia de rentabilidade e do fator atuarial do FGB inviabiliza a manutenção do plano nas condições anteriormente contratadas", e exigiu que o consumidor fizesse a repactuação do plano.

Ato seguinte, numa medida desesperada e temerária, a Evidence ajuizou centenas de ações judiciais por todo o Brasil, buscando a repactuação, ou mesmo a rescisão dos contratos do tipo FGB firmados na década de 1990, e/ou datas anteriores.

O que diz a Susep?

A Susep, órgão regulador do governo para o setor de seguros, aponta que "em que pese a dificuldade de gestão dos planos atrelados ao IGP-M, as empresas não podem modificar unilateralmente os regulamentos dos planos em vigor".

Ressaltou ainda que "qualquer alteração de plano precisa contar com a concordância do participante." 

Contudo, até o momento, a Evidence continua a descumprir as regras contratuais, sem qualquer penalidade.

O que diz a Justiça?

Após notificar milhares de contratantes, a Evidence recorreu ao Poder Judiciário para repactuar ou rescindir os contratos tipo FGB.

Contudo, em que pese a demanda indigna da Instituição Financeira, diversos Tribunais do País, têm, de forma acertada, se posicionado a favor dos Contratantes/Consumidores.

Ao manter a improcedência dos pedidos formulados pela Evidence, o desembargador da 26ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), Carlos Dias Motta, entendeu que "não configura fato imprevisível a alegada queda da taxa de juros, o aumento da expectativa de vida do brasileiro e a mudança de regras da previdência privada pelo órgão gestor", acrescentando que tais fatores "constituem risco da atividade da administradora do plano". (proc. nº 1005423-80.2021.8.26.0100).

Em demanda ajuizada pelo Contratante para se valer de seu direito de realizar aportes financeiros esporádicos, o Consumidor obteve sentença favorável, confirmada pela 27ª Câmara de Direito Privado do TJ/SP.

Na oportunidade, a Desembargadora Relatora entendeu que as justificativas para suspender a autorização aos aportes do autor "constituem risco da atividade e não autorizam a modificação das condições outrora pactuadas, por causarem desvantagem exagerada ao consumidor e frustrar sua expectativa de recebimento da renda complementar na velhice". (proc. nº 1005423-80.2021.8.26.0100).

Ademais, a jurisprudência tem se posicionado de forma pacífica a favor do consumidor, como se vê:

Previdência privada aberta. Ação ajuizada pela administradora do plano, com pretensão de repactuação ou, subsidiariamente, de resolução do contrato. Sentença de improcedência. Apelo da autora. Cerceamento de defesa. Inocorrência. Documentação dos autos suficiente para o deslinde da controvérsia, não sendo necessária a produção de qualquer outra prova. Revelia que induz efeito meramente relativo de veracidade dos fatos alegados pela autora. Além disso, ainda que considerados como verdadeiros os fatos alegados pela autora, ainda resta a análise do direito aplicável à espécie. Incidência das regras do CDC à espécie, conforme Súmula 563 do C. STJ. Pretensão de revisão ou de resolução do contrato com base na teoria da imprevisibilidade. Impossibilidade. Não configura fato imprevisível a alegada queda da taxa de juros, o aumento da expectativa de vida do brasileiro e a mudança de regras da previdência privada pelo órgão gestor. Fatores que constituem risco da atividade da administradora do plano. Dever das partes de observar os princípios da probidade e boa-fé, tanto na conclusão quanto na execução do contrato. Artigos 113 e 422 do Código Civil. Sentença mantida. Sem honorários recursais, porquanto não fixados honorários em primeiro grau, diante da revelia da ré. Apelo desprovido.

(TJSP;  Apelação Cível 1005423-80.2021.8.26.0100; Relator (a): Carlos Dias Motta; Órgão Julgador: 26ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional VI - Penha de França - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 17/03/2022; Data de Registro: 18/03/2022).

PREVIDÊNCIA PRIVADA. Evidence Previdência. Pretensão massificada de revisão ("repactuação") ou resilição ("resolução") contratual. Desequilíbrio econômico-financeiro. Imprevisão. Onerosidade excessiva. Queda da taxa de juros. Aumento da expectativa de vida. Exigência de aporte financeiro pelo órgão regulador. Risco próprio da atividade. Violação da boa-fé objetiva. Relação de consumo. Pedidos improcedentes. Jurisprudência consolidada do TJSP. Valor da causa retificado. Sentença reformada. Recurso da ré provido. Recurso da autora não provido. (TJ-SP - AC: 10013422920218260152 SP 1001342-29.2021.8.26.0152, Relator: Gilson Delgado Miranda, Data de Julgamento: 14/03/2022, 35ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 15/03/2022).

A expectativa é que decisões como as referidas sejam cada vez mais frequentes, aplicando-se a efetiva justiça, com a garantia da manutenção do que foi pactuado entre as Partes há décadas.

Hannah Krüger Rodor Fontana

VIP Hannah Krüger Rodor Fontana

Advogada do escritório CR Advogados.

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