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A (não) incidência do difal-icms em operações destinadas à órgãos públicos

Revela-se essencial conhecer a legislação de cada ente federativo e realizar uma análise jurídica da empresa, especialmente o regime tributário adotado e as atividades desenvolvidas por ela

quinta-feira, 14 de julho de 2022

Atualizado às 07:50

A discussão a respeito da incidência do diferencial de alíquota do ICMS vem sendo pauta nos Tribunais e dúvida constante de contribuintes que operam atividades interestaduais relativas a aquisição de bens, mercadorias ou serviços. 

No ano de 2021, o STF reconheceu que a "EC 87/2015 criou uma nova relação jurídico-tributária entre o remetente do bem ou serviço (contribuinte) e o estado de destino nas operações com bens e serviços destinados a consumidor final não contribuinte do ICMS" - (ADIn 5469 e RE 1.287.019/DF) e definiu que a exigência do Difal demandaria lei complementar prévia dispondo sobre regras gerais do imposto. 

Como previsto na Constituição Federal, cada Estado possui legitimidade para legislar sobre o ICMS dentro do seu território, conforme previsão constitucional do artigo 155, II1. Nesse sentido, as Unidades da Federação possuem suas normas e regulamentos internos próprios. 

Ademais, verifica-se disposição do Convênio 191/172, que trata dos benefícios fiscais de isenção do ICMS e da redução da base de cálculo de ICMS autorizados por meio de convênios às operações e prestações interestaduais que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do ICMS, localizado em outra unidade federada, cujo teor segue transcrito: 

Cláusula primeira O caput da cláusula primeira do Convênio ICMS 153/15, de 11 de dezembro de 2015, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Cláusula primeira Os benefícios fiscais da redução da base de cálculo ou de isenção do ICMS, autorizados por meio de convênios ICMS com base na Lei Complementar nº 24, de 7 de janeiro de 1975, implementados nas respectivas unidades federadas de origem ou de destino serão considerados no cálculo do valor do ICMS devido, correspondente à diferença entre a alíquota interestadual e a alíquota interna da unidade federada de destino da localização do consumidor final não contribuinte do ICMS.". 

Da mesma forma, o Convênio ICMS 26/03 trata de autorizar os Estados e o Distrito Federal a conceder isenção de ICMS nas operações ou prestações internas destinadas a órgãos da Administração Pública Estadual Direta e suas Fundações e Autarquias3. Este Convênio serve como base para possibilitar as Unidades da Federação a concederem isenção do ICMS nas operações destinadas à órgãos públicos. Veja-se: 

Cláusula primeira Ficam os Estados e o Distrito Federal autorizados a conceder isenção de ICMS nas operações ou prestações internas, relativas a aquisição de bens, mercadorias ou serviços por órgãos da Administração Pública Estadual Direta e suas Fundações e Autarquias.

§ 1º A isenção de que trata o "caput" fica condicionada:

I - ao desconto no preço, do valor equivalente ao imposto dispensado;

II - à indicação, no respectivo documento fiscal, do valor do desconto;

III - à comprovação de inexistência de similar produzido no país, na hipótese de qualquer operação com mercadorias importadas do exterior.

(...) 

Nesse sentido, a existência do Convênio acima colacionado é norteador para os Estados, que podem ratifica-lo ou não. Assim, apesar da existência de Convênio que prevê a possibilidade de isenção de ICMS nas aquisições feitas por órgãos públicos, fica a critério de cada Estado firmar ou não o convênio em questão, de modo que somente na hipótese de ratificação do Convênio este passa a ter plena eficácia na legislação estadual de cada Unidade Federativa. 

Posto isso, revela-se necessária uma análise individual da legislação de cada unidade da federação, de modo a verificar a incorporação dessa autorização e o reconhecimento de isenção nas operações que a Administração Pública de cada ente federado figure como consumidora final dos produtos, para assim responder a respeito da existência de justificativa legal para o não recolhimento do Difal.

Pertinente também se faz a análise de eventuais consultas tributárias submetidas por contribuintes à Secretaria da Receita Estadual de cada Unidade da Federação, eis que servem como precedente que demonstra o entendimento do fisco daquele local, verificando se há entendimento favorável para a não incidência do Difal-ICMS nestas operações.

De todo modo, alguns Estados já se posicionaram em Consultas Tributárias, manifestando entendimento favorável no tocante a não incidência. Nesse sentido, recomenda-se às empresas que realizam operações interestaduais de mercadorias com destino a órgãos da Administração Pública uma pesquisa mais aprofundada sobre a possibilidade de isenção do diferencial de alíquota, que se revela uma oportunidade de reduzir a cobrança do imposto e tornar o preço mais competitivo para o mercado. 

A fim de exemplificar o conteúdo aqui exposto, expõe-se o cenário do Estado de São Paulo, cujos órgãos de consulta da receita estadual já opinaram de maneira favorável aos estabelecimentos localizados em outro Estado, e que realizam operações com mercadorias destinadas a órgãos da Administração Pública Estadual Direta e suas Fundações e Autarquias, de usufruirem da isenção do Difal-ICMS, não recolhendo o diferencial de alíquotas de que trata o inciso XVII e § 5º, ambos do artigo 2º do RICMS/00 para o Estado de São Paulo, desde que atendidos todos os requisitos e exigências previstos no artigo 55, do Anexo I, do RICMS/20004. 

Nesse sentido, verifica-se a existência de entendimento favorável do Fisco de São Paulo ao benefício do não recolhimento do Difal-ICMS nas operações interestaduais de mercadorias destinadas a órgãos públicos, desde que preenchidos todos os requisitos previstos no artigo 55, do Anexo I, do Regulamento do ICMS. 

De todo modo, revela-se essencial conhecer a legislação de cada ente federativo e realizar uma análise jurídica da empresa, especialmente o regime tributário adotado e as atividades desenvolvidas por ela, permitindo-se assim averiguar a possibilidade de o estabelecimento se beneficiar da não incidência do Difal-ICMS nas operações aqui apontadas.

______________

1 Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:      

(...)

II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

2 Disponível em: https://www.confaz.fazenda.gov.br/legislacao/convenios/2017/CV191_17.

3 Disponível em: https://www.confaz.fazenda.gov.br/legislacao/convenios/2003/CV026_03.

4 Resposta à Consulta Nº 20784 DE 03/01/2020 de São Paulo. ICMS - Emenda Constitucional nº 87/15 - Diferencial de alíquotas - Artigo 55 do Anexo I do RICMS/2000. I. O estabelecimento localizado em outro Estado que realizar operações com mercadorias com destino a órgãos da Administração Pública Estadual Direta e suas Fundações e Autarquias do Estado de São Paulo, não deverá recolher o diferencial de alíquotas para o Estado de São Paulo, desde que atendidos todos os requisitos e exigências previstos no artigo 55 do Anexo I do Regulamento do ICMS. Disponível em: https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=393959. Acesso em: 07 de julho de 2022.

Bruna Mattos Dias

Bruna Mattos Dias

Graduada em Direito pela UNISINOS, Pós-graduanda LLM Internacional em Proteção de Dados (LGPD & GDPR) FMP e Universidade de Lisboa e colaboradora no escritório Hickmann Advogados Associados.

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