Direito administrativo militar
Apresentação de defesa anterior a instauração de procedimento disciplinar.
sexta-feira, 1 de julho de 2022
Atualizado às 11:14
Neste artigo apresentaremos a legislação pertinente ao Estado de São Paulo, qual seja a lei complementar estadual 893/01 RDPM - Regulamento Disciplinar da Polícia Militar do Estado de São Paulo.
Pois bem. Sabe-se que os militares estaduais também estão adstritos a hierarquia e a disciplina, logo, sujeitos as condições especiais de trabalho e obediência hierárquica, sob pena de infringirem normas penal e/ou administrativa.
Por outro lado, temos também outros direitos e garantias em questão, os quais não poderão ser suprimidos ou aviltados a fim de se prevalecer a hierarquia e a disciplina, ou seja, há necessidade de utilizar a CF/88, as normas, bem como, os princípios de modo harmônico entre si.
A lei complementar 893/01 traz em seu art. 28, § 2º a possibilidade de o militar se manifestar preliminarmente, vejamos:
"Artigo 28 - A comunicação disciplinar deve ser clara, concisa e precisa, contendo os dados capazes de identificar as pessoas ou coisas envolvidas, o local, a data e a hora do fato, além de caracterizar as circunstâncias que o envolveram, bem como as alegações do faltoso, quando presente e ao ser interpelado pelo signatário das razões da transgressão, sem tecer comentários ou opiniões pessoais.
§ 1º - A comunicação disciplinar deverá ser apresentada no prazo de 5 (cinco) dias, contados da constatação ou conhecimento do fato, ressalvadas as disposições relativas ao recolhimento disciplinar, que deverá ser feita imediatamente.
§ 2º - A comunicação disciplinar deve ser a expressão da verdade, cabendo à autoridade competente encaminhá-la ao acusado para que, por escrito, manifeste-se preliminarmente sobre os fatos, no prazo de 3 (três) dias." (destaquei)
Importante frisar, em que pese conter no texto legal o termo "para que se manifeste" não há ofensa a hierarquia e a disciplina, ou mesmo, descumprimento de ordem superior pelo militar que deixou de apresentar a hie preliminar, haja vista se tratar de uma faculdade do militar, vez ser matéria de defesa "pré-processual", pois o próprio texto legal já traz o termo "acusado", logo, presente a matéria de defesa.
Noutro giro, há doutrina que entende estar o militar obrigado a apresentar a respectiva manifestação preliminar, pois recebera uma ordem de seu superior hierárquico, sob pena de incorrer na infração administrativa pelo não cumprimento de ordem, com fulcro no art. 13, parágrafo único, 29 do mesmo Codex.
A título ilustrativo, caso a autoridade disciplinar entender que o militar mesmo objetivando exercer o direito ao silêncio deverá apresentar documentação com tais informações para não incorrer em infração disciplinar, também restaria inócua, conforme segue.
Primeiro, a não apresentação da manifestação preliminar, por si só, já demonstra o seu interesse implícito em permanecer em silêncio, não havendo necessidade de consignar sua vontade expressamente.
Segundo, também a título ilustrativo, caso já tenha procedimento disciplinar instaurado, com o acusado regularmente citado, mas que se mantem revel, a administração nomeará um defensor dativo e não restará responsabilidade disciplinar ao acusado.
Sendo assim, forçoso admitir que em uma situação "pré-processual" restaria responsabilidade disciplinar em desfavor do militar do Estado que se valeu do direito constitucional ao silêncio.
Nesse sentido, a doutrina inserta no livro Regulamento Disciplinar da Polícia Militar do Estado de São Paulo - Direito Administrativo Disciplinar Militar (p. 172), entende ser faculdade do militar a apresentação da manifestação preliminar, senão vejamos:
"Ainda que não haja acusação formal em desfavor do militar do Estado, a manifestação preliminar é faculdade outorgada ao policial de esclarecer, prematuramente, os fatos. Não está ele, portanto, obrigado a informar, sendo absurda e abusiva a aplicação de eventual punição por não cumprimento de ordens, in exemplis." (NEVES, Cícero et al. Regulamento Disciplinar da Polícia Militar do Estado de São Paulo. 3ª ed. São Paulo: Suprema Cultura, 2013 (destaquei)
Portanto, conclui-se que há entendimento doutrinário diverso sobre a matéria, mas com base no ordenamento jurídico analisado, a faculdade de o militar do Estado em apresentar a manifestação preliminar é mais razoável, equânime, justa e dentro do Estado democrático e social de direito, tudo sob o manto da carta política de 1988.