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Retroatividade das normas de direito processual na Lei de Improbidade Administrativa após o advento da lei 14.230/21?

Aplicação retroativa das normas de direito processual da lei 14.230/21.

segunda-feira, 13 de junho de 2022

Atualizado às 08:26

Muito se tem debatido a respeito da retroatividade da lei 14.230/21 no aspecto material, em decorrência do princípio do direito administrativo sancionador.

Não obstante, há um outro questionamento relativo à retroatividade da lei 14.230/21 que merece atenção: a retroatividade, ou não, das normas de conteúdo processual.

Muito embora se aplique as regras de direito penal nas questões envolvendo a Lei de Improbidade Administrativa - LIA, a disciplina processual (prazo, recurso, etc.) fica a cargo do Código de Processo Civil, conforme prevê o próprio art. 17 e diversos outros dispositivos da LIA (§ 8º e 9º, art. 16, art. 17-C).

A discussão, então, que surge, é a retroatividade das normas de direito processual na LIA, sobretudo em razão do disposto no art. 141 do Código de Processo Civil - CPC, que prevê o respeito aos atos processuais já aplicados, motivo pelo qual a nova lei (processual) se aplicaria desde já e irradiando seus efeitos futuros a relações jurídicas nascidas ou por nascer, em respeito aos efeitos jurídicos produzidos pela lei anterior.

Ocorre que no campo da Improbidade Administrativa, em razão do caráter nitidamente ostensivo, constrangedor e nefasto na vida do demando em razão das imputações que lhe são atribuídas na ação, surge sérios questionamentos sobre a retroatividade também das normas de conteúdo processual, como no caso de decisão interlocutória sobre indisponibilidade de bens proferida antes da lei 14.230/21.

A mera leitura do CPC induz no pronto afastamento da retroatividade das normas de conteúdo processual, mas a regra tipicamente processual civil deve ser a mesma para os casos afetos à LIA? Entendo que não.

De fato, é o CPC que estabelece o procedimento que será aplicado na LIA, o que é inquestionável. Por outro lado, também é inconteste que por força do direito administrativo sancionar há determinadas garantias aos imputados que devem ser consideradas também no aspecto processual.

Veja-se que a própria LIA, quando prevê a aplicação do procedimento previsto no CPC, também menciona "salvo o disposto nesta lei" (parte final do art. 17), a permitir um juízo de exceção sobre o previsto na própria LIA.

Por isso é que, o decreto de indisponibilidade de bens deferido à luz do texto anterior à lei 14.230/21, deve ser revisto se não presentes os requisitos atualmente previstos no art. 16 da lei 8.429/92.

Inclusive o TJ/SP em algumas oportunidades já se manifestou pela aplicação das normas processuais a atos já praticados:

Agravo de instrumento. Improbidade administrativa. Irresignação de corréu contra ordem de indisponibilidade de bens. Acolhimento. Viabilidade de aplicação imediata aos processos em curso das normas de natureza processual incorporadas pela lei 14.230/21 à lei 8.429/92 (LIA). Indícios de dilapidação patrimonial não caracterizados. Decreto de indisponibilidade que não é de subsistir. Precedente. Decisão reformada. Recurso provido (Agravo de Instrumento 2048700-07.2022.8.26.0000, 10ª Câmara de Direito Público, Rel. José Eduardo Marcondes Machado, julgado em 6 de abril de 2022).

AÇÃO DE IMPROBIDADE. Liminar. Indisponibilidade de bens. Pagamento de vantagem indevida a ex-governador para campanha eleitoral sem regular declaração à Justiça Eleitoral. Superveniência da lei 14.230/21 § 3º acrescentado ao art. 16 da lei 8.429/92 que prevê que o pedido de indisponibilidade de bens apenas será deferido mediante a demonstração, no caso concreto, de perigo de dano irreparável ou de risco ao resultado útil do processo. Norma de natureza processual. Aplicação imediata aos processos em curso. Artigo 14 do Código de Processo Civil. Dilapidação patrimonial não demonstrada. Indisponibilidade decretada antes do novo diploma legal. Medida que não pode subsistir. Revogação. Agravo provido para tal finalidade (Agravo de Instrumento 2048700-07.2022.8.26.0000, 10ª Câmara de Direito Público, Rel. Antônio Carlos Villen, julgado em 6 de maio de 2022).

É possível notar pelos julgados que, se a decisão anterior à lei 14.230/21 não se pautou nos requisitos regras atuais exigidas pela Lei de Improbidade (indícios de dilapidação patrimonial, vedação de incidir sobre multa civil, perigo de dano ou risco ao processo, probabilidade de ocorrência de ato de improbidade etc.).

Assim, a aplicação imediata das regras processuais da lei 14.230/21 implica na insubsistência de decreto de indisponibilidade de bens proferido antes da nova lei.   

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1 A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada. 
Diego da Mota Borges

Diego da Mota Borges

Mestrando em Desenvolvimento Regional pelo Centro Universitário Municipal de Franca Uni-Facef. Tem experiência na área do Direito Público, com ênfase em Direito Penal Econômico e Ações de Improbidade Administrativa. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade de São Paulo FDRP- USP (2015) e em Direito Penal Econômico Aplicado: Teoria e Prática pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC Minas (2021). Graduado em Direito pela Faculdade Dr. Francisco Maeda - Fafram (2012). Advogado no escritório Moisés, Volpe e Del Bianco Sociedade de Advogados.

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