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Nova lei SAC: Principais alterações e suas motivações

O novo decreto do SAC entrará em vigor no prazo de 180 dias, a contar de sua publicação no Diário Oficial e o grande desafio das empresas será na mudança do foco do tempo de resposta ao consumidor.

quinta-feira, 9 de junho de 2022

Atualizado em 10 de junho de 2022 08:39

Desde o final do ano de 2017, a secretaria nacional do consumidor "Senacon", ligada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, organizou um grupo de estudos com o objetivo de revisitar as disposições previstas no decreto 6.523/08, que regulamentava, à época, o serviço de atendimento ao consumidor "SAC", na medida em que o texto legal já se mostrava obsoleto frente as novas exigências dos consumidores e das empresas reguladas.

A nova proposta de lei contou com a participação de representantes dos consumidores, empresas e órgãos de defesa do consumidor atuantes no Brasil, os quais editaram um modelo de texto normativo moderno com a discussão de pontos que pudessem diminuir a insatisfação dos consumidores, tendo em vista o aumento de reclamações e de conflitos de consumo verificados nos últimos anos, conforme levantamento feito pela plataforma consumidor.gov.

Após anos de discussão sobre o tema, no último dia 06, enfim, foi sancionado e publicado o decreto 11.034/22 (D11.034), que estabelece novas diretrizes e normas sobre o serviço de atendimento ao consumidor e revoga, integralmente, o texto do decreto 6.523/08 (decreto 6.523).

O novo decreto exprime o objetivo claro de proporcionar melhor experiência e oferecer garantias de resolutividade da demanda registrada no canal de atendimento das empresas reguladas pelo Poder Executivo federal, ou seja, às empresas que prestam serviços públicos de energia, telefonia, internet, TV por assinatura, planos de saúde, aviação civil, seguradora, bancos, financiadoras, consórcios, operadoras de cartão de crédito, dentre outras.

Nesse sentido, a primeira importante inovação do decreto é a criação de multicanais para atendimento ao consumidor.

A redação anterior do artigo 2º definia o SAC por serviço de atendimento telefônico das prestadoras de serviços regulados, enquanto o novo texto legal já o aponta como serviço de atendimento realizado por diversos canais integrados dos fornecedores de serviços regulados. A proposta levou em consideração o novo perfil dos consumidores e o aumento na contratação de serviços por meio do comércio eletrônico, aliado ao avanço tecnológico.

Da mesma forma, foi feita ressalva de que tais canais de atendimento devem ser integrados de modo que ao consumidor seja permitido acompanhar sua demanda por quaisquer das ferramentas disponibilizadas pela empresa regulada.

Enquanto o novo texto legal determina a criação de diversos canais de atendimento ao consumidor, o artigo 4º, §2º mantém como obrigatória a prestação desse serviço por meio de telefone, justamente para garantir o amplo acesso a esse serviço, já que parcela significativa da população brasileira tem acesso restrito à internet1.

Um ponto de alerta às empresas é a questão da privacidade de dados do consumidor. O novo decreto procura salvaguardar as garantias de privacidade de dados e o atendimento à LGPD, determinando expressamente que "os dados pessoais do consumidor serão preservados, mantidos em sigilo e utilizados exclusivamente para os fins do atendimento, em conformidade com a LGPD". Desta forma, a empresa não poderá, por exemplo, obrigar o consumidor a fornecer novamente dados pessoais informados no primeiro atendimento à sua demanda, por ocasião de um novo contato com o SAC apenas para acompanhar o resultado de sua demanda. A empresa terá, assim, que manter um histórico unificado da demanda do consumidor, em um protocolo único, de modo a facilitar o acesso de qualquer atendente e não haver coleta de dados que não serão utilizados para fins que não do registro da demanda em si.

Essas mudanças, como visto, buscam garantir melhor experiência do consumidor no atendimento e diálogo com a empresa regulada.

Tanto que o atendimento ainda deve ser oferecido 24 horas por dia, nos 7 dias da semana (artigo 5º), de forma gratuita e sem qualquer ônus ao consumidor (artigo 3º).  No entanto, exige que apenas um dos canais de atendimento utilizados pela empresa regulada seja prestado ininterruptamente (artigo 4º), o qual deverá ser amplamente divulgado ao consumidor.

Com isso, o atendimento por humano, a princípio, não estará disponível ao consumidor de forma ininterrupta, mas nunca será inferior a oito horas diárias; cabendo aos órgãos ou as entidades reguladoras competentes a definição de horário de atendimento superior ao estabelecido no caput do artigo 5º, considerando as peculiaridades e especificidades de cada serviço regulado.

O consumidor, nesse aspecto, perde a acessibilidade de atendimento por humano nas 24 horas do dia, 7 dias da semana; mas os demais canais de atendimento, como o chatbot, por exemplo, não poderão parar nem por um segundo do dia. O novo decreto, ainda, acabou com a exigência do atendimento telefônico em até 60 segundos, como constava no decreto 6.523/08.

Essas mudanças nos parecem trazer certo prejuízo ao consumidor, pois alteram direitos que anteriormente os beneficiavam, como, por exemplo, o tempo para atendimento.

E isso acontece porque o novo decreto do SAC, como dito, busca melhorar os índices de resolução das demandas registradas e não a imediaticidade do atendimento, como a norma anterior, objetivando, com isso, um resultado mais efetivo ao consumidor.  

Para isso, fato é que as empresas reguladas devem investir no serviço de atendimento ao consumidor tanto no que se refere a criação e desenvolvimento de novos canais de atendimento, como também no treinamento dos atendentes para que conheçam melhor o produto ou o serviço disponibilizado, para responder com maior efetividade às reclamações de seus clientes.

Daí o porquê ter sido inserido um novo capítulo ao decreto para tratar da efetividade do SAC.

Os artigos 15 e seguintes do novo decreto tratam de indicadores e ferramentas de acompanhamento da efetividade do SAC, que deverão ser criados pela Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Esses indicadores devem considerar, entre outras coisas, o volume proporcionalizado de manifestações de consumidores no SAC, nos canais das agências reguladoras, nos Procons e na plataforma consumidor.gov; e, ainda, a avaliação do atendimento pelos consumidores, grau de judicialização em relação às causas raiz daquelas manifestações, por intervalo de tempo.

Isso significa dizer que haverá um controle próprio e efetivo sobre o funcionamento e índices de resolutividade do SAC oferecido pelas empresas reguladas, as quais estarão sujeitas às penalidades previstas no Código de Defesa do Consumidor, sem prejuízo de sua cominação com outras sanções constantes nos regulamentos próprios de cada setor regulador.

Com isso, espera-se reduzir a judicialização dos conflitos de consumo, que atualmente representam a 2ª maior causa de ações no país2.

O novo decreto do SAC entrará em vigor no prazo de 180 dias, a contar de sua publicação no Diário Oficial e o grande desafio das empresas será na mudança do foco do tempo de resposta ao consumidor para o foco da efetividade do atendimento, que inclui tempo de resposta, mas também resolutividade e baixo índice de reclamações.

Ganharão as empresas que entenderem que o pulo do gato será promover uma integração de suas plataformas de atendimento, adequada ao seu negócio, oferecendo atendimento ágil, integrado e efetivo; bem como aproveitar uma nova faculdade prevista no novo decreto, de desenvolver plataformas online de solução de disputas ou integrar seus canais de SAC com a plataforma do site oficial, ganhando em celeridade, efetividade e melhorando sua imagem perante o consumidor.

___________

1 Acesso em 11/04/2022: Brasil tem 152 milhões de pessoas com acesso à internet | Agência Brasil (ebc.com.br)

2 Acesso em 11/04/2022: relatorio-justica-em-numeros2021-221121.pdf (cnj.jus.br)

Letícia Micheletti Demundo Pesani

Letícia Micheletti Demundo Pesani

Advogada formada pela PUC/SP e especialista em Direito das Relações de Consumo pela COGEAE/PUC. Atua no escritório Mendonça de Barros Advogados na área de contencioso cível, com experiência em ações judiciais em geral e ações civis públicas envolvendo relações de consumo, com ênfase nos setores alimentícios, de varejo e softwares de gestão.

Luciana Guimarães Betenson

Luciana Guimarães Betenson

Advogada formada pela USP, atua há seis anos no Mendonça de Barros Advogados na equipe de Consultoria e Contratos, com ampla experiência na elaboração e análise de contratos comerciais, bem como em auditorias de contratos e no aconselhamento jurídico para empresas em geral. Extenso conhecimento dos setores alimentício, de varejo e farmacêutico. Experiência com consultoria em questões de Direito do Consumidor e aspectos jurídicos de propaganda, publicidade e promoções.

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