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A execução do crédito trabalhista sujeito aos efeitos da recuperação judicial

Fernando Luiz Tegge Sartori e Priscilla Folgosi Castanha

Estudo sobre a legislação e jurisprudência e suas consequências para o processo recuperacional.

segunda-feira, 23 de maio de 2022

Atualizado às 13:39

I - Introdução

O presente artigo visa analisar o crédito trabalhista sujeito à recuperação judicial, especialmente a execução deste crédito à luz da lei 11.101/05 e as recentes alterações promovidas pela lei 14.112/20, os vetos presidenciais ao projeto de lei, bem como suas consequências para sócios e eventuais empresas correlacionadas à devedora em recuperação judicial.

Trata-se de tema com grande repercussão no sistema recuperacional e, ainda, controverso entre os militantes da área, quando inserido em um contexto de confronto entre os objetivos e princípios da legislação trabalhista com a sistemática da legislação recuperacional.

Desta forma, sem pretensão de esgotar todos os aspectos relacionados ao crédito trabalhista no âmbito da recuperação judicial, será abordada a origem e o tratamento do crédito na recuperação judicial, com ênfase na execução deste crédito e os reflexos para terceiros vinculados à devedora principal.

II - O crédito trabalhista na recuperação judicial

O crédito trabalhista, segundo o atual entendimento majoritário1, é originado quando da ocorrência do fato gerador que constitui o direito do seu titular, independentemente do tipo de relação existente entre os contratantes, seja uma relação de emprego formal, seja por trabalho informal. Esse direito poderá ser reconhecido por declaração formal da parte devedora ou por intermédio de uma reclamação trabalhista.

Sob a égide da Justiça do Trabalho, na hipótese de rescisão de um contrato de trabalho, e com base no respectivo termo de rescisão (TRCT), ou após a liquidação de valores em uma reclamação trabalhista, o crédito do empregado se torna imediatamente exigível, situação que é diversa quando o aludido crédito é contemplado pelas diretrizes da lei 11.101/05, na hipótese em que a empresa devedora requer e obtém a decisão de deferimento do processamento da sua recuperação judicial.

Isso porque, nos processos de recuperação judicial, os créditos trabalhistas somente serão relacionados quando líquidos, seja por força de um termo de rescisão do contrato de trabalho, por acordo firmado em reclamação trabalhista ou por homologação dos cálculos de liquidação em reclamação trabalhista, ressalvado o direito de o juízo laboral determinar que se efetive uma reserva de valores2, o que ficará condicionado ao êxito da demanda trabalhista.

Se o crédito não for reconhecido e declarado pela recuperanda3 ou pelo administrador judicial4 nomeado pelo Juízo recuperacional, caberá ao credor pleitear a habilitação do seu crédito5, que deverá ser efetivada nos termos da lei 11.101/05. Na prática, transporta-se ao juízo recuperacional a fase de execução que ocorreria na justiça especializada do trabalho.

Referido procedimento é bem retratado por Manoel Justino Bezerra Filho6, nos seguintes termos:

"Declarado por sentença o direito que o autor tem contra o devedor falido ou em recuperação, bastará apenas comunicar o fato ao juízo da recuperação ou falência, comprovando o alegado, para que o crédito seja automaticamente incluído no quadro geral de credores, independentemente de habilitação. Aliás, o valor suficiente para atendimento do crédito poderá até já estar reservado, na forma do art. 6.º, § 3.º. O pedido de reserva é feito por simples petição, acompanhada dos documentos comprobatórios do alegado - como o valor ainda não está definido, dependendo de sentença, deverá o peticionário estimar o valor a ser reservado, o que será examinado pelo juiz, que poderá, se for o caso, reduzir o valor da reserva."

Segundo o art. 49 da lei 11.101/05, "estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos. Assim, uma vez apurado o crédito nos autos da reclamação trabalhista (crédito líquido), deve ser habilitado na recuperação judicial, não havendo como prosseguir a execução promovida contra as sociedades em recuperação judicial.

  • Confira aqui o artígo na íntegra.

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1 Enunciado 100 da III Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal: "Consideram-se sujeitos à recuperação judicial, na forma do art. 49 da Lei n. 11.101/2005, os créditos decorrentes de fatos geradores anteriores ao pedido de recuperação judicial, independentemente da data de eventual acordo, sentença ou trânsito em julgado".

2 Art. 6º (...) § 3º O juiz competente para as ações referidas nos §§ 1º e 2º deste artigo poderá determinar a reserva da importância que estimar devida na recuperação judicial ou na falência, e, uma vez reconhecido líquido o direito, será o crédito incluído na classe própria.

3 "Art. 51. A petição inicial de recuperação judicial será instruída com: (...) III - relação nominal completa dos credores, sujeitos ou não à recuperação judicial, inclusive aqueles por obrigação de fazer ou de dar, com a indicação do endereço físico e eletrônico de cada um, a natureza, conforme estabelecido nos arts. 83 e 84 desta Lei, e o valor atualizado do crédito, com a discriminação de sua origem, e o regime dos vencimentos; (...)" (considerada a redação conforme a Lei 14.112/2020).

4 Art. 7º A verificação dos créditos será realizada pelo administrador judicial, com base nos livros contábeis e documentos comerciais e fiscais do devedor e nos documentos que lhe forem apresentados pelos credores, podendo contar com o auxílio de profissionais ou empresas especializadas; (...) § 2º O administrador judicial, com base nas informações e documentos colhidos na forma do caput e do § 1º deste artigo, fará publicar edital contendo a relação de credores no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, contado do fim do prazo do § 1º deste artigo, devendo indicar o local, o horário e o prazo comum em que as pessoas indicadas no art. 8º desta Lei terão acesso aos documentos que fundamentaram a elaboração dessa relação.

5 Art. 9º A habilitação de crédito realizada pelo credor nos termos do art. 7º, § 1º, desta Lei deverá conter: I - o nome, o endereço do credor e o endereço em que receberá comunicação de qualquer ato do processo; II - o valor do crédito, atualizado até a data da decretação da falência ou do pedido de recuperação judicial, sua origem e classificação; III - os documentos comprobatórios do crédito e a indicação das demais provas a serem produzidas; IV - a indicação da garantia prestada pelo devedor, se houver, e o respectivo instrumento; V - a especificação do objeto da garantia que estiver na posse do credor. Parágrafo único. Os títulos e documentos que legitimam os créditos deverão ser exibidos no original ou por cópias autenticadas se estiverem juntados em outro processo.

6 BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Lei de Recuperação de Empresas e Falência. Lei 11.101/2005 - comentada artigo por artigo. São Paulo. Revista dos Tribunais. 2019

Fernando Luiz Tegge Sartori

Fernando Luiz Tegge Sartori

Especialista em Direito e Processo do trabalho e Direito Empresarial, sócio do escritório Sartori Sociedade de Advogados.

Priscilla Folgosi Castanha

Priscilla Folgosi Castanha

Especialista em Direito e Processo do Trabalho e em Direito Empresarial, sócia do escritório Folgosi & Rubira Advogadas Associadas.

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