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Auxílio moradia para médicos residentes: direito esquecido e negligenciado e a lei 12.514, de 28/10/11

O descumprimento do auxílio pelas instituições de saúde e o aumento de número de casos na justiça para garantia do direito ao médico residente.

quinta-feira, 19 de maio de 2022

Atualizado às 12:15

O descumprimento do auxílio pelas instituições de saúde e o aumento de número de casos na justiça para garantia do direito ao médico residente.

Previsto na lei Federal 12.514/110, o auxílio consiste no dever das instituições de saúde que oferecem programas de residência médica  e são credenciadas pela Comissão Nacional de Residência Médica de oferecer moradia a todo  médico residente durante todo o período da residência.

Cumpre destacar que não há nenhum pré requisito para deferimento do benefício, de modo que não é necessário demonstrar a morada em outro Estado, ausência de condições financeiras ou qualquer outra circunstância, a fim de justificar o benefício que deve ser garantido, sem distinções.

O auxílio pode ser oferecido tanto em dinheiro quanto in natura (local para morada) para cobrir os custos com moradia, sendo bem comum a sua disponibilização através de alojamentos de propriedade das instituições de saúde que devem obedecer às normas de higiene e segurança, conforme regulamento.

O fato é que a regulamentação, assim como outras incontáveis legislações presentes no ordenamento jurídico brasileiro, até o momento não aconteceu. Nada obstante, o STF já se pronunciou no sentido de que a inércia dos Poderes Executivo e Legislativo pode transferir ao Poder Judiciário, ainda que excepcionalmente, o controle para consecução de determinadas políticas públicas.

E, com esse fundamento, é que a 2ª turma do STJ, em 2009, no REsp 813.408/RS acolheu o pedido de uma médica residente, e determinou o retorno dos autos às instâncias ordinárias para fixação do valor devido a título de moradia.

O mesmo entendimento foi seguido, no REsp 1.339.798/RS, de relatoria do min. Herman Benjamin e oportunamente confirmada, em 2017, pela seção especializada em Direito Privado (2ª seção), em que o min. Napoleão Nunes Maia Filho fundamentou que: "não pode tal vantagem submeter-se exclusivamente à discricionariedade administrativa, permitindo a intervenção do Poder Judiciário a partir do momento que a administração opta pela inércia não autorizada legalmente"

Nas palavras do min. relator Mauro Campbell Marques: a simples inexistência de previsão legal para conversão de auxílios que deveriam ser fornecidos in natura em pecúnia não é suficiente para obstaculizar o pleito recursal, pois é evidente que se insere dentro do direito constitucional individual à tutela jurisdicional (art. 5º, inc. XXXV, da Constituição da República vigente) a necessidade de que a prestação jurisdicional seja adequada.

Na Justiça, subiram o número de ações para garantir esse direito ao médico residente, seja pela ausência de disponibilidade desse auxílio pelas instituições de saúde, seja por ser oferecido de forma precária: muitas vezes disfarçado/simulado apenas com espaço para descanso de plantões que não atende aos requisitos legais do benefício.

Assim é que, em caso de não oferecimento do auxílio pelas instituições em nenhuma das modalidades, a via judicial tem sido a única saída, inclusive, para receber retroativamente a quantia que deveria ter sido paga durante o período de residência: podem ser ajuizadas as ações durante a residência ou com a sua finalização, observando-se sempre o prazo prescricional de cinco anos (a partir da cada ano da residência).

Caso existente, para ajuizamento das ações, é necessária a observação prévia do regulamento interno da instituição de saúde em eventuais demandas envolvendo o direito dos médicos1 residentes ao auxílio moradia médico residente tendo em vista que a lei Federal remete ao regulamento, conforme o art. 4º da lei 6.932, de 7 de julho de 19812, § 5º, III com a redação dada pela lei 12.514, de 28 de outubro de 20113.

Na prática, os Tribunais têm fixado um percentual entre 20% e 30% do valor recebido a título de bolsa de residência como uma maneira de ressarcimento do médico residente pela ausência do pagamento dos custos de moradia previstos na lei Federal.

Uma ação bem elaborada e tem sido suficiente para obter êxito nos Tribunais do país, com largo precedente favoráveis, sendo válida e de extrema importância a tentativa de reparar os prejuízos sofridos pelos médicos residentes que se frustram na execução da residência médica sem o auxílio moradia pelas instituições de saúde.

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1 https://duartemoral.com/direito-medico/

2 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L6932.htm

3 https://legislacao.presidencia.gov.br/atos/?tipo=LEI&numero=12514&ano=2011&ato=ea4ITTU1UMVpWT137 

Milena Cintra

Milena Cintra

Advogada Cível e Consumidor. Especialista em Direito Público. Atualmente desempenhando também função de juíza leiga na Comarca de Salvador.

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