MIGALHAS DE PESO

  1. Home >
  2. De Peso >
  3. A suspensão ilegal de aportes adicionais, e de outros direitos contratuais previstos em planos de previdência antigos da Brasilprev

A suspensão ilegal de aportes adicionais, e de outros direitos contratuais previstos em planos de previdência antigos da Brasilprev

Após terem seus direitos negados pela Brasilprev administrativamente, diversos contratantes entenderam por bem recorrer ao Poder Judiciário para fazer valer seus direitos.

quinta-feira, 12 de maio de 2022

Atualizado às 13:50

 (Imagem: Artes Migalhas)

(Imagem: Artes Migalhas)

Milhares de investidores dos chamados planos de previdência tradicionais, contratados há mais de 20 anos, tem visto projetos de vida desconstruídos pela Brasilprev.

A perda da confiança se dá principalmente, pois os consumidores se veem impossibilitados de realizar faculdades contratuais.

Desde o dia 12/4/21, a seguradora passou a não aceitar mais i) contribuições/aportes esporádicos; ii) aumento das contribuições mensais; e iii) alteração da idade de saída do plano (sendo permitida apenas a antecipação)1.

O que diz o contrato?

Os planos tradicionais foram vendidos pela Brasilprev como um plano extremamente flexível, cujas promessas estampavam folhetos de marketing, dizia:

"E você tem total flexibilidade para fazer contribuições extras, incluir ou excluir beneficiários, aumentar ou reduzir o valor da contribuição, efetuar resgate total ou parcial e até mesmo antecipar o recebimento da sua aposentadoria. (...)"

Ademais, o próprio regulamento do plano é claro ao dispor sobre os direitos dos Investidores, merecendo especial atenção as cláusulas "3.4", "7.3" e "7.9":

3.4) É facultado ao participante, a qualquer instante, fazer contribuições esporádicas para o incremento ou recomposição do valor do benefício de aposentadoria por sobrevivência inicialmente contratado. As contribuições esporádicas obedecerão ao valor mínimo fixado para as contribuições normais e poderão ser pagas através de formulário próprio, tendo o mesmo tratamento dado à aquisição de uma renda adquirida sob a forma de contribuição única.

7.3) O participante poderá solicitar alteração do valor das contribuições, o que implicará na modificação do valor do benefício correspondente. Os novos valores de benefícios serão calculados atuarialmente.

7.9) Respeitados os direitos adquiridos pelo participante e/ou por seus beneficiários, toda e qualquer alteração a ser feita no plano, pela Brasilprev, dependerá da anuência dos mesmos. Excetuam-se dessa anuência as alterações decorrentes de imposição legal, que terão aplicação tempestiva. (grifos nossos)

Portanto, é evidente o direito dos contratantes de realizar as faculdades prometidas pela Brasilprev quando da contratação dos planos tradicionais, direito esse expresso no contrato firmado entre as partes.

Mesmo assim, ignorando por completo todas as obrigações assumidas, após mais de 20 anos, optou a Brasilprev por "mudar as regras do jogo", de forma completamente unilateral.

O que pretende a Brasilprev?

Desde o dia 12/4/21, descumprido o compromisso firmado há décadas com os mais de 100 mil segurados do plano individual tradicional, a Brasilprev passou a não mais aceitar contribuições esporádicas, aumento de contribuições mensais, nem alteração de idade de saída do plano.

Oportuno relembrar que muitos segurados (consumidores), adquiriram o plano tradicional atraídos por sua flexibilidade, e possuem o ônus do pagamento de uma taxa de carregamento de 9%2.

Em diversas respostas destinadas aos segurados, quando questionada sobre as negativas, a Brasilprev se limitou a dizer que "os planos tradicionais não estão mais em comercialização e por isso apenas as contribuições normais mensais são aceitas."

Fica claro, portanto, o intuito da instituição financeira de "engessar" o contrato vendido como flexível, pois pela primeira vez em décadas, o mesmo se tornou menos rentável para a Brasilprev.

Mesmo com os alegados "prejuízos", apenas em 2021 a Brasilprev registrou lucro líquido de R$1 bilhão de reais, 11% superior ao apresentado em 20203.

O que diz a Susep?

A Susep, órgão regulador do governo para o setor de seguros, aponta que "em que pese a dificuldade de gestão dos planos atrelados ao IGP-M, as empresas não podem modificar unilateralmente os regulamentos dos planos em vigor".

Ressaltou ainda que "qualquer alteração de plano precisa contar com a concordância do participante".

Contudo, até o momento, a Brasilprev continua a descumprir as regras contratuais, sem qualquer penalidade.

O que diz a justiça?

Após terem seus direitos negados pela Brasilprev administrativamente, diversos contratantes entenderam por bem recorrer ao Poder Judiciário para fazer valer seus direitos, com o ajuizamento de ações para compelir à seguradora a autorizar as faculdades previstas em contrato.

De forma acertada, diversos tribunais do país têm se posicionado a favor dos contratantes/consumidores.

Até então, foram proferidas diversas decisões liminares, (algumas com confirmação em 2ª Instância), para autorizar que o participante realize aportes esporádicos, por expressa previsão contratual (cláusula 3.4).

Quando do julgamento de agravo de instrumento, a 6ª câmara Cível do TJ/RS entendeu que:

(...) "2) Havendo previsão contratual expressa (cláusula 3.4), impositivo autorizar que o participante realize aportes esporádicos, mormente diante de qualquer demonstração por parte da entidade ré de que tal fato comprometeria a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do plano, colocando-o risco, tampouco que o autor estaria objetivando subverter a finalidade do plano e auferir lucros exorbitantes."

(...) "4) No regulamento do plano há vedação expressa de alteração de forma unilateral das regras contratuais (cláusulas 7.8 e 7.9), razão pela qual qualquer alteração, inclusive a proibição de aportes esporádicos, sem a concordância expressa do participante, não pode ser chancelada".

A expectativa é que decisões como a referida sejam reiteradas, e confirmadas em sentença, aplicando-se a efetiva justiça, com a garantia da manutenção do que foi pactuado entre as partes há décadas.

--------------

1 https://exame.com/invest/onde-investir/brasilprev-fundo-igpm-suspensao-aportes/

2 Percentual cobrado sobre as movimentações realizadas em planos de previdência privada (ex: aportes).

3 https://monitormercantil.com.br/brasilprev-registra-lucro-liquido-de-r-1-bilhao/

Hannah Krüger Rodor Fontana

VIP Hannah Krüger Rodor Fontana

Advogada do escritório CR Advogados. E-mail: [email protected]; tel: (11) 91435-0163; Pós-graduada em Direito Tributário pela PUC-Minas. Certificada pelo Insper em Compliance e em LGPD.

AUTORES MIGALHAS

Busque pelo nome ou parte do nome do autor para encontrar publicações no Portal Migalhas.

Busca