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Apresentação de plano de recuperação alternativo pelos credores

A utilização do mecanismo na recuperação judicial da Samarco pode pôr à prova a sua efetividade, celebrando o sucesso do novo instrumento concebido e ensejando a reestruturação de uma das mais tradicionais empresas de mineração do mundo.

quarta-feira, 27 de abril de 2022

Atualizado às 13:23

(Imagem: Arte Migalhas)

Recentemente, foi divulgado que os credos da recuperação judicial da Samarco1 deliberaram, na assembleia geral de credores realizada em 18.04.2022, pela apresentação de plano alternativo de recuperação judicial pelos próprios credores, tendo em vista a rejeição do plano apresentado pela devedora.

Neste cenário, em que se observa a utilização de um dos novos mecanismos trazidos pela lei 14.112/20, torna-se conveniente o debate acerca da ferramenta.

A recente alteração a Lei de Recuperação de Empresas e Falências, trouxe, dentre suas diversas inovações, a possibilidade de apresentação de plano de recuperação alternativo pelos credores, que poderá ser oferecido em duas principais situações: (i) se houver a rejeição do plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor (como verificado no caso da Samarco), hipótese na qual será garantido aos credores prazo de 30 (trinta) dias para apresentação de novo plano, conforme refere o art. 56, § 4º2, da LREF;  e (ii) se houver o decurso do stay period, previsto no art. 6º, sem a deliberação acerca do plano apresentado pelo devedor, em atenção ao art. 6º, §4º-A3.

O novo instrumento visa, sobretudo, evitar a desnecessária falência do empresário que, na concepção dos credores, ainda teria condições reestruturação, podendo, ainda, exercer sua atividade e, eventualmente, saldar as dívidas existentes, atribuindo a esses, portanto, a participação ativa na elaboração do plano. Conforme esclarece Sergio Campinho4:

"o plano dos credores deve ser entendido como meio excepcional para viabilizar a recuperação judicial da empresa que se mostre viável aos olhos dos credores. É um recurso que a eles se disponibiliza como caminho alternativo à falência do devedor"

Debate-se, no entanto, quanto à efetiva capacidade dos credores conjuntamente elaborarem plano adequado, que cumpra com as exigências legais, e, principalmente, que dê solução a contexto de crise experimentado pelo empresário que individualmente não conseguiu apresentar proposta adequada.

Inicialmente, há de se destacar que o prazo de 30 dias concedido aos credores pelo art. 56, §4º, para elaboração de plano alterativo é, inclusive, inferior ao prazo concedido ao devedor pelo art. 535, que reza prazo "improrrogável" de 60 dias da data da publicação da decisão que deferia o processamento da recuperação judicial.

É natural (senão recomendável), no entanto, que o devedor que vá a juízo requerer sua recuperação judicial já tenha, de alguma forma, esboçado o plano a ser apresentado, e discutido, em alguma medida, com credores de maior relevância. Desta forma, inobstante o prazo previsto na legislação seja de 60 dias, é certo que, em verdade, o devedor se utiliza de prazo muito maior à efetiva avaliação, elaboração e revisão do plano - o que, destaca-se, não é prejudicial em nenhum sentido.

No entanto, contrapondo-se as condições de elaboração do plano do devedor àquelas com as quais irá se deparar eventual credor que tenha interesse em tentar reerguer aquela atividade, percebe-se que a tarefa a ser assumida por este é ainda mais hercúlea.

Considerando que a apresentação de plano alternativo pelos credores a última forma de salvaguardar os interesses destes próprios, e que a mera concessão do prazo para sua apresentação dependerá de aprovação da maioria dos credores presentes em assembleia6, não se justificaria a concessão das melhores condições possíveis aos credores para que pudessem, efetivamente, apresentar a melhor proposta?

Logicamente, o credor, por mais interessado e diligente, não disporá das mesmas informações que dispunha o devedor com relação à atividade por ele desenvolvida. A limitação não se restringe, efetivamente, às informações financeiras do empresário, que poderão ser objetivamente transmitidas ao credor, mas ao contexto no qual se insere a atividade e as particularidades do seu desenvolvimento que, naturalmente, deverão ser consideradas na elaboração de um plano adequado de recuperação judicial.

Não bastasse as dificuldades inerentes à elaboração do documento, o art. 56, § 6º, prevê, ainda, seis requisitos que deverão ser observados pelo plano proposto pelos credores, condicionando a possibilidade de votação ao preenchimento cumulativo de todas as condições.

Portanto, tem-se que a tentativa do legislador de inserir novo mecanismo que possibilitasse aos credores uma última esperança na reestruturação do empresário e na satisfação dos seus créditos acabou por imputar a estes excessivos encargos, dificultando a utilização do instrumento e, consequentemente, limitando os maiores interessados na sua realização.

Neste contexto, a utilização do mecanismo na recuperação judicial da Samarco - que conta, sem dúvidas, com partes absolutamente qualificadas e assistidas por profissionais de destaque - pode pôr à prova a sua efetividade, celebrando o sucesso do novo instrumento concebido e ensejando a reestruturação de uma das mais tradicionais empresas de mineração do mundo, ou, ainda, reforçando a complexidade do instrumento idealizado pelo legislador.

_____________

1 Processo 5046520-86.2021.8.13.0024, em tramite na 2ª vara Empresarial da Comarca de Belo Horizonte/MG.

2 § 4º Rejeitado o plano de recuperação judicial, o administrador judicial submeterá, no ato, à votação da assembleia-geral de credores a concessão de prazo de 30 (trinta) dias para que seja apresentado plano de recuperação judicial pelos credores.

3 § 4º-A. O decurso do prazo previsto no § 4º deste artigo sem a deliberação a respeito do plano de recuperação judicial proposto pelo devedor faculta aos credores a propositura de plano alternativo, na forma dos §§ 4º, 5º, 6º e 7º do art. 56 desta Lei, observado o seguinte

I - as suspensões e a proibição de que tratam os incisos I, II e III do caput deste artigo não serão aplicáveis caso os credores não apresentem plano alternativo no prazo de 30 (trinta) dias, contado do final do prazo referido no § 4º deste artigo ou no § 4º do art. 56 desta Lei;      

II - as suspensões e a proibição de que tratam os incisos I, II e III do caput deste artigo perdurarão por 180 (cento e oitenta) dias contados do final do prazo referido no § 4º deste artigo, ou da realização da assembleia-geral de credores referida no § 4º do art. 56 desta Lei, caso os credores apresentem plano alternativo no prazo referido no inciso I deste parágrafo ou no prazo referido no § 4º do art. 56 desta Lei

4 CAMPINHO, Sérgio. Curso de direito comercia: falência e recuperação de empresa. São Paulo: Saraiva, 2022

5 Art. 53. O plano de recuperação será apresentado pelo devedor em juízo no prazo improrrogável de 60 (sessenta) dias da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial, sob pena de convolação em falência, e deverá conter:

6 Conforme determina o art. 56, § 5º A concessão do prazo a que se refere o § 4º deste artigo deverá ser aprovada por credores que representem mais da metade dos créditos presentes à assembleia-geral de credores.

Alex Barreto Viana Rosito

Alex Barreto Viana Rosito

Advogado no escritório Laís Lucas Advogados Associados. Pós-graduando no curso de Especialização em Direito Empresarial da PUC/RS. Bacharel em Direito pela PUC/RS.

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