As assembléias virtuais e abertas em condomínios e a inovação da lei 14.309/22
Com a nova legislação, esta modalidade assemblear passa a ter regramento específico e expresso, dando muito menos margem intepretação e, muito mais à aplicação do diploma legal.
segunda-feira, 25 de abril de 2022
Atualizado em 26 de abril de 2022 13:05
É fato que a pandemia da covid-19 foi um dos episódios mais tenebrosos da saúde mundial. No entanto, também em fato que, na adversidade, inovações e soluções acabaram sendo criadas e implementadas para que a vida em sociedade não parasse.
No universo condominial não foi diferente e, em março desde ano uma novidade positiva chegou: a lei 14.309/22 que, finalmente, regulamentou questão que ganhou muita importância nos tempos pandêmicos: a assembleia virtual.
Além desta, a possibilidade de manter a assembleia "aberta" também foi trazida para o texto legal de maneira expressa.
Em linhas gerais, a nova legislação trouxe corpo e nova roupagem aos art. 1.353 e 1.354 do Código Civil, que compõem o capítulo dedicado aos condomínios edilícios (e outras questões afetas).
No que se refere às assembleia "abertas", o parágrafo 1º do art. 1.353 prevê agora que caso um quórum qualificado seja necessário em alguma votação e, na assembleia onde for inicialmente pautado, este quórum não for atingido, a assembleia poderá por maioria (dos participantes do ato assemblear), autorizar que ela fique "aberta" em caráter permanente.
Eis o texto legal do "caput" e parágrafo 1º: "Art. 1.353. Em segunda convocação, a assembleia poderá deliberar por maioria dos votos dos presentes, salvo quando exigido quórum especial. § 1º Quando a deliberação exigir quórum especial previsto em lei ou em convenção e ele não for atingido, a assembleia poderá, por decisão da maioria dos presentes, autorizar o presidente a converter a reunião em sessão permanente (...)".
Com isso, torna-se viável agregar mais votantes ao item em debate e, consequentemente, quóruns que hoje são muito difíceis de se atingir em assembleia única, passarão ser muito mais factíveis.
A aprovação de uma convenção condominial com dois terços das assinaturas poderá, por exemplo, ser realizada em duas ou mais assembleias diferentes, bastando que a primeira delas deixe este item em aberto.
Por óbvio que alguns requisitos deverão ser obedecidos, como a indicação de data e hora da próxima assembleia, que deverá se dar em até 60 dias. Logo, não haverá como simplesmente deixar o ato em aberto em caráter "sine die", isto é, de maneira indefinida. Mesmo na decisão de postergar o debate para outro dia, em outra assembleia, é preciso organização e planejamento.
Também será imprescindível que todos os condôminos sejam convocados (os presentes na inicial e também os ausentes, caso queiram vir na subsequente) para a próxima data assemblear, tal qual estivéssemos convocando uma nova Assembleia. O formato de convocação respeitará o da convenção de condomínio e da legislação civil.
Quanto à ata da assembleia que ficar "em aberto", deverá ser redigida como normalmente o é, sendo lavrada a ata parcial da com os itens concluídos e, fazendo menção àqueles que ficarem em aberto para a próxima data. A transcrição dessa ata parcial deve ser encaminhada a todos os ausentes.
Na assembleia complementar subsequente, uma nova ata de continuidade será lavrada e registrada.
Os votos da primeira assembleia permanecerão válidos e, podem ser feitas quantas subsequentes forem necessárias, desde que no prazo máximo de 90 dias contados da assembleia inicial.
Mas e as assembleias virtuais?
O art. 1.354-A vem para regrar as assembleias eletrônicas e híbridas (física + eletrônica) que já vinham sendo realizadas na pandemia, porém sem texto legal que as previsse e, dependendo muito de entendimentos do Poder Judiciário e de operadores do direito em geral.
Note-se que desde o ato convocatório, a novidade legislativa já inova: "Art. 1.354-A. A convocação, a realização e a deliberação de quaisquer modalidades de assembleia poderão dar-se de forma eletrônica, desde que (...)".
Com a nova legislação, esta modalidade assemblear passa a ter regramento específico e expresso, dando muito menos margem intepretação e, muito mais à aplicação do diploma legal.
Logo de início percebe-se grande ênfase em oportunizar a voz, o debate e o voto aos condôminos em acesso remoto (à distância). Assim, deve ser garantido aos participantes a possibilidade de se manifestarem e debaterem e, de exercerem se insofismável direito de votar.
Há menção de que esta modalidade somente será cabível se a convenção condominial não há proibir, entretanto, é razoável concluir que pouquíssimos condomínios - e aqui incluo praticamente somente os mais recentemente erigidos - possuem qualquer tipo de regramento envolvendo assembleias virtuais e, ainda que tal previsão ocorra, será muito difícil que vedações ou impedimentos sejam incluídos. A modernidade e a razoabilidade parecem que ditarão o posicionamento dos condomínios.
Importante consignar que será de extrema importância o texto do edital de convocação, da assembleia virtual ou híbrida (mista) que deverá descrever claramente os meios de acesso e forma de votação, não podendo ser imputado ao Condomínio, problemas de conexão ou de intercorrência de internet de cada condômino.
Problemas de conexão individuais, intermitência no acesso do condômino ou mesmo impossibilidade de "logar" no momento da assembleia, não poderão invalidar a mesma.
Tudo deve ser previamente informado no edital: onde o acesso poderá ser feito, como serão computados os votos, como será a representação por procuração (pois ainda que remotamente, continuará existindo) e, até mesmo como poderão ser enviados documentos para prévia conferência se necessário for.
O condomínio poderá detalhar ainda mais a regulamentação deste novo tipo assemblear em seu regimento interno, se assim o desejar.
Marcelo Vallejo Marsaioli
advogado militante, inscrito perante a OAB/SP, sócio do escritório Marsaioli & Marsaioli Advogados Associados. Graduado pela Faculdade Católica de Direito de Santos - UNISANTOS (1997). Pós-graduado "lato sensu" - Faculdade Católica de Direito de Santos - UNISANTOS. Mestrando em Direito da Saúde pela UNISANTA. Especializado em direito contratual, imobiliário e consumerista. Escreve atualmente artigos editados para publicações do ramo imobiliário. Professor Universitário na área do Direito Empresarial UNISANTA (início em 2004). Presidente da Comissão de Direito do Consumidor (2013/2015) e Direito Condominial da Subseção Santos da OAB/SP - triênio 2022/2024.