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Crítica ao consequencialismo

O consequencialismo é uma ferramenta anti-democrática e simplista para resolver complexos problemas jurídicos.

terça-feira, 12 de abril de 2022

Atualizado às 12:15

(Imagem: Arte Migalhas)

O consequencialismo, princípio positivado na LINDB em seus 20º e 21º artigos, importado da doutrina norte americana, têm como principal defensor o professor jurista Richard Posner, e prevê em seus ideais que qualquer decisão judicial deva estar de acordo com a sua consequência prática. Coloca-se, portanto, de lado a relação axiológica exclusiva entre fato e norma para introduzir uma régua que meça os efeitos produzidos a partir da decisão.
Logo, tem-se uma doutrina muito mais próxima da análise econômica e política do Direito, do que uma análise restrita às normas jurídicas. Os problemas de analisar as decisões a partir desta ótica são resumidamente quatro, como discorrerei abaixo.

As normas jurídicas, legisladas democraticamente, utilizam-se da racionalidade e são regidas essencialmente por um imperativo categórico, isto é, são normas que valorizam os direitos e garantias com importância de fim e não como meio. Diferindo-se da ótica consequencialista, que de forma utilitarista, pauta as decisões a partir da máxima de Bentham em que "fins justificam os meios" ignorando, desta maneira, as importâncias individuais em busca de um "bem maior" subjetivo.

A subjetividade da busca pela "melhor consequência" é extremamente paradoxal e inalcançável. Podemos passar anos debatendo qual seriam as consequências de curto, médio e longo prazo de alguma decisão e mesmo assim não entraremos em um consenso. Com isso temos o segundo problema, a flexibilização das normas buscando uma "melhor consequência" trouxe ingenuamente uma ferramenta tirânica para os que vestem a Toga. Quando na Constituição de 88, escreveu-se o plexo de direitos que compõem o capítulo dos direitos e garantias individuais e coletivos, procurou-se positivar no texto nobre da mais alta hierarquia legislativa brasileira os direitos e garantias para que pudéssemos ter um artifício necessário para repelir as investidas do autoritarismo. Quando se dá aos juízes o passe livre para passar por cima das normas brasileiras em nome de uma consequência "mais benéfica", entregamos também um poder, que deveria ser exclusivamente emanado pelo povo através do legislativo (art 1, parágrafo único, CF), de decidir em acordo com o ideal personalíssimo de sociedade perfeita. Já dizia Cesare Beccaria, dar ao juiz um poder de decidir algo que difere do prescrito em lei "seria reduzir os homens a não passar de um vil rebanho sem vontades e sem direitos" isto porque as Leis são "o resultado atual da vontade de todos", deixando ao juiz "o dever exclusivo de examinar se praticou-se ou não um ato contrário às leis". O próprio Posner, por exemplo, considerava equivocado, segundo uma análise consequencialista, garantir a réus pobres o direito a um advogado público em processos criminais pois esse direito traria menos condenações desses réus (inclusive os culpados), o que resultaria na revolta da população em geral, que sucederia, por sua vez, na aprovação de leis mais severas a esses mesmos réus.

Percebe-se portanto que o consequencialismo, trata de pura futurologia do magistrado (como visto no exemplo acima), isso acarreta no terceiro problema, a insegurança jurídica que as análises totalmente imateriais das consequências trazem ao cidadão brasileiro. Com a paradoxal subjetividade dessas análises, será impossível prever qualquer resultado judicial mesmo que o direito seja certo, tornando totalmente caótico e inconsistente o regramento do ordenamento jurídico. Segundo o constitucionalista André Portugal "onde existe um juiz vidente, inexiste segurança jurídica.'

Ademais, a corrente consequencialista acaba por tirar a responsabilidade do Estado utilizando de argumentos como "Crises econômicas", "Rombo na economia", "Lotação do Judiciário", "Sensação de Impunidade", como pretexto para desrespeitar os direitos e garantias e ignorar os limites do Estado, cabendo ao cidadão arcar com os custos estatais, como já vem ocorrendo em caso como o ICMS sobre PIS e Cofins, onde o contribuinte perdeu 250 bilhões de forma inconstitucional, ou na Lava a Jato, onde o direito ao devido processo legal e ao contraditório foram abandonados em prol de evitar "a sensação de impunidade'.

Gabriel Barker Lajus

Gabriel Barker Lajus

Aluno de direito da IBMEC-SP.

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