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Resistência, resiliência e luta contra uma cultura de distanciamento do Judiciário da sociedade

A Advocacia, inspirada em sua história de defesa das liberdades, dos direitos humanos e da justiça social, deve construir caminhos e pontes que tornem a cidadania respeitada.

quinta-feira, 3 de março de 2022

Atualizado às 12:09

No dia 26 de fevereiro de 2022, completamos 2 anos da confirmação do primeiro caso de contaminação pelo COVID-19 no Brasil. De lá para cá, temos lutado para superar a maior crise sanitária de todos os tempos, ou para aprender a conviver com ela. E, sem descuidar dos avanços tecnológicos antecipados forçadamente pelo distanciamento necessário para o momento, a pandemia trouxe aos olhos da sociedade o agravamento de uma crise há muito experimentada pela advocacia, decorrente do afastamento do Poder Judiciário da realidade social.   

Enquanto empresas, empregados e trabalhadores informais lutavam para sobrevivência. Enquanto a União, Estados e Municípios realizavam todas as matemáticas possíveis para diminuir o impacto econômico na mesa dos mais vulneráveis por meio de auxílios emergenciais, doações de cestas básicas, distribuição de materiais de higiene pessoal, vimos a insensibilidade de um Judiciário que, encastelado, procurava antecipar férias não vencidas aos magistrados.   

Essa é uma postura muito sintomática, ainda mais quando questionamos a razão do Poder Judiciário, em todas as curvas da pandemia, ter sido o primeiro a fechar e o último a abrir suas portas. Por que o Poder Legislativo e o Executivo podem funcionar em sua plenitude, enquanto a Justiça não? Por que os setores de atividade empresarial estão abertos, ainda que em regime de revezamento, e o tão importante Judiciário continuava trancado até poucos dias atrás? E ao buscarmos respostas para essas perguntas, constatamos que portas trancadas têm muito a dizer sobre um Poder que dita todas as normas e ignora a pressão social. 

E o que dizer aos pacientes que estão aguardando uma decisão judicial para salvar suas vidas? E quanto ao filho que está sem ter o que comer, porque não recebe a pensão? Ou como trazer esperança a quem depende de um benefício previdenciário e não consegue realizar uma perícia? É preciso reconhecer que o peso de um Judiciário inacessível pode ser o mesmo que tem a morte, o mesmo que tem a fome, o mesmo que tem o medo e a descrença no Brasil. 

Durante todo esse período a única voz que se levantou para denunciar essa cultura de afastamento do Poder Judiciário da sociedade foi a da Advocacia. E, curiosamente, em total paradoxo, a advocacia vem experimentando a tentativa de criminalizar seu exercício. Há poucos dias, uma promotora afirmou solenemente que "são bosta esses advogados". Em frente a uma Câmara de Vereadores, na cidade de Saúde/Ba, um advogado foi assassinado a tiros. Tivemos outra colega advogada duramente agredida na tentativa de se firmar um acordo extrajudicial. "Vai pro inferno" diz juiz a advogado durante audiência. E até mesmo do último guardião da Constituição presenciamos a subversão da ordem jurídica, para reduzir o direito à percepção dos honorários da advocacia. É assim, infelizmente, que a advocacia enfrenta o desafio de exercer sua profissão. Tudo isso não é sem propósito: querem acabar com a Advocacia! 

Neste cenário, ao caminharmos para a terceira década da vigência do Estatuto da OAB, é fundamental lembrar que as prerrogativas nasceram como um escudo para proteção da sociedade. É por meio de uma advocacia livre e independente que os cidadãos conseguem ter voz altiva para reivindicar seus direitos, para fazer cessar as injustiças e para se opor interesses dos poderosos. Advocacia fortalecida significa uma sociedade mais protegida, pois, há uma relação simbiótica entre prerrogativas da Advocacia e o efetivo acesso à Justiça. 

Há, sem dúvidas, em curso uma vã tentativa de lentamente enfraquecer a advocacia e a própria força institucional da OAB. Porém a Advocacia, inspirada no seu espírito de resistência, resiliência e luta, seguirá empenhada em tornar eficaz a lei que protege e dignifica o exercício de sua profissão. Somos os porta-vozes da cidadania e não seremos abatidos por esse sistema que insiste em querer afastar a justiça da sociedade. 

É preciso que se compreenda que, ao assumir esse papel e denunciar esse descaso, a Advocacia não se coloca em oposição ao Judiciário. Muito pelo contrário! Estamos ao lado da Sociedade e temos em nossa essência, a missão de lutar contra nossos verdadeiros inimigos: a corrupção, a ineficiência e o enfraquecimento das instituições democráticas. Portanto, a Advocacia, inspirada em sua história de defesa das liberdades, dos direitos humanos e da justiça social, deve construir caminhos e pontes que tornem a cidadania respeitada, a justiça efetiva e as prerrogativas observadas, primeiramente e sempre pelo diálogo, mas, quando necessário for, faremos o bom combate, dentro da legalidade, contra as autoridades que insistam em prosseguir com a cultura de afastar a Justiça da Sociedade. 

Hermes Hilarião

Hermes Hilarião

Advogado. Diretor Tesoureiro da OAB-BA. Especialista em Direito Eleitoral e Direito Público.

Daniel Moraes

Daniel Moraes

Advogado. Coordenador do Colégio de Presidentes de Subseção da OAB-BA. Mestre em Direito Constitucional e Professor de Direito.

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